Editorial

Reflexões sobre a COVID-19

É impossível vivenciar a crise que emergiu a partir do novo coronavírus de forma meramente pragmática. O microscópico vírus causou uma paralisação mundial sem precedentes. Uma terceira guerra mundial que parecia próxima no início do ano, vista até por alguns como um castigo imposto à humanidade por seus desvios e perda de sentido mais profundo, que desuniria os seres humanos, foi substituída por uma luta necessariamente solidária, para combater um ínfimo, mas superpoderoso inimigo comum.

Em primeiro lugar, o coronavírus aproximou fisicamente as famílias e acabou trazendo consigo a convivência obrigatória – em muitos lares já bem maltratada – e a criatividade para ajustar o equilíbrio trabalho-família. Ainda que muitos queiram frisar o aumento da violência doméstica, não podemos subestimar a capacidade do ser humano em relação àquilo que lhe é inerente, o que acarretou em muitos a redescoberta e a valorização da família, com um crescimento geral em virtudes como a paciência, a escuta, a compreensão, a reflexão sobre os próprios defeitos etc.

Abra-se um parêntese para destacar a campanha do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos sobre a denúncia de violência no lar, que destaca que, para algumas famílias, o isolamento é mais complicado. No entanto, também temos tido diversas notícias positivas. Muitos casais valorizaram sua relação, como atesta o comentário de uma pessoa que disse que fazia tempo que não tomava uma cerveja com sua esposa e que tinha esquecido que ela era tão legal! Outro pai dizia que não sabia se o mundo ia mudar depois do coronavírus, mas sua casa já tinha mudado. Ontem mesmo, uma mãe que celebrava seu aniversário disse que havia anos não tinha uma comemoração tão íntima, simples e carinhosa, como um almoço preparado pelo marido, e os filhos ao redor! Outro ponto que tem florescido é o interesse e o acompanhamento das atividades escolares pelos pais, juntamente com a comprovação da produtividade de um trabalho remoto bem conduzido, que para muitos poderia ser uma solução saudável.

No plano macro, as relações também estão sendo questionadas. Se queremos ser realmente coerentes em termos de direitos humanos, é preciso pensar e agir além do utilitarismo. Atrás das curvas, estudos etc., é preciso ver rostos! O mundo se une para combater a pandemia, mas é preciso chegar às causas para erradicar não só um mal biológico, mas antropológico! Com certeza, esta abominável crise nos pode efetivamente conduzir a uma nova era na preservação dos direitos do ser humano. Espero que sejamos capazes de guardar bem as lições!

Por fim, completo estas breves linhas com a experiência pessoal de ter passado pela COVID-19, podendo me solidarizar com a dor de tantos que, inclusive, perderam a vida dessa triste forma. O sofrimento é sempre uma escola e, de certa forma, preferimos vivê-lo a ver os que amamos sofrendo. Provavelmente, contraí o vírus cuidando de meu pai no hospital, mas agradeci muitíssimo que pôde passar a Páscoa curado, em casa, com minha mãe! Palpamos o forte poder da oração dos familiares e amigos, e, pessoalmente, todo o carinho do meu ministério, que é efetivamente uma família, e da querida ministra Damares Alves, que moveu o Brasil para orar por nós!

Sei que lutaram, lutaram por mim, e essa convicção me sustentou nos dias mais críticos. Também a lembrança do tempo que acompanhei meu pai no hospital, vendo-o se superar a cada dia para vencer uma série infindável de dificuldades, sem perder a alegria e procurando manter uma rotina para aproveitar bem o tempo!

Em realidade, só tenho a agradecer. A doença significou para mim um grande aprendizado e uma maior confirmação da capacidade de doação do ser humano, como pude comprovar com as equipes, enfermeiros, técnicos, desde a limpeza, copa, exames etc., por meio de sua carinhosa dedicação.

Penso que, em geral, esse “mal” vai nos trazer um grande bem: sair da esfera individual para a órbita do amor aos demais, a começar pela família!

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