Opinião

Direito, justiça, vingança e pena de morte

A aceitação da agressão e da violência como base da retribuição parece algo do passado, de sociedades primitivas. O Direito busca fixar valores, equivalências, sair do emocionalismo e da irracionalidade para a medida, o limite. É verdade que na justiça há um caminho partindo da emoção provocada pelo mal praticado. No Direito, porém, esse sentimento encontra ao mesmo tempo uma resposta e um freio.
Por essa razão, são muitas as dificuldades da Justiça na fixação da pena por atos ilícitos e crimes. Há dificuldade em encontrar o limite da pena, da multa, da indenização, isto é, em mensurar a retribuição a ser aplicada, que teria o condão de reequilibrar o meio desestabilizado pelo ato praticado. Há, ainda, o fator de desestímulo a ser considerado.
No Brasil, o sistema processual dá margem à existência de longos processos que geram sensação de impunidade na sociedade, o que aumenta o sentimento de injustiça e o consequente apelo por vingança.
A pena de morte, que é aceita até hoje em diversos ordenamentos jurídicos, apela ao lado irracional da justiça, por ser o desejo de punição até a extinção da vida. Veja-se também os casos de linchamento, que buscam a mesma solução final. Por isso, o sentimento de vingança está sempre rondando a justiça, ainda que sutilmente, mesmo nos dias de hoje. 
Nasceu do pensamento cristão a concepção de justiça restaurativa, para superar o mero retribucionismo da pena. 
Não se trata de deixar o mal sem resposta, o que geraria um desequilíbrio social e a conivência com o mal, o que é pior. Tampouco se trata de obrigar a vítima a perdoar. Trata-se de dar oportunidade de diálogo, de reconhecimento do erro, assunção de responsabilidades e fazer com que as próprias partes e representantes da sociedade encontrem a melhor solução por meio da verdade e do desejo do bem, que repare o mal de forma a preservar a dignidade dos envolvidos. 
A própria Igreja Católica, aprofundando-se em sua Doutrina sobre a pena de morte, tendo em vista as reflexões feitas desde São João Paulo II, passando por Bento XVI até Francisco, manifestou-se, afirmando que até mesmo um homicida não perde a dignidade de ser humano. Segundo a Igreja, a supressão de sua vida nos tempos atuais atenta contra ela, já que foram desenvolvidos outros meios de proteger a sociedade. O tema ganhou destaque na carta da Congregação para a Doutrina da Fé (“Carta aos Bispos sobre a nova redação do nº 2267 do Catecismo da Igreja Católica sobre a pena de morte”, 01/08/2018). 
A Igreja chegou a aceitar que houvesse a aplicação da pena de morte não como retribuição pelo crime cometido, mas no caso de ser a única maneira de proteger vidas inocentes de um agressor injusto. Todavia, ela vem reconhecendo que as sociedades desenvolveram outras formas de se protegerem, não sendo necessário tolher a vida nem mesmo dos piores criminosos, deixando-
-lhes sempre aberta a possibilidade de mudança. 
A nova formulação do nº 2267 do Catecismo da Igreja Católica quer impulsionar um firme compromisso, em um diálogo respeitoso com as autoridades políticas, fomentando o reconhecimento da dignidade de toda vida humana e criando condições para eliminar a pena de morte, onde ainda ela está em vigor. 
A busca da justiça é fundamental para o cristão. 
Como afirmou Bento XVI na Caritas in veritate (CV), a justiça é o mínimo do amor, ou seja, onde há amor, houve antes a justiça. Não existe amor sem justiça. Contudo, o amor aprimora a justiça para que ela esteja a serviço da pessoa humana e do bem comum.

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