Encontro com o Pastor

Cristãos leigos: povo de missionários

A última semana de agosto, “mês das vocações”, é dedicada às vocações laicais na Igreja. Desde o Concílio Vaticano II, temos mais claro que os cristãos leigos e leigas não são apenas os “beneficiados” de uma instituição chamada “Igreja”: eles também são parte viva e ativa da Igreja, de cuja vida e missão participam de maneiras muito diversas. Eles são o povo dos discípulos-missionários de Jesus Cristo no mundo.

A Igreja tratou da vida e missão dos cristãos leigos em muitos momentos do seu Magistério recente. Ocupou-se deles o Concílio Vaticano II, especialmente na importante Constituição Dogmática Lumen Gentium, sobre a Igreja, e no Decreto Apostolicam Actuositatem, sobre o apostolado dos leigos. A Exortação Apostólica Christifideles Laici, de São João Paulo II, continua a ser uma referência importante do Magistério sobre os leigos na Igreja. Mais recentemente, diversos documentos importantes do Magistério Pontifício trataram de aspectos específicos da vida e da missão dos cristãos leigos na Igreja. Os Documentos das Conferências Gerais do Episcopado da América Latina e do Caribe dedicaram páginas abundantes ao papel dos leigos na Igreja, especialmente o Documento de Aparecida (2007). Assim também fez a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Pelo Batismo que receberam, os fiéis leigos são chamados a testemunhar Jesus Cristo e o Evangelho do Reino de Deus com a fé e a vida nova que se alicerça no Evangelho. Assim fazendo, eles são “luz do mundo”, “sal da terra” e “fermento na massa”, conforme recomendações do próprio Jesus Cristo. Sua vocação consiste em testemunhar a força transformadora e salvadora do Reino de Deus, que acolheram pela fé e que já se encontra no meio do mundo. Vivendo de maneira coerente o Evangelho, eles são luz do Evangelho nas mais diversas dimensões do tecido social, onde estão inseridos e atuam, e são missionários de Cristo no meio do mundo, mais pelo testemunho que por palavras.

Mas eles também exercem sua vocação batismal participando das responsabilidades da comunidade eclesial. Participam da missão de anunciar o Evangelho, de transmitir a fé aos irmãos, ajudando-os a crescer na vida segundo o Evangelho. Participam da missão santificadora da Igreja mediante sua santidade pessoal, o testemunho das bem-aventuranças, da retidão moral e das virtudes cristãs. Participam, também, a seu modo e conforme suas competências, das responsabilidades de governo na comunidade eclesial. Eles não são, de forma nenhuma, apenas parte receptiva e passiva na Igreja.

Neste tempo de “nova evangelização” e de “Igreja em saída”, é bom lembrar que a renovação missionária da Igreja não será alcançada sem a participação generosa e dedicada desse povo de missionários, que são os cristãos leigos e leigas. A catequese, da iniciação à vida cristã às suas diversas fases sucessivas, conta essencialmente com a participação dos leigos. A transmissão da fé católica, de geração em geração, conta, de maneira decisiva, com a participação das famílias. A Igreja confia aos casais católicos e suas famílias a dignificação do amor humano, o acolhimento e a valorização da vida e da pessoa em todas as circunstâncias. E também conta com a generosa dedicação de numerosos leigos e leigas na coordenação e animação das comunidades cristãs.

Na comemoração dos Apóstolos, a Liturgia da Igreja exalta a obra deles com as palavras do Salmo 144 (145): “Vossos amigos, Senhor, anunciam o vosso Reino glorioso!”. De fato, não se pode esperar isso dos inimigos de Cristo e de Deus; mas é dos amigos de Deus e de Cristo que se pode esperar que falem bem e com entusiasmo das coisas de Deus e do seu Reino. A evangelização é obra dos amigos de Deus e dos discípulos convictos e generosos de Cristo, como foram os apóstolos, os santos e os missionários de todos os tempos.

E hoje também não será diferente. Todo esse “povo de batizados” – leigos e leigas, ministros ordenados e consagrados nos diversos carismas da vida religiosa – será tanto mais missionário quanto mais for amigo de Jesus e de Deus. É isso mesmo que o Papa Francisco indica na última parte da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (2014): só seremos evangelizadores novos se nos renovarmos no espírito do Evangelho de Cristo. E isso também é parte da “conversão missionária” proposta pelo nosso sínodo arquidiocesano.

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo Metropolitano de São Paulo
Publicado em O SÃO PAULO, na edição de 28/08/2019

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