Editorial

O Grande Segredo

Livrai-nos, bom Deus, de devoções bobas e de santos amargurados” - essa pequena oração atribuída a Santa Teresa D’ávila, nomeada Doutora da Igreja em 1970, é citada com frequência em estudos sobre a espiritualidade da Santa. E não sem um bom motivo: Santa Teresa possuía um senso de humor riquíssimo, e mais de uma vez se referiu à necessidade do bom humor para a vida católica e para a busca da santidade. Chegou a escrever que “uma freira triste é uma péssima freira”, e que tinha “mais medo de uma irmã triste do que de uma multidão de espíritos malignos”.

Outro Santo e Doutor da Igreja que aconselhou o bom humor e ressaltou a necessidade da diversão para uma boa vida espiritual foi São Tomás de Aquino. Na Suma Teológica, ele se questiona sobre a virtude dos jogos e, depois de analisar uma série de argumentos contrários, conclui que não apenas é possível existir virtude nos jogos e divertimentos, mas que eles são necessários para a vida humana: da mesma forma que um corpo sobrecarregado de trabalho, ao qual não é dado descanso, torna-se incapaz de trabalhar, a alma humana, quando privada do repouso que encontra no divertimento, torna-se incapaz de usar a razão e de buscar a Deus.

São Tomás, entretanto, faz três ressalvas importantes: o prazer buscado para o descanso não pode ser injurioso ou indecente; não se deve ceder aos excessos e perder a harmonia mental necessária para as boas obras; e todo tipo de divertimento deve ser adequado ao local e às pessoas ao redor, para que seja benéfico não apenas para sua alma, mas para a de todos os presentes.

O carnaval pode ser um exemplo de diversão sadia – mas a festa, como vivida pela maioria das pessoas, enquadra-se no que diz São Tomás? É uma diversão harmoniosa? O período do carnaval não possuí, em si, nada de pecaminoso – os riscos para a vida e, principalmente, para as almas das pessoas, não vêm da festa ou do feriado. Os riscos que o carnaval apresenta para as almas vêm da forma como ele é celebrado. Infelizmente, em muitos lugares as brincadeiras inocentes, com fantasias criativas, deram lugar ao apelo destemperado à sensualidade; as festas familiares a blocos que reúnem milhares de pessoas nas ruas da Capital , muitas delas, menores de idade. Nesses encontros se misturam foliões, álcool, drogas, sexo, violência, em um verdadeiro rebaixamento da condição humana.

Nada impede, entretanto, que o bom católico participe do carnaval: é possível dançar em um baile, assistir a um desfile, participar de um bloco – contanto que se lembre das ressalvas de São Tomás e que, evitando os locais impróprios e sem permitir que o ambiente o leve ao pecado, seja sal da terra e exemplo de conduta adequada. Mas blocos e desfiles não são as únicas opções: viajar com os amigos, aproveitar a família ou participar de um retiro de carnaval são outras ótimas possibilidades.

G. K. Chesterton, escritor inglês em processo de canonização, escreveu uma vez que “a alegria, que foi a pequena publicidade do pagão, é o gigantesco segredo do cristão”. O carnaval é um bom exemplo. Os pagãos lançam-se às ruas e entregam- -se ao pecado, achando que ali encontrarão alegria – essa é sua pequena publicidade. O católico não abdica da alegria – mas ele a encontra em um ambiente sadio, divertindo-se de maneira equilibrada e com o coração cheio de Deus. Este é o seu gigantesco segredo.

 

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