Liturgia e Vida

‘Quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; mas quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, vai salvá-la’ (Mc 8,35)

A sobrevivência é um grande instituto do homem. Deus nos criou com o desejo de perpetuar no mundo a vida humana individual e coletiva. Por isso, desejamos fortemente alimentar-nos e reproduzir-nos. Porém, por causa do pecado original, esse apetite está tristemente desordenado, e, não raro, vivemos como os animais: deixando de lado Deus e a razão, para nos entregarmos somente ao alimento, à sexualidade e às coisas materiais.

São Paulo, por isso, contrapõe o homem “carnal” ao “espiritual”. Enquanto o primeiro pensa somente no que é mundano, o outro procura o caminho árido e estreito: o que é bom, justo e leva a Deus. E Jesus nos alerta: “A vida é mais que alimento (…) buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça” (Mt 6,25.33). Nesse sentido, é necessário “perder a vida” já neste mundo, renunciando com força a toda gula e sensualidade.

Mas, para esse fim, o cristão precisa também “morrer” por meio da “mortificação”, que é a renúncia voluntária a coisas que, mesmo não sendo diretamente pecaminosas, podem nos afastar do caminho. Renunciar a caprichos na comida; escolher para si o pior em favor dos outros; não reclamar do frio, do calor, do cansaço; guardar a vista da sensualidade; trabalhar sem interrupções; aceitar com alegria as dores e doenças; não dizer palavras ociosas; renunciar a confortos… Essas e outras atitudes nos ajudam a recordar com São Paulo que “tudo posso, mas nem tudo me convém” (1Cor 6,12); e que “não temos na terra morada permanente” (Hb 13,14).

Afinal, o pecado e o estilo de vida mundano nos incapacitam a ver que “o Reino de Deus não é comida nem bebida” (Rm 14,17) e nos impedem de desejar a vida eterna e de perceber que “se é somente para esta vida que temos colocado a esperança em Cristo, somos, entre todos os homens, os mais dignos de lástima” (1Cor 15,19). Não sejamos insensatos, apegandonos desesperadamente às pequenas felicidades desta vida e esquecendonos de que o Céu é muito melhor!

E que ninguém se engane: todos morreremos! Mas a morte não é um mal. Cristo abraçou-a apaixonadamente. E, quando ela vier, compareceremos à Sua presença! Será o dia em que passaremos pela porta estreita, deixando tudo: pessoas, bens, trabalho, projetos, este mundo e, temporariamente, o nosso próprio corpo. Mas não perderemos nada! Será a chance de - talvez depois de uma purificação - ganhar tudo!

Devemos, portanto, querer morrer? Não exatamente. Devemos, sim, preparar-nos continuamente para esse momento, que será tremendo e decisivo, vivendo sempre na graça de Deus, cultivando a vida de oração, confessando-nos com frequência e recebendo a Eucaristia. Quem sabe, com uma vida santa, possamos até sentir como São Paulo: “Desejaria partir para estar com Cristo - o que seria muito melhor; mas continuar a viver é necessário por causa de vós” (Fl 1,23).

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