Fé e Cidadania

A respeito do progresso: uma bênção, maldição ou esperança?

Em 2017, foram comemorados os 50 anos da publicação da encíclica Populorum Progressio (1967), sobre o desenvolvimento dos povos. Ressoam ainda como proféticas as palavras do Beato Paulo VI, quando afirma que “o desenvolvimento é o novo nome da paz”, em vista da construção de uma nova civilização, a “civilização do amor”. Um desenvolvimento integral (“do homem todo e de todo o homem”) e solidário, que não esquece os mais vulneráveis da humanidade, que vise o bem de todos e uma justiça em escala mundial que garanta uma paz planetária e torne possível um “humanismo planetário”. Essa é a mensagem central da Populorum Progressio, que nunca perdeu sua atualidade. Muito pelo contrário, com o crescimento da exclusão via globalização, tornouse muito mais necessária e urgente hoje.

Estamos diante de uma visão de horizonte futuro marcado pela esperança. Hoje o Papa Francisco é praticamente o único líder mundial que fala corajosamente em esperança e da necessidade de paz. Ele também nos adverte de que devemos nos proteger dos chamados “profetas da desgraça”, que estão em todas as partes e que semeiam medo e aterrorizam as pessoas. Infelizmente, temos sinais negadores desse projeto de esperança. Precisamos ser realistas sem sermos pessimistas, e, nessa perspectiva, seria oportuno escutarmos Zigmund Bauman (1925-2017), pensador de origem polonesa, que ensinou Sociologia na Universidade de Leeds e faleceu aos 91 anos, no início de 2017. Bauman, portador de uma inteligência inquisidora, tornar-se-ia uma celebridade mundial com uma vastíssima obra literária a respeito dos tempos assim ditos modernos e pós-modernos, classificados como “líquidos”

Sua última obra, publicada postumamente se intitula “Retrotopia”. A utopia, ou seja, o sonho de realização, não estaria mais no futuro, mas voltou-se para o passado. Deixou um alerta afirmando que “estamos evoluindo de uma crença tola no futuro, para a mistificação infantil do passado” e entrando na “era da nostalgia”. Para Bauman, nós ainda acreditamos em “progresso”, mas agora o consideramos tanto uma bênção quanto uma maldição, sendo que o aspecto de maldição cresce rápido e o lado da bênção vai diminuindo. Nós, hoje, tendemos a projetar nossos medos, ansiedades e apreensões no futuro. Enfrentaremos crescente escassez do emprego; queda da renda e, portanto, também declínio das oportunidades de vida e aumento das dificuldades em sobreviver. E o ateísmo em relação ao futuro como um lugar para se investir esperanças nos preocupa. Não seria isto que faz com cresçam entre nós os fundamentalismos, bem como o número de pessoas que temem tudo o que é novo, e se refugiam na segurança do passado e se transformam em ferrenhos conservadores, engajando-se numa luta restauracionista?

Bauman conclui seu pensamento dizendo que “precisamos nos abraçar por um longo período de tempo em que enfrentaremos mais perguntas do que respostas, problemas do que soluções (...). O veredicto final é de que não existe ‘outra alternativa’ e seremos obrigados a enfrentar esta situação, unidos e de mãos dadas, ou então, ganharemos sepulturas comuns”!

Viver com esperança se tornou hoje uma necessidade e imperativo de sobrevivência! O mundo não está indo de mal para pior, mas também pode ir de bem para melhor! O Papa Francisco também nos lembra que “somos chamados a nos tornar homens e mulheres de esperança” (Catequeses sobre a esperança, 14 de dezembro de 2016), pois ela começa com cada um de nós!

Leo Pessini é doutor em Teologia Moral e Superior da Ordem dos Camilianos em Roma
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