Opinião

Protestos, da Venezuela ao Chile

Os violentos protestos que vêm ocorrendo em vários países têm dado mais munição para os embates ideológicos brasileiros. A direita cita a Venezuela, governada pelo “socialismo bolivariano”, recorda as manifestações dos governos de Dilma Rousseff e Cristina Kirchner; a esquerda, os recentes protestos no Chile, ícone da agenda liberal na América do Sul, e as reações aos “choques neoliberais” na Argentina e no Equador.
Respostas simplistas, que enaltecem um lado do espectro ideológico e condenam o outro, não respondem aos desafios do presente. É preciso reconhecer que a realidade não pode ser enfrentada com esquemas ideológicos, palavras de ordem e frases de efeito.
O uso da força, seja por parte dos manifestantes, seja por parte do governo, também não ajuda a resolver os problemas. Uma violência provoca outra, numa espiral cada vez mais perigosa e infrutífera. A solução dos problemas exige reflexão e sabedoria, exatamente o oposto da raiva e da agressividade. É um recado implícito que essas manifestações dão para os ativistas de nossas redes sociais, cada vez mais dedicados a semear discórdia e condenar os que pensam diferente.
Se olharmos no panorama mundial, veremos que os protestos mais ou menos violentos também vêm acontecendo em países ricos. Podem ser por razões socioeconômicas, como na França; raciais, como nos Estados Unidos; ou políticos, como em Hong Kong.
Se partirmos dos ensinamentos da Doutrina Social da Igreja, veremos em todos um ponto em comum: a dolorosa sensação de que a dignidade da pessoa humana está sendo aviltada. Não se trata apenas de enfrentar crises econômicas e privações, mas de sentir que os governos não estão levando em consideração as necessidades e expectativas da população, que existem descaso e injustiça, desrespeito aos valores e ao sentido da vida.
A dignidade pessoal é um bem maior que norteia – de forma implícita ou explícita – as decisões de cada um de nós. Toda vez que os governos não valorizam adequadamente esse valor, seja por qual motivo for, defrontam-se com a resistência popular. Em períodos que demandam grandes sacrifícios sociais, a força dos governos reside justamente em mostrar que os esforços são em prol da dignidade de cada um, que servem à construção de um bem maior, que é para todos.
Contudo, a mera indignação, ainda que justa, não gera o novo. Não basta reivindicar ou protestar, são necessárias alternativas viáveis a serem seguidas. A falta dessas alternativas faz com que a indignação se esgote em convulsões sociais, sem conduzir a uma mudança para melhor.
Nesses momentos, torna-se ainda mais fundamental uma solidariedade atenta às dificuldades dos demais, capaz de uma verdadeira empatia com o outro. Infelizmente, muitas lideranças parecem ver apenas os problemas econômicos ou suas próprias ideologias, sem considerar as pessoas concretas.
A solidariedade, para encontrar caminhos, precisa da sabedoria que se funda no diálogo – pois ninguém tem sozinho a resposta para todos os problemas sociais.
Finalmente, é necessário valorizar aqueles que já estão gerando soluções novas dentro desses contextos difíceis. Construir com eles, apoiando sua criatividade e seu empreendedorismo, seja na área econômica, seja na social, é o que a Doutrina Social da Igreja chama de ação subsidiária do Estado, que ajuda (subsidia) a sociedade, sem se impor a ela.
Sem esses passos, protestos infrutíferos e raivosos serão cada vez mais comuns.

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