Editorial

Nós, os migrantes e os refugiados

Esse ano, em 14 de janeiro, foi comemorado o 104º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado. A comemoração foi instituída por São Pio X, num longínquo 1914. O mundo ainda não havia visto os horrores de duas guerras mundiais, a Rússia era czarista, nos Estados Unidos se iniciava a produção industrial em linhas de montagem... A Organização das Nações Unidas só iria celebrar o Dia Mundial do Refugiado a partir de 2001. 

O pioneirismo da Igreja, nesse campo, vem de longe. Já no Antigo Testamento, a acolhida ao estrangeiro era um sinal de justiça (cf. Dt 10,18-19, Ex 23,9). Cristo ensina a acolher os pequenos, os que sofrem, os que são perseguidos (cf. Mt 25,31-46), e um estrangeiro, o samaritano, é o maior exemplo do amor ao próximo (Lc 10,29-37). Mais adiante na história, São Bento irá dizer a seus monges para acolherem o hóspede como o próprio Cristo que vem (cf. Capítulo 53).

Amparada nessa longa tradição, diante da maior crise migratória e de refugiados já vista no mundo, que acontece nesses nossos tempos, a Cáritas lançou uma campanha, em nível internacional e também no Brasil, intitulada “Compartilhe a viagem”. 

O vídeo institucional da Campanha, disponível na Internet, traz algumas passagens da participação do Papa Francisco, em 2017, num TED Talk (fórum internacional de divulgação de ideias, voltado a jovens e inovadores). Nele, o Papa diz que o futuro é feito por cada um de nós, pois ele “não está só nas mãos dos políticos, dos grandes líderes, das grandes empresas [...] está, sobretudo, nas mãos das pessoas que reconhecem o outro como a elas próprias e reconhecem-se como fazendo parte de um ‘nós’.” 

Na época do evento, a fala do Papa teve um grande impacto. Num âmbito em que o futuro é pensado em termos de inovações tecnológicas, investimentos financeiros, máquinas inteligentes etc., Francisco falava num futuro movido a encontros, solidariedade, esperança. E sua plateia internacional não o viu como ingênuo ou iludido, mas como alguém que falava ao coração as verdades que todos precisavam ouvir. 

Vinda da Tradição cristã, a acolhida aos migrantes e refugiados se projeta, no momento atual, como um desafio para que todos possamos construir um futuro que valha a pena ser vivido. Não se trata apenas de um dever de solidariedade, mas de uma posição pessoal necessária para que possamos viver num mundo que merece ser chamado de humano, onde todos nós poderemos ter uma vida digna. Sem solidariedade, a sociedade se deixa consumir pela barbárie e pelo egoísmo, que acabam por destruir todos os vínculos. 

Esse caminho depende da ação decidida dos governos, que devem procurar criar condições para acolher os refugiados e migrantes que chegam em situação de dificuldade; mas depende também de cada um de nós, de nossa solidariedade nas coisas cotidianas e de nosso apoio político às atitudes solidárias que o Estado deve tomar. 

O mundo em que as novas gerações viverão é aquele que nós escolhermos construir hoje.
 

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