Fé e Cidadania

A pobreza que pune os afrodescendentes

Logo após o III Dia Mundial dos Pobres, comemorado no domingo, 17, celebramos no Brasil, no dia 20, o Dia Nacional da Consciência Negra. Ambas as datas, que neste ano quase coincidem, se entrelaçam reciprocamente. São numerosos os estudos apontando que, em nosso País, a pobreza pune de forma mais acentuada a comunidade afrodescendente. Trabalhadores negros, exercendo serviços equivalentes aos brancos, em geral ganham menos que estes.
A raiz dessa diferença tem origem, ao mesmo tempo, racial e socioeconômica. Começa no berço e se estende pela vida afora. Desde cedo, os afro-
-descendentes experimentam grandes dificuldades de acesso à educação de qualidade, sobretudo no Ensino Superior. Negada essa via de mobilidade e ascensão social, muitas outras portas vão se fechando. Ativado esse círculo vicioso, o resultado não poderia ser outro: ou acabam reduzidos a uma vulnerabilidade crônica ou, no pior dos casos, acabam sendo facilmente recrutados pelo crime organizado.
O ensinamento social da Igreja, em seus documentos de maior peso e incidência, jamais deixou de alertar para os efeitos negativos de um crescimento econômico que não venha acompanhado do “desenvolvimento integral, como novo nome da paz” – expressão cunhada pela Encíclica Populorum Progressio, do Papa Paulo VI, em 1967. Com o Papa Francisco, tornaram-se ainda mais fortes as denúncias sobre o progresso técnico e científico sem  a adequada distribuição de renda.
Na sociedade brasileira, de acordo com os dados divulgados recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a extrema pobreza cresceu pelo quarto ano consecutivo, chegando a 13,5 milhões de cidadãos em 2018. Deve-se isso a um crescimento econômico vicioso e perverso, o qual caminha indiferente à progressiva disparidade social. Os indicadores referentes ao Produto Interno Bruto (PIB), por um lado, e os indicadores sociais respectivos à saúde e educação, à moradia e transporte, ao trabalho e segurança, por outro, parecem seguir em linhas paralelas. A riqueza se acumula em poucas mãos, enquanto se agrava a exclusão social de grande parte da população.
Semelhante estado de coisas sobrecarrega, em especial, os ombros das comunidades indígenas, afrodescendentes e quilombolas, bem como das mulheres, mais ainda se estas fazem parte daquelas populações. Como reverter essa situação de injustiça e desequilíbrio social? Voltando ao tema da Campanha da Fraternidade de 2019, como pensar em políticas públicas voltadas à redução efetiva das desigualdades sociais? Num País tão rico, mas em que grande parte da população continua pobre, urge implementar políticas públicas de inclusão e desenvolvimento.
Uma boa reflexão para o Dia Nacional da Consciência Negra é o livro de Itamar Vieira Junior, “Torto Arado”, vencedor do Prêmio LeYa 2018 (editora Todavia, São Paulo, 2019). O escritor baiano usa a memória de uma comunidade quilombola para rever e reescrever a verdadeira história da escravidão no passado, e, no presente, das “condições análogas à escravidão”, depois da abolição da escravatura.

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