Espiritualidade

Ele não é o Deus de mortos, mas sim de vivos

Estamos nos aproximando do fim do ano litúrgico e civil. Logo, iniciaremos o tempo do Advento, que marca o começo do novo ano litúrgico, bem como teremos a “corrida de São Silvestre”, um dos últimos acontecimentos do ano civil na cidade de São Paulo. No entanto, antes que essas coisas comecem a acontecer, ainda concluindo o itinerário anual da história da salvação, chamo a atenção para o tema das últimas realidades de nossa fé: a ressurreição dos mortos.  
Para esclarecer essa dimensão de nossa fé, Jesus se utiliza de um caso apresentado por um grupo de saduceus composto por famílias ricas pertencentes à elite de Jerusalém, de tendência conservadora, que negava a ressurreição. Preocupados em manter seus privilégios e querendo enfraquecer a influência de Jesus, apresentam um caso cheio de fantasias. Falam-lhe de sete irmãos que foram casados sucessivamente com a mesma mulher. Querem saber com quem a mulher ficará quando ressuscitar dos mortos. 
Jesus lhes responde, mostrando que a ressurreição não consiste na reanimação de um cadáver, como o que aconteceu com o jovem de Naim ou com Lázaro, e muito menos num simples prolongamento desta vida. Com efeito, “os filhos deste mundo casam-se e dão-se em casamento, mas as pessoas que merecem alcançar a ressurreição e a vida futura nem hão de casar nem ser dados em casamento”. 
“Na história do Céu, desaparecem os gestos de tomar e de ter, a mulher não será de ninguém, porque já ninguém será posse de ninguém. Não mais se desposarão: nessa altura, será inútil o Matrimônio, mas não o amor. Não se desposarão, mas ainda amarão, porque amar é a plenitude de Deus e a plenitude do homem” (Ermes Ronchi, sacerdote italiano). Não podemos representar a vida ressuscitada por Deus a partir de nossas experiências atuais. Há uma grande diferença entre nossa vida terrena e a vida plena sustentada pelo amor de Deus. Podemos e devemos esperá-la, mas nunca descrevê-la e explicá-la, pois são “as coisas que os olhos não viram nem os ouvidos ouviram nem o coração humano imaginou, tais são os bens que Deus preparou para os que o amam” (1 Cor 2,9).
“Deus não é o Deus dos mortos, mas dos vivos, pois todos vivem para Ele.” A fé na ressurreição não pode ficar reduzida a questionamentos sobre o que vai acontecer depois da morte, mas em um modo de vida que nos compromete a não nos conformarmos com as estruturas deste mundo e nos leva a transformar e renovar nosso coração e nossa mente. Como Jesus, cremos que Deus é amigo da vida. “Deus é fonte inesgotável de vida. Deus criou os viventes, cuida deles, defende-os, compadece-se deles e resgata sua vida do pecado e da morte. Ele se compadece de todos os que não sabem ou não podem viver de maneira digna. Chega-se, inclusive, a ‘fechar os olhos’ aos pecados dos homens, para que descubram novamente o caminho da vida” (Pagola, sacerdote espanhol).
Assim sendo, a certeza da ressurreição não deve ser apenas uma realidade que esperamos, mas deve influenciar as nossas ações, as nossas atitudes, os nossos valores. O Papa Francisco diz que “a ressurreição não é só o fato de ressuscitar depois da morte, mas é um novo gênero de vida que já experimentamos no hoje; é a vitória sobre o nada que já podemos antegozar. A ressurreição é o fundamento da fé e da esperança cristã! Se não houvesse a referência ao Paraíso e à vitória eterna, o Cristianismo seria reduzido a uma ética, a uma filosofia de vida. Ao contrário, a mensagem de fé cristã vem do Céu, é revelada por Deus e vai além deste mundo. Acreditar na ressurreição é essencial para que cada um dos nossos atos de amor cristão não seja efêmero, nem um fim em si mesmo, mas se torne semente destinada a desabrochar no jardim de Deus e produzir frutos de vida eterna”. É a certeza da ressurreição que nos dá coragem para enfrentar as forças da morte que dominam o mundo, de forma que o novo céu e a nova terra que nos esperam comecem a se desenhar desde já. 

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