Comportamento

Os sexagenários e seus netos

Os sexagenários que olham para sua vida de criança e depois se voltam para seus netos encontram uma distância de anos-luz entre as duas gerações. Como a infância mudou! Cada vez mais, a Pediatria afirma que este é o período mais importante, de modo particular os primeiros três anos, que determinam o que um ser humano provavelmente será por toda a vida. Não é destino. Muito menos se afirma que os acontecimentos ao longo do tempo não influenciarão no desenvolvimento e comportamento das pessoas. Contudo, as expectativas e reações estarão muito pendentes da maneira como vivemos os nossos primeiros anos, dos quais a memória consciente se oculta, mas as consequências da sua existência perseveram. Portanto, há de se dar importância à infância.  

Muito se transformou da época dos avós, quando crianças, para a época de seus netos de hoje. Desde o ambiente familiar, as pessoas de convivência, as brincadeiras, os passeios, a comunicação, a escola, a interação com o mundo, os compromissos precoces, a educação, as expectativas, o estresse! Uma infinidade de temas! Sem se arriscar pelo atrevimento da simplicidade, escolhemos três itens: família, relacionamentos e expectativas. Não se trata de críticas, mas de fatos. 

A criança nasce para o mundo frágil, indefesa e dependente para fazer qualquer coisa. Há um desenvolvimento fantástico nos primeiros três anos! No passado, tudo ocorria na intimidade da família, na temperatura estável do quarto para sala. Agora, são saídas madrugadoras para chegar aos berçários, com sol ou chuva, com frio ou secura. A mama e o calor materno são substituídos pela mamadeira e funcionários desconhecidos que podem ser diferentes no dia a dia. O ambiente tranquilo e silencioso é trocado pelo choro de muitos. O ar saudável agora está repleto de vírus e bactérias trazidos cada vez por um, num rodízio de micro-organismos que vai acometendo a todos repetidas vezes. O cuidado personalizado é institucionalizado. Volta-se para casa, às vezes já com a lua, dormindo no carro ou no ônibus. Amanhã recomeça tudo... E a família?

Da infância na companhia dos pais e irmãos, tios e avós, até que se iniciasse a escola, com 5 ou 6 anos, passou-se à convivência desde os primeiros meses nas creches e escolinhas. Antes mesmo de se descobrir como pessoa, a criança já precisa ir se defendendo no mundo. Poucos meses nesta fase podem fazer uma diferença enorme no comportamento dos pequenos. Alguns ainda não falam nada, outros já empurram. O quanto isso interfere no desenvolvimento pessoal ou deixa marcas pela vida, na dependência das características íntimas de cada criança, não é irrelevante. Passados poucos anos, já com certa autonomia, desenvolve-se a importância da consciência sexual, naturalmente; no passado, reforçada nas pessoas do pai e da mãe. Agora, em escolas com ideologia de gênero, cria-se uma perturbação. Sem qualquer capacidade de discernimento, as crianças estão expostas à “globalização sem limites” pelos eletrônicos (TV, tablet, celular). Não é demais lembrar que o contato com eletrônicos na infância deve ser postergado e muito controlado. Atenção à “programação infantil”, em que os heróis foram totalmente deturpados, e os virtuosos foram substituídos pelos maldosos. A sensualidade já se apresenta para menores de 3 anos. 

Para finalizar, sem exaurir o tema, as expectativas. Agendas infantis superam as de muitos diretores executivos. Desde a escola regular, acrescida de cursos de idiomas, esportes em várias modalidades, instrumentos musicais, excursões em todo fim de semana... Cada um desses itens está muito bem na sua proposta, mas necessita ser dosado responsavelmente, conforme as características de cada criança. Não se pode injetar o vírus do ativismo como parte do calendário de vacinação. Se a vacina protege contra um possível mal futuro, a competitividade exagerada desenvolve angústia, baixa autoestima, esgotamento físico-mental, como temos assistido precocemente.

Quando eu me sentava na sala e ouvia as histórias da minha avó, comendo um doce feito por ela; ou ia ao circo com meu avô, e ficava mais tempo em casa com meus pais; eu não tinha tanto “conhecimento”. Não existia a globalização pelos “eletrônicos”. A educação estava em respeitar os mais velhos, manter a ordem nas coisas e não repetir de ano na escola. Saudosismo nostálgico? Perdemos os avós para academias e cursos; os pais são substituídos por creches e pela tecnologia; as crianças anseiam por ser o melhor youtuber. Cresceu a violência familiar, passam de ano sem saber nada, e os terapeutas estão com agendas lotadas. Progredimos? Somos mais felizes? 

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