Liturgia e Vida

‘Servos inúteis’ (Lc 17,10)

27º Domingo do Tempo Comum – 6 DE OUTUBRO DE 2019

Hoje, facilmente nos iludimos pelo desejo de ser “protagonistas”. Valorizam-se homens e mulheres “independentes”, que vivem “por conta própria”. Nos jovens, incute-se a pretensão de serem “originais”; de trilhar “o seu próprio caminho”; de “romper com os padrões”… Criou-se uma “moral” falsa que identifica o bem e a felicidade com a “originalidade” e a “independência”.

Para uma cabeça formatada nesse modo de pensar, são chocantes e incompreensíveis as palavras do Senhor: “Quando tiverdes feito tudo o que vos mandaram, dizei: ‘Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer’” (Lc 17,10). Na verdade, somos “servos”, dependentes de Alguém maior do que nós. E somos “inúteis”, dispensáveis: o verdadeiro protagonista, que faz as coisas acontecerem, é Deus. Somos, quando muito, colaboradores. Somente Ele pode dizer “sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5). 

Diante do bem que fazemos, não podemos nos vangloriar. É preciso levantar as mãos e agradecer Àquele que é a fonte de todo o bem, dizendo: “Não a nós, Senhor, não a nós; mas ao vosso nome seja a glória!”. É Deus quem nos capacita, inspira e sustenta na prática do bem e, se ainda não praticamos mais coisas boas, é porque não correspondemos a todas as graças que Ele nos dá. Se o fizéssemos, seríamos já santos. 

Particularmente, no que se refere à fé, é preciso reconhecer humildemente que, como bons “servos”, nada mais temos a fazer do que preservar com fidelidade o que foi recebido do Senhor: “Guarda o precioso depósito, com a ajuda do Espírito Santo que habita em nós” (2Tm 1,14). Com “fortaleza, amor e sabedoria” (2Tm 1,7), aprendemos a viver a fé de modo concreto nos diferentes lugares e momentos da vida. Porém, isso não significa “inventar” uma nova religião, “refundar” a Igreja a cada geração… Nosso trabalho é transmitir o tesouro recebido do Evangelho e da Tradição: “Usa um compêndio das palavras sadias que de mim ouviste em matéria de fé e de amor em Cristo Jesus” (2Tm 1,13). 

Se por si só é pueril a ideia de querer ser sempre “original”, esta chega a ser ridícula e mundana quando invade os corações dos homens de Deus. Somos “servos inúteis”! Não somos “protagonistas” de revoluções, nem gênios com a missão de reinventar a roda. O encargo que a Escritura nos dá é de apenas imitar Jesus e os santos que nos precederam: “Lembrai-vos de vossos dirigentes, que vos pregaram a Palavra de Deus; considerando o fim de sua vida, imitai-lhes a fé. Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e sempre” (Hb 13,7-8). 

Às vezes, ouvem-se afirmações de que a Igreja precisaria sobretudo “mudar”! “Mudar” a disciplina, a organização, a moral… Teria de ser mais “original”, para atrair os homens… Deveria “dar protagonismo” a este ou àquele grupo (e não a Cristo!)… Nessas vozes, não há sabedoria. Não ecoa o Espírito de Jesus. Ignoram que somos “servos dos mistérios de Deus”. E o que se requer dos servos não é que sejam “originais” e “protagonistas”, mas sim “que sejam fiéis” (1Cor 4,2).

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