Opinião

‘Silêncio e oração’

Essa frase encontra-se no piso, logo na entrada, da centenária e magnífica Igreja Imaculado Coração de Maria, na rua Jaguaribe, em São Paulo. Não dá para não ver.

Por que essa mensagem está ali colocada? Será uma manifestação anacrônica? Terá ainda validade nestes tempos de comunicação frenética? Será que é para nós?

Essa frase, na verdade um incisivo conselho, tem, mais do que nunca, validade. Manifesta a necessidade cada vez mais premente de urbanidade na Casa de Deus.

Participamos, às vezes sem nos dar conta, em cada missa, do mais importante acontecimento de nossas vidas e de todo o universo. Nele, podemos nos relacionar intimamente com o próprio Cristo que, por meio do sacerdote, faz-se presente em Corpo, Sangue, Alma e Divindade. Torna presente, com o mesmo Amor, o Sacrifício do Calvário. É estonteante! São João Maria Batista Vianney, o Cura d’Ars, dizia que “se conseguíssemos compreender a Santa Missa, morreríamos”.

Na liturgia, culto público a Deus, atividade da comunidade, todos e cada um têm o direito e o dever de participar ativamente. Assim, regras de convívio são necessárias para que se possa participar da melhor maneira, respeitando Deus, os outros e a dignidade do sacramento.

É fácil perceber a diferença de comportamento necessária entre um coquetel de confraternização em uma praça daquele realizado em uma sala de concertos ou de apresentação a uma autoridade. Os objetivos e os comportamentos são distintos.

Como nos comportaríamos ante um alto dignatário para pedir alguma coisa? Imagino que colocaríamos uma roupa arrumada, dentro de nossas possibilidades. Na sua presença, evitaríamos fazer ligações telefônicas, falar alto, formar grupinhos de bate-papo ou atrapalhar os vizinhos: prestaríamos atenção. A missa merece muito mais do que isso! Cristo merece ser tratado com urbanidade!

A oração (falar com Deus) e o silêncio são, desde sempre, companheiros de jornada. Podemos ler no Evangelho de São Mateus (6,5-6). “Quando orardes, não façais como os hipócritas, que gostam de orar de pé nas sinagogas e nas esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade, eu vos digo: já receberam sua recompensa. Quando orares, entra no teu quarto, fecha a porta e ora ao teu Pai em segredo; e teu Pai, que vê num lugar oculto, recompensar-te-á.”

Será que Cristo se importa com que o tratemos com carinho? O Evangelho de São Lucas (7,36-50) nos garante que sim: quando na casa de Simão, o leproso, Ele lembra ao anfitrião: “Vês esta mulher? Entrei em tua casa e não me deste água para lavar os pés; mas esta, com as suas lágrimas, regou-me os pés e enxugou-os com os seus cabelos. Não me deste o ósculo; mas esta, desde que entrou, não cessou de beijarme os pés. Não me ungiste a cabeça com óleo; mas esta, com perfume, ungiu-me os pés. Por isso, digo-te: seus numerosos pecados lhe foram perdoados, porque ela tem demonstrado muito amor. Mas ao que pouco se perdoa, pouco ama”. Seremos nós como Simão ou como a mulher?

Respeitar Cristo e nossos irmãos por amor a Cristo pode ter manifestações práticas no ambiente das igrejas: vestir-se com modéstia e discrição, manter silêncio, permitindo a nós e aos outros fazer oração, evitar “rodinhas” e bate-papos dentro da Igreja ao se encerrar a missa, manter um ambiente de oração com Cristo que se nos entrega. Está aí uma boa campanha para que, juntos com nossos párocos, possamos sensibilizar nossas comunidades.

Talvez possamos, como a mulher do Evangelho, ouvir ao final: “Perdoados te são os pecados”.

Luiz Eugênio Garcez Leme é professor da Faculdade de Medicina da USP, onde se dedica à área de Geriatria.
 

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