Opinião

Escolhe, pois, a vida

O massacre ocorrido há poucos dias em Suzano (SP) coloca em pauta, novamente, o tema da vida. Em linha com o artigo 3º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948: Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Posso pensar, no caso do homicídio coletivo: quem matou? E quem permitiu que essas mortes ocorressem? Ora, sabemos quem matou. Nunca conseguiremos saber o porquê. Fica-nos, então, a segunda pergunta: quem permitiu que tais mortes ocorressem? A essa pergunta, prontamente, o responsável último apressou-se a responder: é o Estado de São Paulo, que não fez funcionar adequadamente o aparato de segurança e que, de imediato, compromete-se a indenizar as famílias de todas as pessoas atingidas.

E vem a etapa seguinte desta reflexão: como impedir novas tragédias?

Evidentemente, não será armando as pessoas ou facilitando que elas tenham acesso a armamentos. Logicamente, não será colocando policiais em cada escola, em cada equipamento público, em cada lugar. Essa militarização do problema atinge a segunda expressão do mesmo artigo 3º: a liberdade. Nenhum estado policial convive bem com a liberdade. Temos, por conseguinte, um único caminho: escolher a vida. Escolher a vida em plenitude mediante a educação para a paz. A implantação paulatina e progressiva da verdadeira cultura de paz.

Que comecemos logo! Jamais fiquemos calados diante do incentivo à violência; diante da violenta abordagem a pessoas e famílias por simples e infundadas suspeitas! Não deixemos sem resposta pronta e adequada a incitação à violência propalada por toda a sorte de meios de comunicação, muitos dos quais nem mesmo têm a sua origem identificada formalmente.

Ao escolhermos a vida, devemos e podemos valer-nos dos mesmos caminhos do adversário: os meios modernos de comunicação, mediante mensagens de paz e de concórdia. Pregação sistemática e intensa da não violência, do desarmamento, da cultura de paz.

Há outro ponto alarmante, nesse contexto, de que não podemos nos descurar. É o daquele terceiro jovem que deixou de atuar efetivamente no fatídico episódio.

Por mero acaso, ou mesmo porque os outros dois não sentiram firmeza no desiderato criminoso desse triste personagem, ele foi deixado à margem. E esse fato, lateral, acende o alerta vermelho em todas as direções, notadamente sobre a qualidade dos jogos eletrônicos que, como se sabe, servem de distração para milhões de jovens no mundo inteiro. Grande parte desses games quer o resultado máximo: a eliminação do adversário. Não deixa por menos!

Eis essa doutrinação sistemática em prol de verdadeira cultura de morte, como alertara São João Paulo II, que é movida pela violência e pelo dinheiro. A escolha da vida exige, nesse particular, que se intentem campanhas, pelos meios de comunicação idôneos, de desarmamento virtual e, até mesmo, que se instituam mecanismos de punição a quem fomente essa cultura.

Virá a grita daqueles que querem a liberdade de expressão? Sem dúvida! No entanto, contra essa gritaria terá que prevalecer o interesse superior da vida e da cultura de paz. Enfim, pode ser que não poucos nos digam que caminhamos na linha oposta ao que propõe e prega a maioria. Eis a comprovação cabal de que estamos no rumo certo. Integraremos o pequeno rebanho a quem o Príncipe da Paz exorta: não temais!

Em primeiro lugar, a vida. Vida que se oponha à cultura de morte que, por incrível que pareça, até mesmo diante da tragédia a que acabamos de assistir, parece querer se impor a todo custo.

Wagner Balera é professor titular de Direitos Humanos na Faculdade de Direito da PUC-SP, líder do Grupo de Pesquisa Direito e Direitos dos Refugiados, coordenador da Revista Brasileira de Direitos Humanos (Magister Editora)
 

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