Fé e Cidadania

Mãe Aparecida, rogai por nós!

Entre os dois turnos das eleições de 2018, celebramos a Festa da Padroeira do Brasil, Nossa Senhora da Conceição Aparecida. Mais do que nunca, o Brasil necessita de sua intercessão para guiar com justiça e sabedoria os rumos do País. Pode ser oportuno, portanto, retomar alguns princípios fundamentais da Doutrina Social da Igreja (DSI), no que concerne ao ensinamento eclesial voltado para a ação social, econômica e política. 

Vem, de início, a centralidade e a dignidade de toda pessoa humana. Os indicadores econômicos e financeiros cedem o lugar aos indicadores sociais. Mais do que concentrar-se sobre os números do PIB, o sobe e desce da Bolsa de Valores, a taxa de juros ou a relação dólar-real, a política tem como tarefa primeira e primordial verificar as condições de trabalho, saúde, esducação, segurança, transporte público, alimentação, moradia... Distribuição dos frutos do trabalho em lugar do acúmulo nas mãos de poucos privilegiados.

Depois, temos a busca do bem comum como outra grande preocupação da Igreja. O Estado tem por função garantir o destino universal dos bens, resultado combinado do trabalho, da técnica e do progresso. Como fio condutor dos documentos da DSI, o bem-estar da população, especialmente dos pobres e excluídos, está acima do individualismo, como também dos interesses corporativos, de classe ou dos lucros privados. A base da pirâmide social tem primazia sobre os habitantes do andar superior. Evita-se com isso que “ricos cada vez mais ricos (vivam) à custa de pobres cada vez mais pobres”, dizia São João Paulo II em sua visita ao México. 

Desde a Rerum Novarum (1891), documento inaugural da DSI, sublinha-se o primado do trabalho sobre o capital. Entram aqui as condições de vida dos produtores rurais, dos profissionais liberais e dos trabalhadores urbanos. Como está o acesso à terra e ao mercado de trabalho? Disso deriva a situação concreta de outros direitos humanos. O desemprego e o subemprego fecham muitas portas. Como superar a pobreza, a miséria e a fome? Trabalho digno e honesto e não apenas assistencialismo. Políticas públicas e não apenas políticas compensatórias. 

A um mero crescimento econômico, impõe-se o desenvolvimento integral. Parte-se de uma pergunta inquietante e não sempre levada a sério em pleno século XXI: como uma era de tantos avanços tecnológicos é, simultaneamente,  uma era de tanta fome e subnutrição em tantas regiões do mundo? Como é possível que o progresso concentre, ao mesmo tempo, renda e riqueza de um lado e exclusão social de outro? Daí o desafio para superar as injustiças socioeconômicas, as assimetrias e as disparidades, seja em nível regional, nacional e internacional. Daí o apelo a relações de produção, de comércio e de consumo mais igualitárias na economia globalizada.

Entre as tarefas do Estado, a DSI, ao longo da história, tem destacado a função social da propriedade privada. Sobre esta, de fato, “pesa uma hipoteca social”, para usar novamente uma expressão de São João Paulo II. Verifica-se a evolução de um princípio rígido, formal e legalista de posse para uma visão mais atenuada. A ênfase desloca-se do título de propriedade para seu uso solidário. Sob semelhante enfoque, antes de um bem pessoal privado, a propriedade está subordinada aos interesses maiores da sociedade e à busca do bem comum. 

Repercutem aqui as palavras do Papa Francisco: passar da “economia que exclui e mata” ou da “globalização da indifereça” à “cultura da inclusão e da solidariedade”. Por isso, Mãe Aparecida, rogai por nós! 

 

Padre Alfredo José Gonçalves, CS, teólogo, é o atual Vigário Geral da Congregação dos Missionários de São Carlos (scalabrinianos). Realizou trabalhos pastorais em favelas, cortiços e no interior do Estado de São Paulo  com os migrantes cortadores de cana-de-açúcar. Foi diretor do CEM-Centro de Estudos Migratórios de São Paulo, assessor do Setor Pastorais Sociais da CNBB, Superior da Província São Paulo dos Padres Scalabrinianos.
 

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