Opinião

Querida Amazônia, filha da Laudato Si’

“A Amazônia querida apresenta-se aos olhos do mundo com todo o seu esplendor, o seu drama e o seu mistério” (Querida Amazônia, QAm 1).

“Sonho com uma Amazônia que lute pelos direitos dos mais pobres, dos povos nativos, dos últimos, de modo que a sua voz seja ouvida e sua dignidade promovida [...]; que preserve a riqueza cultural que a caracteriza e na qual brilha de maneira tão variada a beleza humana [...]; que guarde zelosamente a sedutora beleza natural que a adorna, a vida transbordante que enche os seus rios e as suas florestas [...]; com comunidades cristãs capazes de se devotar e encarnar de tal modo na Amazônia, que deem à Igreja rostos novos com traços amazônicos” (QAm 7).

“Como cristãos, não renunciamos à proposta de fé que recebemos do Evangelho. Embora queiramos empenhar-nos lado a lado com todos, não nos envergonhamos de Jesus Cristo. Para quantos O encontraram, vivem na sua amizade e se identificam com a sua mensagem, é inevitável falar d’Ele e levar aos outros a sua proposta de vida nova” (QAm 62).

“A inculturação do Evangelho na Amazônia deve integrar melhor a dimensão social com a espiritual, para que os mais pobres não tenham necessidade de ir buscar fora da Igreja uma espiritualidade que dê resposta aos anseios da sua dimensão transcendente. Naturalmente, não se trata de uma religiosidade alienante ou individualista que faça calar as exigências sociais de uma vida mais digna, mas também não se trata de mutilar a dimensão transcendente e espiritual como se bastasse ao ser humano o desenvolvimento material” (QAm 76).
Os parágrafos citados podem sintetizar a Exortação Apostólica Querida Amazônia. Eles mostram seus dois grandes vínculos com a Laudato Si’: (1) a ecologia integral, que engloba os âmbitos ambiental, social e espiritual; (2) a adesão a Cristo, que não é um “a mais”, mas a origem da qual brota “tudo mais”.

Jorge Mario Bergoglio é um homem que se sentiu profundamente amado, de um modo maravilhoso e que transcende toda a realidade visível, mas que o leva a se maravilhar e amar toda a realidade visível. Esse é o segredo de Francisco (e, de uma forma ou de outra, de todos os grandes papas e santos da Igreja). É isso que o torna fascinante para o mundo, que o faz ser uma luz que ilumina a questão ambiental e, agora, a questão amazônica.

Na esteira da Laudato Si’, também Querida Amazônia vai se articulando em torno de dois polos: a indignação diante dos erros humanos e o fascínio diante da beleza da Criação. Numa perspectiva cristã, um polo necessita do outro para ser plenamente compreendido.

A Amazônia é “nossa”, dirá Francisco. Não como um objeto de posse, porém, mas como uma criatura amada, como os irmãos podem se referir à mãe como “nossa”, sem que isso implique posse sobre ela, para usar o exemplo do Papa (QAm 5,55). Isso, no entanto, implica, com certeza, uma responsabilidade compartilhada para com ela.

Por outro lado, a centralidade de Cristo, o maravilhamento com a beleza e o compromisso com o irmão vulnerável são dimensões da vida cristã que valem para a realidade amazônica e para a vida de qualquer cristão, em qualquer lugar do mundo. Nesse sentido, Querida Amazônia ajuda a nos abrirmos para uma vida de fé e uma espiritualidade mais profundas e mais belas.

Tentações realmente diabólicas procuram fazer com que nos fixemos em detalhes polêmicos vinculados à questão amazônica. Será realmente uma pena, contudo, se perdermos toda a riqueza e beleza inspirada pelo Espírito por nos determos nas querelas humanas, por mais importantes que pareçam.

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