Editorial

Os sonhos de Francisco

A tão esperada Exortação Apostólica Pós-Sinodal Querida Amazônia foi publicada em 12 de fevereiro e, dividida em quatro capítulos, traz importantes reflexões do Papa Francisco com relação à região da Amazônia. Mais do que reflexões, ele apresenta seus pensamentos como “sonhos”, ou seja, expectativas e esperanças.
O primeiro dos sonhos de Francisco é “uma Amazônia que integre e promova todos os seus habitantes, para poderem consolidar o ‘bem viver’”.
É um sonho de equidade social, de promoção humana, de integração entre os ideais de preservação do meio ambiente e dos biomas regionais – importantes não apenas para o bem-estar dos habitantes locais, mas do planeta – e o empenho de superação da pobreza. 
“Apesar do desastre ecológico que a Amazônia enfrenta, cabe destacar que uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nas discussões sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra quanto o clamor dos pobres. Não serve um conservacionismo que se preocupa com o bioma, mas ignora os povos amazônicos”, diz o Papa.
Na página 7 desta edição, O SÃO PAULO apresenta a primeira de uma série de quatro análises com chaves de leitura para Querida Amazônia. Isso porque há muito mais no documento do que o relatado nos principais veículos de comunicação do Brasil.
A Exortação, lamentavelmente, não recebeu da imprensa brasileira a atenção devida. Os maiores meios do eixo Rio-São Paulo, no dia da publicação, limitaram-se a replicar informações de agências internacionais que reduziram a importância do documento pontifício a um único tema: a suposta negação de Francisco ao acesso de homens casados ao sacramento da Ordem no grau de presbítero.
Por falta de compreensão (ou de autêntico interesse em temas que desafiam suas convicções), talvez esperassem um decreto papal que revolucionasse a história. Não era esse, porém, o objetivo do Sínodo para a Amazônia, convocado pelo Papa para pensar sobre novos caminhos da Igreja na região.
Quem não leu Querida Amazônia com olhos atentos perdeu a oportunidade de captar a mensagem de unidade e reconciliação do Papa para toda a Igreja, que não atua por meio de concessões nem de obsessões.
Essa não é a essência da Igreja e, tampouco, o jeito de “caminhar” do Papa Francisco. Ele coloca o discernimento pessoal e coletivo no centro de todas as ações. Ele acredita, verdadeiramente, que o Espírito Santo guia a Igreja, e que é preciso ouvi-lo por meio de constante diálogo e oração. As decisões são consequências naturais desse processo.
O próprio Francisco pediu que Querida Amazônia fosse lida em sintonia com o documento final do Sínodo para a Amazônia, aprovado pelos bispos em outubro do ano passado. Texto que ele não pretende “nem substituir nem repetir”.
Ainda há tempo de ouvir o alerta do Papa por uma economia mais justa, pela defesa dos povos nativos, pelo combate à pobreza e pela proteção da Amazônia. Ela, mesmo com sua beleza e identidade incomparáveis, está sob crescente ameaça. 
Com a floresta, rica tanto em recursos quanto em desafios, também está ameaçado o futuro do nosso planeta. O Papa Francisco nos convida a abrir os olhos para a Amazônia, a dialogar com os povos nativos e a “se indignar” contra toda injustiça, para que as comunidades cristãs sejam tão vivas e singulares como os rios e florestas da Amazônia.
 

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