Opinião

O debate democrático versus notícias falsas

O processo eleitoral de 2018 será extremamente desafiador para os brasileiros, não apenas por conta do intrincado cenário político, mas pela exigência de redobrada atenção de todos na hora de pôr o voto na urna diante da disseminação de notícias falsas. Vivemos hoje o fenômeno das chamadas fake news sobre os eleitores, o que promete adicionar especial dificuldade ao debate democrático. A propagação de inverdades na seara do ambiente eleitoral não é novidade histórica, sempre surge na tentativa de favorecer candidatos, mas a rapidez e o alcance da difusão desse tipo de conteúdo fazem diferença, incentivados pelo avanço da tecnologia.  

O emaranhado de informações veiculadas em especial nas redes sociais e tidas como falsas acerca de políticos americanos e franceses atingiu campanhas e confundiu a população recentemente nesses países. Na França, o partido de Emmanuel Macron – à época candidato – chegou a solicitar que o Ministério Público do País investigasse perfis criados on-line na reta final do pleito eleitoral. O político foi acusado por adversários de ser titular de empresa offshore nas Bahamas. Já a campanha do americano Donald Trump está sob suspeita de ter contado com a ajuda de produção de fake news por parte do governo russo. 

O Brasil não está à margem do grave processo que se vê no mundo. É urgente enfrentarmos o tema, sobretudo agora, quando passamos por momento político com novas regras para as campanhas e com os eleitores cansados da corrupção, tornando-se presas fáceis desse tipo de armadilha. Em ambientes hostis, proliferam os riscos que as notícias falsas representam para a lisura dos debates e para a democracia, e que não podem ser subestimados. 

Tornou-se essencial amplificarmos o assunto e os mecanismos que podem ser utilizados nesse combate. Administradores das redes sociais anunciam medidas no sentido de minimizar o mal-estar que o tema vem causando. O Facebook fez, pelo menos, duas alterações desde o ano passado com o objetivo de reduzir o alcance de notícias falsas. 

A advocacia, guardiã constitucional do Estado Democrático de Direito, tem um papel relevante neste momento. Em nosso meio, o tema ganha corpo e há correntes que divergem em relação à necessidade de o País elaborar, ou não, uma legislação específica. O próprio conceito é, ainda, impreciso. Notícia falsa tem sido compreendida como conteúdo disseminado com o propósito de confundir ou manipular e, a partir desse entendimento, o Congresso Nacional reúne ao menos três projetos de lei para tratar do tema. Um deles busca criminalizar quem compartilha ou divulga uma notícia falsa. Mas, por exemplo, o ato de compartilhar informações erradas porque se crê de fato nelas poderia ser classificado como criminoso? Como provar a intenção dolosa? A Justiça brasileira conseguiria checar a chuva de denúncias que certamente ocorrerá em tempo hábil, em meio a uma eleição? Os tipos penais existentes em nosso ordenamento jurídico – como crimes de calúnia, injúria e difamação, por exemplo – seriam suficientes? A lista de questões é infindável. 

Não à toa, o universo das fake news ganhou especial atenção do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, fora o mundo jurídico e as redes sociais, o assunto tem sido agenda frequente entre os profissionais de comunicação. Todas as questões elencadas, e muitas outras, terão de ser respondidas. A OAB de São Paulo abraça esse tema como uma de suas bandeiras em 2018. Queremos incentivar a troca de ideias, ao unir profissionais de diversos campos, visando reduzir os prejuízos à qualidade do debate democrático. 

Arte: Sergio Ricciuto Conte

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