Comportamento

Nascidos digitais – de quem estamos falando?

Como tratamos no último artigo, estamos diante de uma geração de “nascidos digitais”. Nosso desafio está em pensar a sua educação e crescimento dentro dessa realidade. 
Não podemos imaginar, no entanto, que toda a diferença que vive essa geração se dá simplesmente pelo fato de ter nascido na época da ascensão do mundo digital, pois esse pensamento empobreceria um contexto social importante para podermos compreender e ajudar os atuais adolescentes.  
Em primeiro lugar, cabe lembrar que as gerações desde 1990 são aquelas que foram formadas a partir da mentalidade ocidental forjada nos últimos anos da década de 60, especialmente pós-movimentos estudantis que reivindicavam uma liberdade radical. A mentalidade nascida nessa ocasião foi se estabelecendo e encontrou nos pais dessas novas gerações a naturalidade necessária para ser transmitida. A radicalização da liberdade pleiteada, segundo José Luis Comellas (in Historia breve del mundo reciente, 2005), significava: “liberdade pessoal para agir conforme os próprios impulsos sem limitações nem preconceitos. O homem deve confiar em seus instintos e satisfazer os seus desejos sempre que não haja um dano certo aos demais, ainda que essa satisfação que se procura vá contra as normas estabelecidas, as leis promulgadas e os princípios da educação que nos foram ensinados.” Segundo ele, essa filosofia fomenta atitudes individualistas e um comportamento mais espontâneo que se julga mais “autêntico” e vai contra as normas e leis sociais tomadas como “repressivas”. Ou seja, crianças e jovens educados em função de seus interesses e realização de desejos. Por outro lado, na mesma ocasião, havia um clima de ascensão econômica global, que permitiu que os jovens crescessem rodeados de conforto material e alto índice de consumo sem nenhum esforço. 
Somado a todo esse panorama, há também o ingresso maciço das mulheres no mercado de trabalho, que alterou significativamente a dinâmica familiar.
Trata-se de todo um panorama que marcou o modo de educar nossos filhos e, consequentemente, os resultados que a sociedade vem colhendo. 
Temos famílias muito menores, com os pais assumindo atividades profissionais em tempo estendido, a valorização do bem-estar material em alta, e adolescentes em casa, muitas vezes sozinhos, ou sob supervisão de alguém que não domina os meios tecnológicos com os quais eles se relacionam a maior parte do tempo. Muito embora os pais lutem e busquem saídas para equilibrar a vida profissional e familiar, estamos longe de encontrar uma solução para esse dilema, e nossos adolescentes navegam na internet com uma autonomia prematura. 
Entre os 12 e os 15 anos, os adolescentes buscam especialmente os videoclipes na internet. A maioria desses apresenta transgressões sexuais, provocações religiosas, incentivos individualistas e atitudes que vão contra as normas estabelecidas. Grande parte desses videoclipes não é conhecida pelos pais, e, por isso, não é discutida para que possam olhá-la criticamente. Os videogames também circulam entre os passatempos preferidos dos adolescentes, acompanhados dos programas de TV, especialmente na rede a cabo – séries, filmes etc. Podemos dizer que o ócio dos adolescentes está praticamente restrito ao tempo em frente às telas. Pesquisas mostram que a grande maioria deles aprendeu a manejar e navegar por esses meios sozinha e sem supervisão. Diz Mercedes Montero (in Nascidos Digitales: uma geración friente a las pantallas): “pequenos seres autônomos com grande capacidade de decisão” e, acrescento, com pouquíssima orientação. 
Os resultados de toda essa análise não estão sendo muito positivos, como apontamos no artigo anterior. Constatar essa realidade é o primeiro passo para mudá-la. Como sempre, estamos diante da questão: o problema não é a tecnologia, mas, sim, o modo como a usamos e a introduzimos em nossas casas e na vida de nossos filhos. A que interesses ela está servindo? Pensemos sobre isso.

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