Opinião

Migrações e Sínodo para a Amazônia

De 29 de agosto a 2 de setembro, realizou-se, em Manaus (AM), o Seminário sobre “Migração e Políticas Públicas”, com representantes do Regional Norte 1 da CNBB. Nas últimas duas décadas, os desafios de ordem social e pastoral ligados à mobilidade humana ocupam um lugar de destaque no calendário desse regional devido, sobretudo, à presença de milhares de migrantes haitianos e venezuelanos. Uns e outros, de resto, estão se espalhando por todo o território nacional.

As cidades de Pacaraima e Boa Vista, no estado de Roraima, por um lado, e as cidades de Tabatinga e Manaus, no estado do Amazonas, por outro, formam o corredor de entrada dos migrantes em fuga, tanto do Haiti, a partir do terremoto de 2010, quanto da Venezuela, com a crise dos últimos anos. Devido a esse afluxo inédito, a Pastoral dos Migrantes, com a ajuda de vários parceiros, tem multiplicado esforços para a acolhida e inserção de tantas pessoas e famílias. As exigências são múltiplas: documentação, trabalho, moradia, saúde, educação!...

No processo do Sínodo para a Amazônia, o tríplice olhar profético do Antigo Testamento traz alguma luz para iluminar as ações pastorais e sociopolíticas. Na primeira dimensão desse olhar, subjaz um “lembra-te”. Lembra-te que foste escravo no Egito: o Senhor te fez sair das garras do Faraó e te conduziu a uma “terra onde corre leite e mel”. Trata-se de um eco que vem dos livros do Êxodo e Deuteronômio. Por isso, “quando estiveres ceifando a colheita em teu campo e esqueceres um feixe, não voltes para pegá-lo (...), quando vindimares a tua vinha, não voltes a rebuscá-la, não repasses os ramos. O resto será do estrangeiro, do órfão e da viúva” (Dt 24,18-21). A primazia é a defesa dos mais vulneráveis.

A segunda dimensão nos leva a uma denúncia da ordem estabelecida. Os profetas põem a nu a opressão e as calamidades que pesam sobre os ombros do povo. Aqueles que outrora foram escravos no Egito agora tendem a oprimir seus próprios irmãos. Daí a advertência: “Escutem chefes de Jacó e senhores das tribos de Israel, vocês não deveriam conhecer a justiça e o direito. Por que odeiam o bem e amam o mal?” (Mq 3,1). E ainda: “Vocês vendem o pobre por um par de sandálias” (Am 2,6). Aqui, as etapas do Sínodo têm servido para revelar os abusos e a falta de políticas públicas quanto à defesa das populações mais ameaçadas, entre elas indígenas, migrantes e comunidades quilombolas.

A terceira e última dimensão abre o horizonte do anúncio. Este remete à aliança de Deus com seu povo e à experiência fundante da libertação do Egito. Certo que a situação é difícil e até caótica: os migrantes em fuga acabam encontrando povoados pobres e com poucas condições de os acolher. Mas o Senhor não esquece sua promessa. Caminha com o povo pelas estradas do êxodo, do deserto, da floresta, do exílio, da diáspora e da dispersão. O poema da “Jerusalém celeste” (Is 65,17ss) e o conceito do “Dia do Senhor” (Am 5,18-24) são uma espécie de faróis que apontam para o Reino de Deus. Jesus retoma a experiência do Deus a caminho que “percorre cidades e aldeias (...), encontra as multidões cansadas e abatidas” (...) e sente compaixão” (Mt 9,35-38). O Sínodo para a Amazônia e a Pastoral dos Migrantes, com todos os agentes que atuam na região, tocados pela compaixão do Mestre, podem assim orientar-se sobre políticas públicas que levem em conta não apenas os grupos privilegiados, mas o bem-estar de toda a população.

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