Opinião

Homem e mulher: igualdade e diferença

Um tuíte do Papa Francisco, no contexto do Encontro Mundial das Famílias, ocorrido recentemente em Dublin, na Irlanda, afirma: “Ícone de Deus é a aliança entre homem e mulher”. Referindo-se à família, em sua concisão, ele contém o abismo de ensinamentos a respeito dessa instituição (termo que soa frio ante uma realidade tão prenhe de vida!) e de sua realidade, hoje tão desafiada. Enseja a reflexão também sobre outro tema igualmente desafiador: a igualdade e a diferença entre homem e mulher.

Creio ser supérfluo mencionar os problemas aventados com relação à “desigualdade entre os dois gêneros” (emprego aqui esse termo, ciente de que é controverso, para enfatizar a referência aos papéis sociais atribuídos e desempenhados por homens e mulheres), expressos, por exemplo, no desnível de oportunidades de realização profissional, no desequilíbrio de participação nas decisões na família, na sociedade e mesmo em associações eclesiais, na falta de respeito e até na violência contra a mulher. Isso não diz respeito apenas a culturas longínquas e “arcaicas”, mas também às nossas sociedades consideradas “desenvolvidas” (veja-se a publicidade, a indústria da beleza e a do erotismo, os concursos de misses, as “assistentes de palco” etc.).

Uma corrente de pensamento, reagindo à identidade feminina determinada “pelos outros”, “pelos dominadores” – vista como invenção social –, pleiteia a definição da identidade feminina a partir do próprio indivíduo (“sou eu quem digo o que sou”), relativizando as diferenças. Aliás, estas são vistas como ameaça, causa da desigualdade. Pergunto-me se não estaríamos, então, substituindo a diferença atribuída a uma invenção social – na verdade, a desigualdade – por uma igualdade atribuída a outra invenção social – a uniformidade entre os sexos…

O tuíte papal vai ao cerne da concepção judaico-cristã a respeito do tema. Diz o Gênesis: “Deus criou o ser humano à sua imagem, à imagem de Deus o criou. Homem e mulher ele os criou” (1,27). Encontramos aqui uma afirmação da radical dignidade do ser humano – ser imagem de Deus – e da radical igualdade entre homem e mulher – ambos são imagem de Deus. Encontramos também a afirmação da radical diferença entre os dois – homem e mulher (entendida aqui não somente na dimensão biológica). E encontramos, também, outra afirmação surpreendente: a imagem de Deus está na relação entre homem e mulher.

Uma relação entre dois seres humanos radicalmente diferentes entre si, chamados ao amor (aliança), a serem dádiva um para o outro. Como acontece na Trindade Santa: uma relação entre as três Divinas Pessoas, que são iguais – são Deus – e são diferentes – são Pai, e Filho, e Espírito Santo.

Abre-se aqui a possibilidade de a diferença se tornar riqueza – sem negar os conflitos inerentes à condição humana –, na paridade de dignidade e respeito, e na plena partilha de responsabilidades, poder, bens etc., sempre considerando o ser humano na integralidade de suas dimensões biológica, psicológica, espiritual, social e histórica.

Se essa concepção de ser humano se aplica primordialmente à família (“A família é ícone de Deus: a aliança entre um homem e uma mulher gera vida e comunhão”, diz a frase do Papa), ela também se aplica, na medida do possível, à relação entre homem e mulher nas esferas social, econômica, política, cultural e religiosa. A partir disso, os papéis sociais dos dois gêneros podem ser “reinventados”, no profundo respeito da identidade de cada homem e cada mulher, em sua igualdade e… diferença.

 

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