Fé e Cidadania

Evangelização da cultura

É frequente os documentos da Igreja apresentarem sinais de esperança e desafios da sociedade, suas luzes e sombras, em que determinada atividade cristã se deve dar. As Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2019-2023 afirmam que é em certo cenário que a Igreja enfrenta o desafio da “transmissão integral da fé no interior de uma cultura, em rápidas e profundas transformações, que experimenta forte crise ética com a relativização do sentido de pecado” (nº 27). Em seguida, no entanto, dizem: “Nessa conjuntura, ‘torna-se necessário encontrar critérios para a interpretação e interação com a realidade presente’”; “pensar a relação entre evangelização e cultura urbana torna-se um imperativo à ação evangelizadora em nossos dias” (nº 28). Ou seja, o contexto em que se evangeliza é também o contexto a ser evangelizado.
O Papa Francisco ensina que, na atual mudança de época, é preciso “mudar o modelo de desenvolvimento global” e “redefinir o progresso”. Constata, porém: “O problema é que não dispomos ainda da cultura necessária para enfrentar esta crise e há necessidade de construir lideranças que tracem caminhos” (Laudato Si’).
Os esquemas de pensamento de que dispomos não dão mais conta de compreender a complexidade da sociedade e, por isso, não permitem “traçar caminhos” à altura de seus desafios. Para Francisco, é preciso um “compromisso generoso e convergente em prol de uma mudança radical de paradigma, antes – seja-me permitido dizê-lo – para ‘uma corajosa revolução cultural’”.
A esse respeito, a Constituição Apostólica Veritatis Gaudium, embora voltada às instituições de ensino eclesiásticas, em seu proêmio dá sugestões validíssimas. Reitera que hoje “é necessária uma verdadeira hermenêutica evangélica para compreender melhor a vida, o mundo, os homens; não de uma síntese, mas de uma atmosfera espiritual de investigação e certeza fundamentada nas verdades da razão e da fé”, sugerindo quatro critérios para tal.
O primeiro é “a contemplação e a introdução espiritual, intelectual e existencial no coração do querigma, ou seja, da feliz notícia, sempre nova e fascinante, do Evangelho de Jesus”. O segundo é o “o diálogo sem reservas” que promova “uma autêntica cultura do encontro […] entre todas as culturas autênticas e vitais”. O terceiro – inovador e, por isso mesmo, desafiador – é “a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade exercidas com sabedoria e criatividade à luz da Revelação”, o que implica a “unidade do saber na distinção e respeito pelas suas múltiplas, conexas e convergentes expressões”. Por fim, uma vez que, “desde meados do século passado e superando muitas dificuldades, foi-se consolidando a tendência de conceber o planeta como pátria e a humanidade como povo que habita uma casa comum”, a tomada de consciência dessa interdependência “obriga-nos a pensar num único mundo, num projeto comum”. Isso “exige por si mesma e propicia ‘a polaridade tensional entre o particular e o universal, entre o uno e o múltiplo, entre o simples e o complexo. Aniquilar esta tensão vai contra a vida do Espírito’. Trata-se, por conseguinte, de praticar uma forma de conhecimento e interpretação da realidade, à luz do ‘pensamento de Cristo’ (cf. 1Cor 2,16), cujo modelo de referência e resolução dos problemas ‘não é a esfera […] onde cada ponto é equidistante do centro, não havendo diferenças entre um ponto e outro’, mas ‘o poliedro, que reflete a confluência de todas as partes que nele mantêm a sua originalidade’”.
Trata-se de uma tarefa típica para os cristãos leigos em que, decerto, ainda há muito a fazer…

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