Fé e Cidadania

A Igreja e a intervenção federal no Rio de Janeiro

O Governo Federal, por meio do Presidente Michel Temer, e o Governo do Estado do Rio de Janeiro, por meio do Governador Luiz Fernando Pezão, assinaram, em 16/02/2018, um decreto que determina, entre outras providências, a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro. A intervenção federal no Rio de Janeiro foi aprovada pelo Congresso Nacional, sancionada pelo Presidente da República e ficará em vigor até 31/12/2018.

A intervenção federal no Rio de Janeiro é um dos temas mais debatidos atualmente nos meios universitários, intelectuais e nas redes sociais. Trata-se da primeira vez que esse dispositivo é utilizado. O governo federal, as forças armadas, os governos estaduais e municipais ainda estão se adaptando a essa nova realidade. Em muitos aspectos técnicos e jurídicos, ainda existe muita coisa para esclarecer e resolver.

De um lado, a intervenção federal se justifica diante do caos vivido pelo Rio de Janeiro, que ameaça se espalhar para outras regiões do País, e diante dos graves problemas sociais causados pela falta de segurança e pela onda de violência que se alastra pelo Rio de Janeiro. Do outro lado, é necessário ter cuidado com o uso da intervenção federal. A intervenção não pode ser pretexto para o aumento da violência e para o uso do terror oriundo das estruturas de repressão pertencentes do Estado.

Diante da intervenção federal, o Arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Orani João Tempesta, em entrevista concedida à BBC Brasil , afirmou que “eu não sou técnico para saber o que é melhor e o que não é. Temos que aguardar os resultados para verificar se foi bom ou não” e, por isso, é necessário esperar que tal intervenção “dê resultados”. Ele convocou os cristãos a orarem para que “isso aconteça”.    

As palavras de prudência de Dom Orani João Tempesta apresentam o papel da Igreja diante da intervenção federal no Rio de Janeiro. De um lado, a Igreja não é um órgão técnico de segurança. Logo, não deve emitir juízos técnicos nessa área. Diante do caos vivido pelo Rio de Janeiro, e que poderá se espalhar por amplos setores do País, talvez a mais sensata ação tenha sido decretar a intervenção federal. Do outro lado, a Igreja não pode ficar omissa diante de um fato tão grave, e, por isso, ela não pode se calar. A Igreja tem que clamar para que a dignidade humana de policiais, militares, de membros das comunidades pobres e, enfim, do cidadão comum, seja respeitada e garantida. Nenhum cidadão – seja policial, morador de favela ou outra categoria – pode ter sua dignidade desrespeitada. Além disso, a Igreja tem o dever de lutar pela construção de uma cultura de paz que supere toda forma de violência, de terror e caos urbano. A Igreja precisa usar sua estrutura (paróquias etc...) para criar uma consciência em favor da paz, da solidariedade e do respeito ao ser humano. Justamente o ser humano que tanto é o policial morto de forma covarde por bandidos como é o cidadão comum que é refém do caos urbano. Diante das incompreensões, do ambiente de radicalização política e das ideologias alienantes, a Igreja deve ser um oásis de paz. Ela deve anunciar Jesus Cristo, o Príncipe da Paz e, por isso, criar um ambiente de reconciliação social, de convivência entre todos os setores da sociedade e de reconstrução da vida urbana. Por incrível que pareça, o sucesso da intervenção federal depende de a Igreja ser capaz de construir um espaço e uma cultura de paz no Rio de Janeiro, e que essa cultura se espalhe para o resto do Brasil. 

 

As opiniões da seção “Fé e Cidadania” são de responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, os posicionamentos editoriais do O SÃO PAULO.
 

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