Fé e Cidadania

A diversidade é uma riqueza... será mesmo?

A diversidade é uma riqueza. Frase que gostamos de repetir em nossa sociedade. Mas, nos tempos atuais, particularmente no campo das visões de mundo, das ideias e dos valores, vivenciamos, de fato, a diversidade como algo enriquecedor?

É nossa experiência cotidiana estarmos numa sociedade pluralista. “A emancipação da pessoa diante das tradições do passado, as quais não são mais aceitas apenas por serem tais, implica, necessariamente, uma releitura desses dados transmitidos pelas gerações anteriores, tornando a atual sociedade múltipla e diversa, em decorrência da pluralidade de leituras nela efetuadas”, explica o Padre França de Miranda, para concluir que isso provoca um mal-estar. Assim, o espírito de nosso tempo acaba se caracterizando por um relativismo e um pluralismo radicais.

Paralelamente, porém, notamos hoje outro fenômeno em direção oposta. As pessoas tendem a procurar “câmaras de eco”, espaços – favorecidos pelas mídias sociais – onde encontram outras pessoas com as mesmas ideias, orientações de vida e interesses, e confirmam mutuamente as respectivas opiniões. Estimula-se um monólogo do eu, e o encontro com o diferente tornase embate, amiúde intoxicado por intolerância e violência verbal. Assistimos não só a um “choque de civilizações” – como parece estar sendo provocado na Europa –, mas mesmo a um choque entre pessoas e grupos de orientações diferentes (ao qual nem mesmo os católicos escapam, como vemos em críticas públicas ao Papa e à CNBB por parte de determinados setores).

A diferença é percebida como ameaça, e não se sabe como efetivamente lidar com ela.

No documento sobre os leigos e as leigas na Igreja e na sociedade, os bispos brasileiros exortam-nos a viver na pluralidade que respeita as diferenças, sem cair no relativismo. E talvez a Carta a Diogneto dê uma pista de como atuar isso, ao descrever os cristãos. “Sua doutrina não está na descoberta do pensamento de homens multiformes, tampouco aderem a uma corrente filosófica humana”. O pensamento deles busca seu fundamento alhures. Explica o Papa Francisco na Constituição Apostólica Veritatis gaudium: “Daqui também o acento peculiar, na formação para uma cultura cristãmente inspirada, posto em descobrir em toda a criação a marca trinitária que faz do cosmo onde vivemos ‘uma trama de relações’ em que ‘é próprio de cada ser vivo tender, por sua vez, para outra realidade’” (VG 4).

É a Trindade, por assim dizer, o “modelo” que fundamenta a possibilidade de se viver a unidade na diversidade.

O olhar para as divinas Pessoas na Trindade permite intuir que não é suficiente tolerar o diferente e a diferença (às vezes tornando esta tabu, da qual não se fala), como também não é suficiente o necessário respeito, em sentido de apreço, consideração, a ela. Cabe um salto de qualidade: os diferentes, em sua diferença, precisam estar em relação, precisam interagir mutuamente no amor.

Concretamente, e no campo das visões de mundo, das ideias, dos valores, isso pode ser traduzido, como continua a Veritatis gaudium, no “diálogo sem reservas: não como mera atitude tática, mas como exigência intrínseca para fazer experiência comunitária da alegria da Verdade e aprofundar o seu significado e implicações práticas” (VG 4). Verdade que, então, não é mais relativa, mas relacional, buscada e descoberta na relação.

Assim, a diversidade torna-se efetivamente riqueza.

Klaus Brüschke é Membro do Movimento dos Focolares, ex-publisher da Editora Cidade Nova e articulista da revista Cidade Nova.
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