SÃO PAULO

Maternidade

Mães em tempo integral

Por Nayá Fernandes
15 de mai de 2017

Laura e Adriana deixaram de trabalhar fora de casa para se dedicarem exclusivamente aos filhos

Luciney Martins

Aos 22 anos, ela tinha uma promessa de emprego como coordenadora do setor de Recursos Humanos numa grande multinacional, mas preferiu dedicar-se exclusivamente ao cuidado da pequena Amélia Amorim Marchini, que tem 1 ano e 8 meses de idade. A primeira filha de Laura Amorim, 23 anos, nasceu após um trabalho de parto de quase 24 horas, no dia 14 de agosto de 2015 e, desde lá, a mãe percebeu que sua vida nunca mais seria a mesma.

“Eu estava disposta a voltar a trabalhar, pois tinha, mesmo passando por todo o processo de gestação e os meses de licença maternidade, uma proposta de promoção na empresa que ia, inclusive, dobrar o meu salário. Mas, quanto mais se aproximava a data do regresso, mais eu ficava tensa com a situação de passar o dia todo longe da minha filha e precisar parar a amamentação tão precocemente”, contou Laura, durante a entrevista que concedeu à reportagem do O SÃO PAULO, na casa onde mora com seu esposo Renan Bastos Marchini e sua mãe, Sandra Maria Ambrósio.

Mia, como a mãe chama a pequena Amélia, é uma criança saudável e vivaz, e foi pelo crescimento dela que Laura escolheu interromper, por algum tempo, sua vida profissional. “Tive muito medo no início, pois, pela experiência trabalhando no setor de Recursos Humanos, sei que é mais difícil para uma mãe, com um filho pequeno, retornar ao mercado de trabalho. Eu estava justamente no setor de recrutamento de pessoas, e sabia, portanto, que um dos critérios que não contavam pontos para uma contratação, era justamente esse. Além disso, ouvia muitos relatos de mães que não conseguiram voltar, ao menos não com facilidade”, contou a jovem mãe.

Mas, com o apoio de Renan e também de sua mãe, que contou à filha a experiência inversa que viveu quando ela, Laura, era pequena – devido ao trabalho, não pôde ficar mais tempo com a criança, o que foi um processo doloroso para a mãe –, Laura decidiu ouvir a avó de Mia. Ao recusar a proposta, ela passou a dedicar-se inteiramente ao cuidado da filha. “Eu fiz as contas e vi que teria que sair de casa por volta das 5h da manhã, retornando depois das 19h. Então, percebi que ia ficar muito tempo longe dela. Renan e eu nos reorganizamos financeiramente e cortamos muitos gastos, além disso, tivemos o apoio das nossas famílias. Hoje sou muito grata por essa oportunidade, pois sei que muitas mulheres não têm escolha”, continuou Laura.

 

Oportunidades

Com a mudança na rotina de Laura e sua família, ela começou a dedicar-se a outras atividades que sempre quis fazer, mas para as quais não tinha encontrado tempo ou estímulo. Além da formação em recursos humanos, está cursando uma graduação em filosofia e pretende trabalhar como professora futuramente, pois sempre quis seguir esse caminho. Além disso, dá aulas voluntárias de dança uma vez por mês e descobriu, após incentivo de uma amiga, o artesanato como saída para complementar a renda familiar. “Gosto muito de dançar e formamos um grupo com objetivo de ajudar outras pessoas. Assim, dou aulas voluntariamente e as alunas pagam com alimentos. Por mês conseguimos mais de 40 cestas básicas para famílias mais pobres”.

No tempo disponível entre os cuidados com Mia e a casa, Laura agora faz e vende artesanatos: “só neste mês de maio, já tenho mais de 20 colares encomendados e vou começar a investir em outros objetos como cortinas”.

Essa também foi a realidade de Adriana Menezes Fernandez, 35, mãe do Piettro, de 3 anos, e da Valentina Menezes Fernandez, que tem apenas 4 meses de vida. Ela parou de trabalhar quando nasceu o primeiro filho e, para ajudar no orçamento da casa, passou a vender canecas personalizadas e decorações de festas. Adriana e Edgar Fernandez Carrillo decidiram se mudar para o litoral de São Paulo pois, como tinham começado o financiamento de uma casa em Mongaguá (SP), não tinham condições de pagar o aluguel – da casa que moravam em São Paulo – e o financiamento ao mesmo tempo.

 

A alegria da maternidade

Quando escolheu ficar em casa para cuidar do Piettro, Adriana, que é formada em administração e trabalhava como analista de crédito imobiliário, ganhava o dobro do marido e, por isso, eles pensaram muito na decisão. “O retorno da licença foi muito difícil, pois eu não tinha horários fixos de saída do trabalho, que dependiam das agendas dos clientes, foi quando percebi que não dava para continuar. No início, muitos amigos admiraram minha ‘coragem’ de largar o emprego e ainda hoje acham estranho que uma mulher formada, que trabalha desde muito jovem, decida dedicar-se exclusivamente aos filhos”, contou Adriana, que está cursando a segunda faculdade, pois, com a maternidade, descobriu também que tem muito gosto pela educação.

Ela afirmou que, em muitos momentos, vê-se na contramão da sociedade, que foca muito mais no trabalho que dá uma criança e não na alegria profunda que a maternidade desencadeia. “As pessoas acham também que cuidar dos filhos é algo fútil, educar um cidadão para a sociedade é algo sem valor, que ficar em casa não é um trabalho e que as crianças precisam logo ir para a creche. Mas a creche ou a escola não substituem a mãe e o pai. A escola é importante, claro, afinal não deixei meu emprego para ficar trancada em casa com eles e sim para dar mais apoio e isso não exclui a escola. Pais e escola têm que trabalhar juntos”, disse Adriana.

A mãe do Piettro e da Valentina os leva para a faculdade quando necessário. “Ter filhos não significa que eu estou privada de fazer algo, meus filhos fazem parte de mim e isso não me impede de ser o que eu quero ser, posso ser mãe estudante e qualquer outra coisa, o fato de eu ter parado de trabalhar não significa que eu não possa fazer uma, duas, três ou quatros coisas ao mesmo tempo”.

Diferente de Edgar, que queria ter a casa cheia de crianças, a própria Adriana diz ter-se surpreendido após o nascimento do primeiro filho. “Eu não sonhava em me casar e ter filhos, mas minha experiência não foi nada do que eu ouvia sobre o quanto é difícil ter um filho. Consigo sentir muito mais amor e prazer do que enxergar o esforço que é cuidar e educar uma criança. Então decidimos ter mais um e criá-los juntos”.

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