Editorial

Fome: ‘Inércia de muitos, egoísmo de poucos’

A fome não é um problema natural. Não podemos vê-la com resignação. Em vez disso, a fome é o resultado da “inércia de muitos e do egoísmo de poucos”. A mensagem do Papa Francisco para a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), divulgada na segunda-feira, 3, e lida na principal conferência da instituição pelo Cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado do Vaticano, foi um forte chamado aos países a se unirem para criar uma “cultura de solidariedade”. A agência da ONU é famosa por manter uma grande estrutura em Roma e seu presidente é o brasileiro José Graziano.

Segundo o Papa, que visitará a FAO em 16 de outubro, as nações de- vem ir além da mera acumulação de estatísticas e do desenvolvimento de técnicas para o combate à fome. Em bora elogie ações concretas tomadas pelas Nações Unidas, como a distribuição de sementes a famílias que cultivam em áreas de seca, pondera que a técnica não é suficiente para resolver o problema da fome. Não basta somente criar instrumentos para distribuir a produção agrícola.

É preciso que os países sejam o “sinal concreto, às vezes único, de uma fraternidade que permite confiar no futuro”. É preciso ir além do “pragmatismo das estatísticas” e do “desejo de uma eficácia carente da ideia de com- partilhar”. É preciso que a cultura da solidariedade faça parte da rotina e seja incentivo para a acumulação de informações sobre o problema da fome e à difusão de modelos para amenizá-lo.

Enquanto a cultura não mudar, enquanto os países não entenderem que a fome e a pobreza não são responsabilidade de só uma nação, mas de todos, a solidariedade não será prática. “O compromisso de cada país para aumentar o próprio nível de nutrição, para melhorar a atividade agrícola e as condições das populações rurais, se concretiza no impulso do setor agrí- cola, no aumento da produção e na promoção da distribuição efetiva dos alimentos”, escreve o Pontífice. Porém, é preciso saber que “o direito de cada pessoa de ser libertada da pobreza e da fome depende do dever que tem toda a família humana de ajudar de forma concreta aos necessitados”.

Em sua encíclica Laudato Si’ (Louvado Seja), o Papa Francisco já nos exortava a olhar as mazelas sociais e a destruição do ambiente como uma única problemática. Para cuidar da “casa comum”, temos necessariamente que cuidar dos que mais sofrem. Eles são as principais vítimas dos desastres ambientais.

E, vice-versa. Países mais pobres encontram mais dificuldades de se adaptar a modelos de produção me- nos nocivos ao ambiente – porque isso exige educação, investimento e planejamento. Uma “ecologia integral exige o pleno desenvolvimento do gênero humano”, afirmava na Laudato Si’. Cuidar da criação é cuidar da vida humana. E, como também lembrava o Papa Bento XVI, não é admissível que a tecnologia, a técnica, seja usada para promover ainda mais submissão. A fome é o resultado de uma “complexa condição de subdesenvolvimento”, diz Francisco. “As guerras, o terrorismo, os deslocamentos força- dos de pessoas que cada vez mais impedem ou, pelo menos, condicionam fortemente as atividades de cooperação, não são fruto da fatalidade, mas consequência de decisões concretas

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