Espiritualidade

É tempo de conversão

Encerrado o breve período do Tempo Comum, iniciamos agora o tempo da Quaresma, favorável para ordenar a vida na direção do sonho que Deus tem para toda a humanidade. Tempo “pedagógico e terapêutico para preparar as entranhas e mobilizar o nosso coração frente ao acontecimento central de nossa fé: a Páscoa”. Tempo de sacudir a poeira do pecado e dar volta por cima como ressuscitado.
Abrimos este tempo novo com a bela celebração das cinzas, símbolo daquilo que morreu, que passou pelo fogo. Tempo de acender o fogo para converter em cinzas tudo o que é caduco, perverso e ultrapassado em nossas vidas. 
Como prática quaresmal, Jesus nos propõe três gestos: a oração, o jejum e a esmola. São gestos que “nos humanizam e tornam a vida mais leve e com sentido”. Quando oramos, tornamo-nos mais próximos de Deus; quando nos abrimos à caridade (esmola), tornamo-nos próximos dos irmãos; quando jejuamos, tornamo-nos “próximos” de nós mesmos. Se a oração nos faz olhar para o alto, para Deus, a caridade (esmola) nos faz olhar para o irmão, sendo companheiros e solidários na prática do bem. Enquanto isso, o jejum nos remete a uma vida disciplinada, o que nos proporciona tempo para amar a Deus e ao próximo. “O jejum comporta a escolha de uma vida sóbria, segundo o seu estilo; uma existência que não desperdiça, uma vida que não descarta. É um sinal de tomada de consciência e de responsabilidade perante as injustiças e os abusos, especialmente em relação aos mais pequeninos” (Papa Francisco).
Considerando ser esta a proposta para o tempo da Quaresma, Jesus nos ensina, já no primeiro domingo, como ir modelando a vida para que a colheita seja abundante a partir de uma conversão sincera. 
Estando com fome, o tentador propõe transformar pedras em pães. Por que passar fome se pode “se ajeitar” fazendo um milagre para se beneficiar? É aquela história de “aumentar a renda” com dinheiro sujo, desonesto, um ganho fácil. Coisa sedutora que atinge até religiosos e igrejas. É a badalação da tal prosperidade, da multiplicação da riqueza que ignora a cruz. Diante dessa provocação, Jesus recorre à Palavra e diz: “Não só de pão vive o homem, mas de toda Palavra que sai da boca de Deus”. No entanto, em outra ocasião, multiplica pães, não para saciar sua fome, mas a fome de uma multidão que não tinha o que comer.  
Uma segunda vez o tentador propõe que Jesus pule do alto de um templo e faça uma descida triunfal, um sinal do alto para impressionar e dominar. Tal proposta é recusada, pois “não tentarás o Senhor Deus”. Jesus não fará sinal algum para se promover, mas fará sinais para curar os enfermos, expulsar os demônios, ressuscitar os mortos, alimentar os famintos.
A última tentação quer contaminar aquilo que é mais íntimo entre nós e Deus: a nossa fé. “Eu te darei tudo se ajoelhares diante de mim.” O demônio se serve da própria religião, do formato do sagrado para nos provocar. Tal proposta leva a pensar em parcerias que são feitas com aquilo que temos de pior na sociedade para obter grandes vantagens, mesmo que isso custe ofender, matar, excluir pessoas. Jesus reage dizendo: “Vai-te embora, satanás”. Com o diabo não tem conversa, nada de servir ou ajoelhar-
-se diante de tudo o que atenta contra a vida e a liberdade. De outro modo, Jesus serviu e nos ensinou a servir, lavando os pés, curando, cuidando.  
Ainda mais. Somos enriquecidos neste itinerário quaresmal com a provocadora proposta da Campanha da Fraternidade: introduzir na vida o jeito samaritano de ser, ou seja, daquele que vê, sente compaixão e cuida. 
Começamos bem: retomamos as práticas quaresmais da oração, do jejum e da esmola; lembramos das tentações que podem causar sérios estragos em nossas vidas; foi-nos proposto modelar a vida e a comunidade conforme o jeito samaritano e cuidador de Jesus em comunhão com o Papa Francisco, que nos diz que a Quaresma “começa com as cinzas, mas nos leva no final ao fogo da noite da Vigília Pascal, a descobrir que, no sepulcro, a carne de Jesus não se torna cinza, mas ressuscita gloriosa. O mesmo vale para nós que somos pó: se voltarmos ao Senhor com as nossas fragilidades, se tomarmos o caminho do amor, abraçaremos a vida que não tem ocaso. E, certamente, viveremos na alegria”. 

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