Opinião

O nome misericordioso de Jesus

Tempo favorável por excelência e tempo da misericórdia na Igreja (cf. 2Cor 6,2), a Quaresma propicia a “experiência” do amor misericordioso de Deus, ao considerarmos atentamente o que o Catecismo da Igreja Católica (cf. CIC 2665-2666) denomina “Oração a Jesus”, que consiste numa oração do coração, aqui representada pela invocação “Jesus, confio em Vós”, inscrita no conhecido ícone de Cristo misericordioso. E pode-se começar por fundamentar essa invocação do nome de Jesus em Mateus 6,33 – “Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a sua justiça...” , na medida em que justiça e misericórdia tendem a uma assimilação (cf. São João Paulo II, Dives in Misericordia, 4 e 7). Também é preciso partir da liturgia, do primado de Deus, primado da adoração (cf. CIC 347), tendo presente a noção de “ortodoxia” (doxa, glória), ensinada pelo Papa Bento XVI: aprender o “modo justo de glorificar a Deus [...] é o dom principal que nos vem pela fé” (Prefácio ao volume inicial dos meus escritos, Opera Omnia, vol. XI, 2008). Enfim, a liturgia cristã, o novo culto espiritual (cf. Rm 12,1), por definição, é o “culto justo” (cf. Pontifícia Comissão Bíblica, “Bíblia e Moral”, 124, 2008).
Há uma justiça misericordiosa na economia da salvação (recebida no Batismo e aperfeiçoada na Eucaristia), pois toda a economia do mistério de Cristo (cf. Ef 3,9) revela essencialmente o “desígnio benevolente” do Pai (cf. eudokía: Ef 1,9). Segundo uma fórmula dos Padres da Igreja – recordada pelo Catecismo (cf. CIC 236) – só pela dinâmica da Economia (as obras pelas quais Deus revela e comunica a sua vida) se entra na Teologia, no conhecimento de Deus. A oração do coração, compreendida e vivida na perspectiva da liturgia, da economia sacramental, abre-nos necessariamente ao conhecimento da misericórdia divina, do Amor benevolente.
Assim, ela se torna um critério da ortodoxia, do culto justo e, ao mesmo tempo, expressão de um desígnio eterno de misericórdia. O Catecismo ilustra maravilhosamente esta segunda afirmação ao valorizar o termo “eudokía”, que reencontramos na passagem bíblica tratada: “Jesus glorifica o Pai (cf. Mt 11,25-27; Lc 10,21-22), agradece-lhe e o bendiz porque escondeu os mistérios do Reino aos que se julgam doutos e revelou-os aos ‘pequeninos’ (os pobres das Bem-aventuranças). Sua exclamação emocionada, ‘Sim, Pai!’, exprime o fundo de seu coração, sua adesão ao ‘beneplácito’ do Pai [...]. Toda a oração de Jesus está nesta adesão amorosa de seu coração de homem ao ‘mistério da vontade’ do Pai (cf. Ef 1,9)” (CIC 2603). Ou seja, a invocação “Jesus, confio em Vós” é um “sim” ao desígnio misericordioso, que nos faz entrar na justiça – e na paz – do Reino de Deus, pois “o amor envolve quem confia no Senhor” (Sl 32/31,10). O santo nome de Jesus nós o recebemos, brota gratuitamente e não por nossas forças – é mistério revelado aos simples; é graça e misericórdia.
Oferecer a Deus um sacrifício de louvor, fruto dos lábios que confessam o nome de Jesus (cf. Hb 13,15; Rm 10,9), é um testemunho de fé e auxilia na compreensão da unidade fundamental entre liturgia e vida: “Entramos na oração como entramos na liturgia: pela porta estreita da fé” (CIC 2656). A oração do coração está no primeiro plano da liturgia vivida e da nossa santificação, e, desde a fonte do “rio de água da vida” (Ap 22,1) – símbolo do Espírito Santo –, quando jorra no coração, “alcança sua plenitude na ‘adoração em espírito e verdade’ (cf. Jo 4,14-24)” (Jean Corbon, “Liturgia Fontal”, p. 212, Palabra, Madri, 2009).

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