Editorial

14 Novembro 2019

Thomas More: um modelo de leigo

Na Solenidade de Cristo Rei, a Igreja Católica no Brasil celebrará o Dia Nacional do Leigo. É uma ocasião oportuna para nos recordar que Cristo deve reinar não só no interior dos corações, mas também no exterior da vida social. Para que isso ocorra, faz-
-se imprescindível a valorização da vocação própria dos leigos em meio ao mundo. 
 Avulta-nos como exemplo de vida laical o erudito humanista inglês Thomas More (1478-1535), chanceler do rei Henrique VIII na época do cisma anglicano. Se não abraçou a vida sacerdotal ou religiosa, não foi por falta de entrega à vontade de Deus – na verdade, More chegou a viver num mosteiro, mas depois de um discernimento vocacional radicalmente sincero chegou à conclusão de que Deus o chamava a servir-Lhe como leigo: homem público e pai de família.
Profissionalmente, então, destacou-se More como advogado brilhante, juiz industrioso e incorruptível, diplomata e político articulado, e, enfim, renomado homem de cultura. É certo que poucos de nós somos chamados a tal proeminência: no entanto, o que torna nossos labores nesta terra aprazíveis a Deus não é sua grandeza aos olhos dos homens, senão o amor com que os fazemos: a vocação cristã, já se disse, consiste em transformar em poesia heroica a prosa de cada dia.
Thomas More zelava também por seus deveres de estado como pai de família: pai amoroso, ocupou-se pessoalmente da educação de sua prole, a tal ponto que, numa época em que o analfabetismo, sobretudo entre as mulheres, grassava mesmo na rica Europa, sua filha Margareth, proficiente em grego, latim, Filosofia, Música e História, foi a primeira mulher fora da família real a publicar um livro na Inglaterra. Como a maioria dos pais de nossos tempos, More precisava também, por força de suas responsabilidades profissionais, recorrer à ajuda de professores para complementar a formação de seus filhos – mas nem por isso a relegava inteira, eximindo-se de devotar cuidadoso tempo pessoal ao assunto.
More é exemplar, enfim, pela obediência que deve caracterizar todo leigo. Seu compromisso com as leis de seu país era imenso: mesmo sabendo da conspiração para traí-lo, nem por isso ele usou seus poderes de chanceler para, violando garantias do Estado de Direito, obstar à ação dos traidores. Quanto às opções políticas desastradas de seu monarca, More nunca as utilizava para incitar a desobediência civil. E quando o rei Henrique VIII se ia encaminhando para a guerra aberta com a Igreja, o chanceler tentou, o quanto pôde, preservar a unidade dos cristãos.
Quando, porém, a ruptura se tornou inevitável, More mostrou onde ficava a perfeição da obediência. Se a autoridade humana legitimamente constituída atenta contra a autoridade divinamente fundada, ela perde o direito de impor-se a qualquer cristão. Thomas More foi condenado à morte pelo crime de não submeter-
-se às violações à consciência religiosa promovidas por um estado anticatólico – e em seu cadafalso disse: “O rei me ordena ser breve, e como obediente súdito do rei, breve serei. Eu morro como bom servo de Sua Majestade, mas primeiro de Deus”. Assim também nós, que pelo sangue de Cristo fomos salvos e integrados a seu corpo místico, devemos ser cidadãos-modelo e cumpridores das leis. Mas os cristãos, que não pertencem ao mundo (cf. Jo15,19), serão sempre sinal de contradição. E nosso primeiro e único Mestre não é o Estado ou as organizações, senão Jesus Cristo, Deus que se fez homem.

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