Editorial

Adoro te devote

Adoro-Vos com devoção, Deus escondido, que sob estas aparências estais presente. Assim, Santo Tomás de Aquino inicia o hino composto em honra do Santíssimo Sacramento a pedido do Papa Urbano IV para a festa de Corpus Christi, instituída universalmente em 1264, e que celebramos na quinta-feira, 15.

Nessas sublimes palavras, o Doutor Angélico condensa qual deve ser nossa atitude perante o sacrifício eucarístico, “fonte e centro de toda a vida cristã”, como nos ensina o Concílio Vaticano II.

Deus, perfeitamente feliz no seio da Santíssima Trindade, cria-nos unicamente por causa de sua infinita bondade, para nos comunicar sua transbordante felicidade. Portanto, criados para Ele, seremos tão mais felizes quanto mais se submete nosso coração à sua divina vontade. Quanta gratidão não devemos ter por um Deus que quis glorificar-se fazendo-nos felizes!

Acontece que, tendo dito não a Deus, o homem decaído subtraiu-se da ordem da graça, comprometendo, assim, sua própria felicidade. Ofensa infinita, por ter sido feita a Deus, exigia uma proporcional reparação, impossível para o homem, criatura finita. É essa a loucura de amor da Cruz: Deus oferece e aceita o sacrifício de si mesmo, na Pessoa do Verbo encarnado, para nossa redenção. Limpa-nos com o Sangue do qual uma só gota pode salvar do pecado o mundo inteiro. Como bom pelicano, oferece sua própria carne para que seus filhos na graça tenham vida, e a tenham em abundância. Unidos aos méritos de Cristo, podemos finalmente amar a Deus em uma nova e eterna Aliança, realizando-nos plenamente.

Mas o inefável amor de Deus por nós ainda não se contenta: quer mais, quer ficar conosco. A Sabedoria divina encontra uma maneira cuja beleza só se equipara à sua humildade: faz-se Ele mesmo, sob as aparências do simples pão, alimento espiritual; do trigo morto, Pão vivo que dá vida ao homem. Por isso, também afirma o Concílio que “na Santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo”. Ó feliz culpa!

Para os sentidos, pelos quais vive o homem velho, estava na Cruz oculta a divindade de nosso Salvador, na hóstia, esconde-se também sua humanidade. Crendo e confessando uma e outra com o olhar da fé, pela qual vive o homem novo, Santa Juliana de Mont Cornillon teve, no século XII, uma visão da Igreja sob a aparência de luz cheia com uma mancha negra, significando a ausência de uma comemoração especial, e já pedia e esperava pela festa do Corpo de Cristo.

De Bolsena, já no século XIII, onde da hóstia consagrada começaram a cair gotas de sangue como um sinal perante a dúvida de um sacerdote – para que a vista, o tato e o gosto não mais nos enganem –, saiu a primeira procissão, que teve como destino Orvieto, cidade em que residia o papa.

A Sagrada Eucaristia é o mistério da fé, presença real d’Aquele que dá sentido às nossas vidas. Frente a esse memorial vivo da morte do Senhor, resta-nos apenas pedir com o ladrão arrependido: Jesus, a quem agora contemplo escondido, rogo-Vos que se cumpra o que tanto desejo: que, ao contemplar-Vos face a face, seja eu feliz vendo a vossa glória. Amém.

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