Comportamento

A China se volta para a família?

Há três anos publiquei nesta coluna “A China pede filhos! ” Tratava-se da liberação para que os casais pudessem ter o segundo filho, proibido pelo Estado por mais de 5 décadas. Nesta semana surpreende o título no jornal O Estado de S. Paulo, de matéria publicada pelo The New York Times, (Myers & Ryan): “China incentiva mais nascimentos”. Diz o artigo: “Após fim da política do filho único, Pequim adota ações controversas como limitar o aborto e dificultar o divórcio para aumentar a natalidade” (13/08/2018 página A 13 caderno Internacional). 

Diz o ditado que o bolso é o órgão mais sensível do homem, ou que quando não se muda pelo coração, transforma-se pela dificuldade do dinheiro. Parece ser o que está acontecendo na China na última década. Perceberam que a política de abertura aos filhos, embora eficiente, ficou aquém do esperado. Ainda não estão nascendo das mulheres chinesas, desmotivadas por décadas, tantos filhos. De 2016 para 2017, o número de nascimentos caiu de 17,9 para 17,2 milhões. No entanto, cresceu de 35% em 2013 para 51% em 2018 o número de famílias com dois filhos. Diante disto estão agora tomando mais medidas para incrementar os nascidos, por conta da perda prevista de mais de 200 milhões de indivíduos para a força de trabalho nos próximos 30 anos.

As medidas incluem dificultar a realização de aborto, assim como desestimular o divórcio! Se você, caro leitor, não acredita no que leu, leia de novo. É isto mesmo. A maior nação que ainda reserva-se como sistema comunista está querendo que as mulheres não abortem e que os casais não se separem! Isto porque acredita que estas serão medidas que estimularão um maior número de filhos (no País que tem 1,4 bilhão de habitantes), e assim estarão corrigindo desequilíbrios da população, como um percentual significativamente maior de homens, vistos que as grávdas de meninas abortaram por décadas. 

Não deixa de ser surpreendente, e ao mesmo tempo causa certa alegria, descobrir que o país que tem enorme controle pelo Estado, o qual se diz ateu, passa a adotar medidas para promover a fidelidade conjugal e valorização da vida, como reza a boa doutrina. Lá não se pode afirmar que isto é um retrocesso conservador, fundamentalista. As medidas são no intuito de salvaguardar o equilíbrio da nação, corrigindo erros de uma sociedade que por décadas alimentou a ideia do filho único, onde a família foi sendo esquecida, e as consequências estão aí para quem quiser ver. Ou seja, a China se volta para a família como caminho de recuperação da sociedade, e não há preocupação com alimentação e água, aparentemente resolvidos por recursos tecnológicos e ótima política internacional. 

Aqui, na nossa querida pátria, estamos com um território imenso, recursos naturais inesgotáveis, e o que estamos assistindo: mais uma tentativa de retomar a liberação do aborto, e a facilidade burocrática para o divórcio. Afirmam que a barreira está nas raízes cristãs da Terra de Santa Cruz. É preciso abrir os olhos para o futuro e enxergar o que está acontecendo nos países que já percorreram este caminho e suas consequências. É preciso dar um basta neste argumento falacioso de que as teses contrárias ao aborto e ao divórcio são coisas de ignorantes e fanáticos religiosos. Não parece que a China, que está assumindo lugar de liderança do mundo, seja povoada por ignorantes, e a força da religião não parece influenciar seus comandantes, pelo contrário, ainda são muitos os mártires cristãos naquele País. 

O cenário atual realmente reveste-se de perplexidade: anima os devotos da família como célula fundamental da sociedade com toda sua natureza e consequências na dinâmica da população e em cada um dos habitantes na sua individualidade; assim como deixa estupefatos aqueles que acreditavam já dar como mortos estes “princípios medievais”, e que são adotados como um Renascimento Chinês no século XXI. Uma mudança reconhecida pelo risco do bolso, com certeza; mas que certamente, com o tempo, com a alegria viva das crianças que voltarão a habitar os lares chineses, transformará os corações com uma nova esperança.

Dr. Valdir Reginato é médico de família, e-mail: vreginato@uol.com.br
 
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