Espiritualidade

A restrição de espaço para Deus

Embora ainda existam muitas distâncias sociais, econômicas e culturais entre as pessoas e entre os povos, não podemos negar que vivemos um tempo de grande desenvolvimento e progresso humano. Cresce o conhecimento sobre o corpo humano, e é cada vez mais concreta a capacidade de curar doenças; temos mais tecnologia para produzir alimentos e armazená-los; temos capacidade de fazer grandes viagens, dentro e fora do planeta; podemos nos comunicar a grandes distâncias e estamos diante de tantas outras maravilhas e avanços tecnológicos que surgem a cada dia. Produzimos muitos bens, mas eles não são distribuídos com justiça e nem pela necessidade. Por que acontece isso? 

Mas, num caminho inverso, enquanto cresce a sociedade do “bem-estar” e enquanto aumenta o acúmulo de bens por parte de alguns indivíduos, diminui o espaço para Deus, o criador de todas as coisas. A primeira restrição acontece no espaço do encontro pessoal, no coração e nas mentes dos homens, mulheres, jovens e crianças de hoje. Não se encontra mais tempo para estar com Deus, porque o tempo está plenamente ocupado com a busca da satisfação de necessidades artificiais, e é preciso correr para fazer e para ter. Como resultado disso, surge uma sociedade frenética e, ao mesmo tempo, assolada de muitos males psíquicos e físicos. 

Nesse contexto, exatamente porque diminui a presença de Deus na vida das pessoas, se restringe os espaços do sagrado. Tirar os crucifixos ou imagens de ambientes públicos é uma atitude que vai ao encontro do modo de vida de quem já se esqueceu de Deus e não quer ser incomodado por nenhuma ideia religiosa. Também por isso, não se precisa de espaços de culto e de encontro. Alguns espaços históricos, de valor arquitetônico, recebem o “benefício” do tombamento, com o objetivo de preservar a memória e genialidade de um tempo distante. Outros espaços sofrem com a dessacralização, com a perda do sentido religioso, já não se distingue o espaço sagrado de outros espaços sociais, e por esse motivo celebrações são tidas como eventos, seguindo um espírito mundano, estético e teatral, que substitui o referencial religioso. São cada vez mais frequentes as proibições e exigências para a construção e manutenção de igrejas. 

A restrição de espaço para Deus na vida e a subtração dos espaços físicos acabam por diminuir a presença e relevância de Deus no mundo. As consequências dessa ausência são imediatas e estão por toda parte. Cresce a indiferença do homem pelo homem; aumenta a exploração e a exclusão dos pobres; os recursos naturais são retirados até a exaustão, deixando apenas um rastro de degradação na natureza; os bens materiais se sobrepõe aos valores éticos e morais, daí o aumento da corrupção e da violência. 

Quanto mais o homem se afasta de Deus e tenta apagar os sinais da presença divina tanto mais o homem perde a consciência de si mesmo. Aquilo que acontece do lado de fora, isto é, no mundo, reflete o que está acontecendo no coração do homem. O espaço que não é ocupado por Deus está sendo e será ainda mais ocupado pelo pecado e por seus frutos. Jesus, que é o modelo, revela ao homem o que o homem é, na sua natureza mais íntima, apresentando o projeto do Pai. O coração é o lugar, por excelência, onde deve haver espaço para Deus. Se ele estiver aberto, outros espaços serão abertos e as marcas do pecado serão vencidas. Só a abertura a Deus vai acabar com as distâncias sociais, econômicas e culturais entre as pessoas e entre os povos, só assim os bens serão distribuídos e não haverá mais necessitados entre nós. Mas, como abrir espaço nos corações? A chave está do lado de dentro e a porta não será arrombada.
 

Dom Devair Araújo da Fonseca
Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Brasilândia e Vigário Episcopal para a Pastoral da Comunicação
 
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