Editorial

O Pavilhão que nunca fechou

Vinte e cinco anos depois, o massacre dos detentos do Pavilhão 9, na Casa de Detenção de São Paulo, o Carandiru, permanece como uma chaga aberta no respeito aos direitos humanos e à dignidade da pessoa em São Paulo e no Brasil. As culpas e responsabilidades associadas ao caso nunca foram adequadamente determinadas e penalizadas, apesar de uma série de processos e julgamentos. E a população carcerária continua crescendo, em condição de superlotação nas prisões, transformadas em escolas do crime, berço de facções criminosas, território de massacres. 

O Estado não garante de forma eficiente a segurança da população nem os direitos humanos do cidadão quando aposta em presídios superlotados, onde pequenos infratores convivem e são tratados como criminosos perigosos, e onde faltam condições para a recuperação dos presos e sua reinserção na vida social. Não é casual que o Primeiro Comando da Capital (PCC - a maior fação criminosa no Brasil) alega entre as razões de sua fundação o massacre do Carandiru. Enquanto a população carcerária vem aumentando no Brasil, com o devido aumento dos gastos públicos, o sentimento de insegurança só cresce entre os brasileiros. As condições do Carandiru à época do massacre não deveriam ter existido, e o fato de ainda persistirem indica uma grave falha do Estado brasileiro na garantia da segurança da população.

A ação da tropa de choque, consequência direta das condições do presídio, foi considerada “desastrosa e mal preparada” pela Promotoria num dos processos judiciais derivados do episódio. Muitos têm culpa pelo massacre, em modos e graus muito diferentes, a começar pelos que criaram, ao longo dos anos e naquele momento, a situação que levou ao tumulto, gerando a invasão do presídio pela tropa de choque; até àqueles que apertaram os gatilhos e os responsáveis pelas ordens que, intencionalmente ou não, causaram tantas mortes. Mais uma vez, depois de tantos anos, nos deparamos não só com a impunidade, mas também com a desconfiança da população em relação à ação da Polícia. O número elevado de mortes (tanto as causadas pela Polícia quanto as dos próprios policiais), os casos de violência ocorridos durante atos públicos e manifestações mostram que – em outra grave falha do Estado brasileiro – Polícia e sociedade no Brasil ainda não se entendem, e que os agentes da ordem continuam despreparados e sem condições de garantir a segurança e os direitos dos cidadãos, num circo de horrores onde vítimas e algozes se confundem e se identificam. 

A solução para os problemas de segurança pública passa pela certeza da penalização justa e a capacidade da recuperação adequada. O Estado brasileiro trilha o caminho da impunidade, da condenação desmedida e da falta de recuperação. Mas, um Estado falha quando a sociedade permite. Essa é uma responsabilidade de todos nós.
 

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