Espiritualidade

O Dia Mundial dos Pobres e a república brasileira

Ao final do Ano da Misericórdia, o Papa Francisco instituiu o Dia Mundial dos Pobres, que representam a maioria da população do planeta. Segundo estimativa do Banco Mundial, no mundo há cerca de 700 mil pessoas que vivem em condições de pobreza extrema, com menos de 1,25 dólar por dia, e outros 2 bilhões com até 2,5 dólares por dia. O número de pessoas em situação grave de pobreza é alarmante, mas ocupa pouco espaço nos noticiários e na formulação das políticas públicas. 

Em sua Mensagem para o Dia Mundial dos Pobres deste ano, o Papa lembra que essa celebração segue o principal mandamento do Senhor transmitido pelo “discípulo-amado”, “Filhinhos, não amemos só com palavras e de boca, mas com ações e de verdade” (1 Jo 3,18). O Papa Francisco deseja que a “compaixão e obras de misericórdia em prol dos irmãos e irmãs que se encontram em necessidade”, tão evocadas no Ano da Misericórdia, sejam uma constante, sobretudo na vida dos cristãos.

Nesse sentido, a mensagem do Papa Francisco é clara ao afirmar o “direito evangélico” de pertença dos pobres à Igreja, o que obriga a uma opção fundamental por eles. E alerta para o perigo atual de anestesiar as consciências diante do grito dos pobres ou de aquietá-las com a cultura de se praticar “boa obra” esporádica. Contra essas ameaças, diz o Papa: “Se realmente queremos encontrar Cristo, é preciso que toquemos o seu corpo no corpo chagado dos pobres”, como o grande santo de Assis. 

São Francisco é apresentado na mensagem como exemplo eloquente da “força transformadora da caridade”, para os discípulos missionários refletirem sobre a vocação cristã à pobreza e assumirem, livremente, responsabilidades pessoais e sociais. Para tanto, que os que tocam a carne de Cristo nos pobres ajudem a descortinar os diversos rostos de pobres e sofredores, “espezinhados pelas lógicas perversas do poder e do dinheiro”, para interpelar as comunidades de seguidores de Jesus, assim como organizações civis e governamentais. 

A sociedade brasileira, que comemora no dia 15 de novembro 128 anos do regime republicano, vê crescer, desde 2014, entre 2,6 a 3,5 milhões, o número de pessoas que vivem com menos de R$ 140 por mês, portanto, abaixo da linha da pobreza extrema. Na cidade de São Paulo, esse aumento dos pobres é visto sem esforços. A população de rua ultrapassou o número de 20 mil pessoas. Outros tantos sofrem com deficiências de moradia, saúde, escola, transporte público e com situações de violência.

A celebração do Dia Mundial dos Pobres no Brasil, em data tão próxima à comemoração da instalação da República, é momento oportuno para se proclamar que sem avançar na superação da exclusão gritante, a sociedade brasileira, composta por grande maioria de trabalhadores empenhados na construção de um país solidário e fraterno, poderá sucumbir em virtude da injustiça geradora de tanta pobreza e violência.

A Arquidiocese de São Paulo inspirou a maior parte da estrutura de Assistência Social desta grande cidade. Suas paróquias e comunidades aqui instaladas também contam com serviços aos necessitados. Além disso, há um vicariato específico para o povo da rua. Não obstante todo esse serviço prestado, o desafio é levar os discípulos-missionários a uma maior proximidade aos pobres para que percebam a paróquia como “casa dos pobres” e gerar ainda mais fraternidade, sem abdicar de reflexão crítica acerca da conjuntura geradora de mais pobreza.
 

Dom Luiz Carlos Dias
Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Belém

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