Editorial

Coragem de abraçar a Cruz

Vivemos uma Quaresma como nunca antes. Fechados em casa, distantes das pessoas que mais amamos, fisicamente distantes da comunidade cristã e, para a maioria das pessoas, distante da presença real de Cristo na Eucaristia. Um verdadeiro sacrifício quaresmal, imprevisto, não habitual e altamente indesejado. Porém, em sua histórica oração pelo fim da pandemia do novo coronavírus, na sexta-feira, 27 de março, o Papa Francisco lançou uma forte mensagem de esperança e coragem.
Referindo-se à imagem de Jesus em sua Paixão e Morte na Cruz, ele disse: “O Senhor nos questiona e, em meio à nossa tempestade, nos convida a despertar e ativar a solidariedade e a esperança capazes de dar solidez, sustento e significado a essas horas em que tudo parece naufragar”.
Quantos gestos de solidariedade temos visto neste período. Homens e mulheres profissionais de saúde que trabalham dia e noite e, às vezes, dão a própria vida pelo outro. Homens e mulheres que intensificaram as atividades nos supermercados, nas entregas, nas obras sociais. Padres que rezam sozinhos, mas que aprenderam a usar as redes sociais para trazer seu povo para mais perto. Servidores públicos que se dedicam às medidas de segurança e saúde. Profissionais de imprensa que não pararam e, mesmo de casa, nos garantem o direito à informação.
“Em meio ao isolamento no qual estamos sofrendo a falta dos afetos e dos encontros, experimentando a falta de tantas coisas, escutamos mais uma vez o anúncio que nos salva: ‘Ressuscitou e vive conosco!’”, diz o Papa.
Sinais disso são também as diversas iniciativas de fundos solidários para o povo de rua e os mais pobres, que serão os mais afetados pela crise econômica que está por vir. Nesse momento difícil, em que nossas fragilidades são expostas, em que somos desafiados a superar as fraquezas da mente, do corpo e da falta de vida social, também temos a enorme oportunidade de colocar a vida no lugar. Podemos usar o tempo para ler mais as escrituras e os livros espirituais, rezar mais, meditar mais, dedicar mais tempo para os familiares que estão em casa, telefonar para pessoas que estão distantes.
“Na Cruz, fomos salvos. Na Cruz, fomos resgatados. Temos uma esperança: na sua Cruz, fomos curados e abraçados até que nada e ninguém nos separe do seu amor redentor”, afirmou o Papa, em sua oração, seguida da bênção Urbi et Orbi.
Da sua Cruz, na qual jorrou sangue e água – como curiosamente simbolizou o crucifixo colocado na Praça São Pedro, molhado pela chuva –, Cristo abraçou a humanidade. No alto da Cruz, derramou sobre nós sua “divina misericórdia”, sua “chuva de graças”.
Abraçar a Cruz, lembra o Papa Francisco, “significa encontrar coragem para abraçar todas as contrariedades do tempo presente, abandonando por um momento as nossas ânsias por onipotência e de posse para dar espaço à criatividade que só o Espírito é capaz de suscitar”. Abraçar a Cruz é um ato de coragem, é abraçar a força da “fé que liberta do medo e dá esperança”, diz o Papa.
Nos nossos gestos de amor, de piedade quaresmal, mesmo que a distância, seremos capazes de superar esta fase com coração contrito e conforto espiritual. Contemplemos a Cruz de Cristo e busquemos, nesses gestos e pensamentos de caridade, nos preparar para a Páscoa da Ressurreição.

LEIA TAMBÉM: A quarentena em família e a fé

Para pesquisar, digite abaixo e tecle enter.