Comportamento

Cativos no próprio domicílio

A última semana está oferecendo a todos os brasileiros, em maior ou menor amplitude, a experiência de viver cativos em seu próprio domicílio. A conhecida greve dos caminhoneiros atingiu proporções que parecem ter surpreendido até os seus protagonistas. De repente, todos começaram a perceber que estavam ficando pouco a pouco presos em suas próprias casas, sem que houvesse cercas de isolamento, ou armas de prontidão, ou mesmo proibições explícitas para que não pudessem sair. Estavam todos presos com total liberdade, sem poder ir muito além. A falta de combustível não prejudicou somente os deslocamentos para trabalho ou lazer, mas também o acesso aos produtos básicos para alimentação e higiene, assim como medicamentos, e mais tantos, outros....

A impotência toma conta de todos, e as expectativas crescem por uma solução breve. Como se comportar diante de tamanha situação inusitada, sem bandeiras ou lideranças de destaque? Para aonde se dirigir? A quem recorrer? As mensagens nas redes sociais apresentam manifestações variadas de apoio, ou de condenação, sem faltar aqueles que ainda encontram humor no meio do caos crescente. Não gostaríamos aqui de entrar pelos caminhos de julgamentos políticos ou soluções econômicas, que não nos compete nestas linhas, assim como também de exercer o papel de tribunais que com certeza virão. Nesse cenário onde mergulhamos todos, ocorre-me umas palavras ouvidas recentemente de um amigo que dizia: “Tudo que nos acontece nos favorece, se não nos aborrece e ainda se agradece”. Pode parecer difícil de pensar nestes três verbos para a situação que mencionamos: favorecer, aborrecer e agradecer.

O que está nos favorecendo essa greve? Greve é sinônimo de crise. E é exatamente nas crises que temos as melhores oportunidades para crescer, para se desenvolver enquanto pessoas. De fato, todas as circunstâncias da vida podem nos conduzir a uma experiência nova, que faz com que se adquira melhor maturidade, ou do contrário nos poderá levar ao desânimo profundo pela impotência de fazermos algo. A primeira opção será sempre mais vantajosa. Estamos tendo a oportunidade de refletir sobre nossas necessidades, hierarquizar com prioridades os nossos caminhos, evitar os desperdícios, conhecer nossos limites e sermos mais solidários com os vizinhos. O contrário é estabelecer um campo de guerra que leva ao prejuízo de todos, a partir dos mais fracos, injustamente.

Como não se aborrecer? A resposta está em olharmos a oportunidade de praticar na realidade as virtudes que por tempos permaneceram no mundo virtual. Se apesar do desconforto, da escassez, dos conflitos e agitações, esforçamo-nos em procurar crescer na paciência, na temperança, na prudência e fortaleza, estaremos nos qualificando para agir com justiça na análise dos fatos, e na escolha das melhores soluções. Se apenas encaramos a tudo como um enorme aborrecimento sem solução, ou com saídas parciais que beneficiem em primeiro os meus interesses pessoais, estaremos agindo no caminho do egoísmo, que se distância do amor e se aproxima do ódio.

Por que agradecer por esse infortúnio? Ninguém em sã consciência deseja o sofrimento. Isto, se não estiver acompanhado por uma motivação direcionada por um sentido de vida, seria patológico, um masoquismo. Mas quando diante da dor, por sairmos da zona de conforto, colocamos um sentido maior que proporcione o crescimento pessoal e de toda a sociedade, mediante a solidariedade e união ao redor de um objetivo comum para a melhoria de todos, então precisaremos agradecer. 

Omnia in bonum! “E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito.”(Rm 8, 28), afirma o São Paulo Apóstolo, numa versão bíblica do que o meu amigo mencionava anteriormente. Portanto, se não temos como influenciar diretamente nas soluções que, esperamos, possam sair em breve, que possamos ao menos aproveitar a oportunidade para que o nosso comportamento pessoal, e em família, seja cristão; com a Fé daqueles que têm esperança, e por isso, diante dos conflitos e crises, atuam com a Caridade.

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