Editorial

Campanha do Agasalho como obra de misericórdia

O inverno deste ano começou quente, mas o frio chegou a boa parte do Brasil ao longo do último fim de semana. Se já é difícil para nós enfrentar o frio no conforto do lar, imagine para aqueles que vivem nas ruas, ou até mesmo para quem não tem uma casa de alvenaria, que afasta o vento, a umidade e mantém a temperatura interna. E, por ser um país majoritariamente tropical, o Brasil não é equipado com sistemas de aquecimento.
Pensemos também nos pais que têm filhos pequenos, que crescem rapidamente, e cujas roupas de inverno não podem ser aproveitadas de um ano para o outro. Nem todo mundo tem condições de comprar roupas o tempo todo.
Em um país com 13 milhões de desempregados e níveis de pobreza ainda muito acima do aceitável, é impossível ignorar a Campanha do Agasalho. Quem tem mais roupas de inverno em boas condições pode e deve doá-las a quem não tem.
Diversas instituições do governo e da sociedade – entre elas a Igreja Católica – se unem nesta época do ano para coletar roupas, cobertores e outros objetos para enfrentar o frio. Mais do que um ato cristão, trata-se de um gesto humano: reconhecer a humanidade do outro e, na nossa necessidade comum, manifestar solidariedade e empatia.
Porém, é importante esclarecer: a Campanha do Agasalho não é uma mera oportunidade para esvaziar o armário. Na verdade, é uma oportunidade para, nesse gesto concreto, doar um pouco de si aos que mais precisam. Ao doar um pouco do que temos a quem não tem, colocamos nós mesmos a serviço do outro. Apresentamos, naquelas roupas, nossa própria história, nossas conquistas pessoais, e compartilhamos, com alegria, uma pequena parte de nós mesmos.
Infelizmente, a maioria dos agasalhos que chegam à Campanha não estão em boas condições. Chegam sujos, rasgados ou muito desgastados. Assim como a pobre viúva do relato do Evangelho (Lc 21,1-4), que dá em esmola todo o pouco que tem, é nossa missão não só doar o que sobra, mas algo que verdadeiramente importa.
Nesse gesto, abraçamos ensinamentos deixados por Jesus, como o desapego às coisas materiais. Isso não significa adotar o outro extremo, que seria descartar facilmente tudo o que sobra ou que, aparentemente, já não nos serve. Não devemos alimentar o que o Papa Francisco chama de “cultura do descarte”. Em vez disso, refere-
-se a evitar o apego excessivo a bens materiais e colocar a vida humana em primeiro lugar. Significa dar boa utilidade às coisas que contribuem com nossas atividades e que nos ajudam, assim, a glorificar a vida por meio delas.
Essa doação é, ainda, um gesto de misericórdia: a Igreja nos ensina que “vestir os nus” é uma das obras de misericórdia corporal. É uma prática de caridade fraterna, de justiça e, portanto, agrada a Deus.
Aderimos à Campanha com o coração aberto e não com a ideia de nos livrarmos de um problema. Como alerta o Papa Francisco: “Não caiamos na armadilha de nos fecharmos em nós mesmos, indiferentes às necessidades dos irmãos e preocupados só com os nossos próprios interesses. É exatamente na medida em que nos abrimos aos outros que a vida se torna fecunda, as sociedades readquirem a paz e as pessoas recuperam a sua plena dignidade.”

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