NACIONAL

Especial de Natal

Para acelerar etapas

Por Daniel Gomes
22 de dezembro de 2017

Mudanças na legislação devem dar maior agilidade a adoções, mas estruturas do judiciário podem ser um entrave

Luciney Martins/O SÃO PAULO

Parece não ser complexo: o casal visita o orfanato, conversa com as meninas que ali vivem e se interessa pela mais sorridente. Capítulos depois, a criança e os futuros pais adotivos já estão em um bom entendimento. Passam-se mais alguns dias e a menina aparece arrumando as malas, despedindo-se das colegas e partindo para uma nova casa.

O enredo em questão, mostrado este ano na reprise de uma telenovela em uma rede nacional, está bem distante da realidade. Extremamente burocrático, até como forma de evitar o tráfico de pessoas, o processo de adoção (veja as etapas no box ao lado) é demorado. Uma pesquisa da Associação Brasileira de Jurimetria e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no ano de 2015, mostrou que após cumprido todos os trâmites, a efetivação final da adoção dura, em média, mais de dois anos nas regiões Centro-Oeste, Sul e Norte do Brasil, quase um ano e meio no Sudeste e pouco mais de seis meses no Nordeste. 

 
Leia também: "Adoção, uma opção pelo amor"
"Cresce o número de adoções no Brasil"
"Diferentes formas de amar"
"Famílias abrem suas casas para a acolhida"
"Sublime Mistério do Natal!"
"Acolher o Menino Jesus entre nós!"
 

“O que a gente chama de adoção tem vários passos. O primeiro é a pessoa que está interessada se habilitar para adotar. Depois, ela entra na fila, e é esse tempo que é o que mais demorado e vai variar de acordo com a preferência que o adotante fizer. Chegada a vez dele na fila, começa o estágio de aproximação com a criança, de convivência, que pode durar até 90 dias, prorrogáveis por mais 90. Se tudo der certo na aproximação, tem início o procedimento da adoção, ou seja, o processo para que saia a sentença dizendo que o pretendente à adoção é efetivamente pai daquela criança ou daquele adolescente”, detalhou, ao O SÃO PAULO , o juiz Iberê de Castro Dias, da Corregedoria Geral da Justiça e integrante da Coordenadoria da Infância e JUventude do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

 

Mudanças na lei 

Conforme dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), mantido pelo CNJ, há no Brasil 8.390 crianças e adolescentes aptos para adoção e 42.552 pretendentes nacionais, que em sua maioria preferem crianças brancas e com até 6 anos de idade. Existem ainda 309 pretendentes internacionais, sendo que destes, 91% aceitam adotar menores de qualquer raça e 66% têm preferência por crianças entre 8 e 10 anos.

Geralmente, os menores com algum problema de saúde, que hoje representam 25,6% do CNA (2.149 crianças e adolescentes) são preteridos na hora da adoção. A lei 13.509/2017, sancionada em novembro pelo Presidente Michel Temer, tem um olhar para essa situação e, a partir de mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), assegura a prioridade no cadastro de adoção para quem queira adotar menores com alguma deficiência, doença crônica ou com necessidades específicas de saúde, além de grupo de irmãos. 

De modo geral, a nova legislação buscar dar mais rapidez a algumas etapas de adoção, a partir de medidas como a redução de seis para três meses do período máximo que a justiça tem para reavaliar a situação de uma criança que esteja em abrigo, orfanato ou em acolhimento familiar; fixação do período de 90 dias para o estágio de convivência entre o menor e a família que pretende adotá-lo (antes não havia um prazo); e a obrigatoriedade de que o processo de adoção seja concluído em até 120 dias, prorrogáveis por igual período. 

A nova legislação também altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a fim de que os pais adotivos tenham as mesmas garantias de pais sanguíneos, como direito à amamentação, estabilidade provisória no emprego após a adoção e licença-maternidade. 

Temer vetou alguns pontos do texto aprovado no Senado, entre os quais o que determinava que “recém-nascidos e crianças acolhidas não procuradas por suas famílias no prazo de 30 dias" iriam para o cadastro de adoção. O Presidente disse que esse seria um tempo muito curto e citou o caso de mães com depressão pós-parto. 

“Foi um veto absolutamente pertinente, porque especialmente ao lidar com a população mais carente, há pessoas absolutamente desassistidas pelo Estado, outras passando por questões emocionais, por alguma dificuldade social ou familiar, e com esse prazo poderiam perder o filho. Além disso, a mãe no puerpério [período pós-parto de intensas modificações físicas e emocionais para a mulher] pode estar em uma condição psíquica que faz com que fique acometida com algo similar à depressão, rejeitando o filho, inclusive”, detalhou o Juiz.

 

Melhorar as condições dos tribunais 

Embora acredite que a nova legislação poderá dar mais agilidade aos processos de adoção, Castro Dias alerta que é preciso melhorar a estruturas das varas da infância e juventude. 

“Não adianta mudar a lei, mas não dar estrutura para as varas que hoje já não conseguem cumprir os prazos. Agora, por exemplo, se fixou que a adoção esteja concretizada em 120 dias, prorrogáveis por mais 120, um prazo que antes não existia. As varas têm estruturas muito distintas. Algumas que são específicas de infância têm uma quantidade adequada de funcionários, psicólogos, assistentes sociais, mas outras são acumulativas, nas quais o juiz tem de fazer de tudo, inclusive as questões sobre a infância, e nem sempre há uma quantidade adequada de pessoas para atender essa demanda”, comentou o juiz. 

Para aumentar o interesse das pessoas na adoção de crianças e adolescentes, o CNJ tem aperfeiçoado o CNA, com medidas como a unificação dos cadastros de adoção e o de crianças acolhidas, e deverá, em breve, permitir a pesquisa do histórico de acolhimento da criança, disponibilizar informações como o relatório psicológico e social e o Plano Individual de Acolhimento, além de consulta a fotos, vídeos, cartas e desenhos dos menores que estão na lista de adoção.

(Com informações da agência Brasil, Câmara Notícias, TJ-SP e CNJ)

 

 

OS 9 PASSOS DA ADOÇÃO

1º Você decidiu adotar
Então, procure a Vara de Infância e Juventude do seu município e saiba quais documentos deve começar a juntar. Independentemente do estado civil (solteiro, casado ou em união estável), a idade mínima para se habilitar à adoção é de 18 anos, desde que seja respeitada a diferença de 16 anos entre quem deseja adotar e a criança a ser acolhida.
 
2º Dê entrada no processo
Será preciso fazer uma petição – preparada por um defensor público ou advogado particular – para dar início ao processo de inscrição para adoção no cartório da Vara de Infância. Só depois de aprovado, seu nome será habilitado para constar nos cadastros local e nacional de pretendentes à adoção.
 
3º Faça o curso e a avaliação
O curso de preparação psicossocial e jurídica para adoção é obrigatório. Ao ser concluído, o candidato é submetido à avaliação psicossocial com entrevistas e visita domiciliar feitas pela equipe técnica interprofissional. Poderá haver, ainda, a avaliação da situação socioeconômica e psicoemocional dos futuros pais adotivos apenas com as entrevistas e visitas. O resultado dessa avaliação será encaminhado ao Ministério Público e ao juiz da Vara de Infância.
 
4º Escolha o perfil da criança
Durante a entrevista técnica, o pretendente descreverá o perfil da criança desejada: sexo, faixa etária, estado de saúde, se tem irmãos ou não. Quando a criança tem irmãos, a lei prevê que o grupo não seja separado.
 
5º Certificado de habilitação
A partir do laudo da equipe técnica da Vara e do parecer emitido pelo Ministério Público, o juiz dará a sentença. Se o pedido for acolhido, o nome do pretendente será inserido nos cadastros, válidos por dois anos em território nacional.
 
6º Apto para fazer a adoção
Uma vez incluso na fila de adoção de um estado, o pretendente precisará aguardar uma criança com o perfil que indicou. Vale lembrar que itens como estilo de vida incompatível com a criação de uma criança ou razões equivocadas (como adotar uma criança para aplacar a solidão; para superar a perda de um ente querido; ou superar uma crise conjugal etc.) podem inviabilizar uma adoção.
 
7º Surge a criança com o perfil desejado
A Vara de Infância e Juventude avisa o pretendente quando existe uma criança com o perfil indicado. Depois, o histórico de vida da criança é apresentado ao adotante; se houver interesse, ambos são apresentados. A criança também será entrevistada após o encontro e dirá se quer ou não continuar com o processo. Durante esse estágio de convivência, monitorado pela Justiça e pela equipe técnica, o pretendente pode visitar o abrigo onde está o menor, realizar pequenos passeios para aproximação e conhecimento. O que não existe é a situação de ir ao abrigo e escolher uma criança para adoção [como no exemplo da novela citado na reportagem].
 
8º Conhecendo o futuro filho
Se a etapa anterior de relacionamento ocorrer bem, a criança é liberada e o pretendente ajuizará a ação de adoção. Ao entrar com o processo, ele receberá a guarda provisória, que terá validade até a conclusão do processo. A criança, então, passa a morar com a família. A equipe técnica continua fazendo visitas periódicas e apresentará uma avaliação conclusiva.
 
9º Conclusão do processo de adoção
A última fase se dá quando o juiz profere a sentença de adoção e determina a lavratura do novo registro de nascimento, já com o sobrenome da nova família. Existe a possibilidade também de trocar o primeiro nome da criança. Nesse momento, o menor passa a ter todos os direitos de um filho biológico.
 
Fonte: CNJ

 

Para pesquisar, digite abaixo e tecle enter.