‘Nossa primeira terra de missão somos nós mesmos’

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01 de dezembro de 2019

Médico, doutor em Teologia Moral e sucessor do Apóstolos, Dom Antônio Augusto Dias Duarte, 71, é Bispo Auxiliar da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro há 14 anos. Dentre as atribuições na Igreja carioca, ele é responsável por acompanhar a Pastoral Familiar. Em entrevista ao O SÃO PAULO, o Bispo falou sobre “Ser missionário antes mesmo de fazer uma missão”, tema de sua conferência no V Fórum Famílias Novas, no sábado, 16, em São Paulo. (LEIA TAMBÉMFórum destaca o papel das famílias na evangelização

Dom Antônio enfatizou que, para ter a eficiência divina, o anúncio do Evangelho necessita do “martírio” da coerência de vida e busca de santidade daquele que é chamado a ser missionário. Confira. 

O SÃO PAULOO QUE É NECESSÁRIO PARA SER MISSIONÁRIO HOJE? 

Dom Antônio Augusto Dias Duarte – Esse é um tema que todos devemos aprofundar, especialmente os jovens, porque nosso afã de evangelizar, às vezes, é tão grande, que acabamos nos envolvendo em muitas atividades, até bem organizadas, com uma eficácia comprovada, mas esquecemos que o cristão não é simplesmente um empreendedor, pois ele deve buscar a santidade. Portanto, ser santo é condição imprescindível para ser missionário. Nosso apostolado necessita da eficiência divina, e não apenas a eficácia humana. Por isso, temos que cuidar muito da nossa própria vida cristã. Fomos chamados à santidade para, assim, santificarmos o mundo. Nossa primeira terra de missão somos nós mesmos.

CONCRETAMENTE, COMO DEVE SER ESSA BUSCA? 

O missionário precisa ter vida interior, vida espiritual, ser uma pessoa de oração, que tenha intimidade com a pessoa de Cristo. Não transformaremos o mundo se não formos pessoas em contínuo processo de conversão. Já dizia Santo Tomás de Aquino: “O apostolado consiste em dar aos demais o que nós contemplamos”. Isso significa apresentar ao mundo um rosto de cristão, em que haja coerência entre o que creio e o que vivo.

A santidade consiste em corresponder ao amor de Deus. Nessa correspondência, há gradações. Na parábola do semeador, Jesus diz que as sementes que caíram em terra boa germinaram e deram 100%, 60% e 30%. Essa é a gradação da santidade. Humanamente, todos os santos, sejam os oficialmente declarados pela Igreja, sejam aqueles que nós comemoramos no Dia de Todos os Santos, chegaram ao céu com defeitos. Mas corresponderam ao amor de Deus, e, quando foram grandes pecadores, sentiram o amor de Deus e souberam se arrepender, receber o perdão de Deus, retificar a vida, recomeçar e lutar até o fim da vida. Não percamos de vista que a santidade é difícil, mas é acessível a todos. É mais fácil ser sábio do que ser santo, porém é mais acessível ser santo do que ser sábio.  

A SOCIEDADE CARECE DESSA SANTIDADE? 

Existe uma crise relativa de santidade, mas não objetiva. Estamos vivendo uma época de muitos santos, especialmente neste período do século XX e início do século XXI. Temos muitas causas de santos no Brasil. Em todo o mundo, vemos um movimento muito bonito em que as pessoas estão identificando a santidade no povo comum. Ao mesmo tempo, há muito a ser feito, pois o mundo precisa de mais santos.

O Papa Francisco, com a facilidade de criar expressões que lhe é própria, fala-nos da necessidade de percebermos os muitos santos que vivem na “porta do lado”, isto é, pessoas comuns com as quais cruzamos no dia a dia e que estão buscando a santidade. Claro que Deus chama todos à santidade, e a grande maioria dos membros da Igreja são os leigos que estão em sua vida cotidiana e, com a graça de Deus, fazem a semente do Batismo crescer, amadurecer e dar os frutos de santidade. 

QUAIS SÃO OS GRANDES DESAFIOS PARA VIVER ESSA SANTIDADE HOJE?

A santidade, a vida na graça de Deus, se dá, sobretudo, pelos sacramentos. Um dos grandes desafios é tornar mais acessível os sacramentos. Para isso, são necessários mais sacerdotes e uma maior promoção vocacional. Ao mesmo tempo, é importante que haja cada vez mais famílias com a consciência viva da vocação matrimonial e da sua missão de formar pessoas adultas na fé, que sejam capazes de atuar na sociedade, levando os valores cristãos às estruturas sociais. Famílias que sejam verdadeiras escolas de fé e berços de santidade. 

OS JOVENS, EM GERAL, DIZEM QUE O MUNDO PRECISA DE MAIS AMOR. QUAL É O AMOR ENTENDIDO PELO CRISTIANISMO

Nunca amamos o suficiente. Todos nós temos que aprender a amar até o fim da vida. Já dizia Santo Agostinho que “a medida do amor é amar sem medida”. É um desafio hoje não só conceituar o amor, mas vivê-lo com essa medida de Cristo, crescendo sempre na dimensão do amor doação, ágape, misericórdia, perdão. Os jovens são pessoas que estão em um processo de amadurecimento humano e espiritual. Mais do que palavras e definições, eles precisam ver pessoas que amem de verdade nessa doação incondicional. Além do ambiente familiar, que é a primeira grande escola de amor, os jovens precisam viver experiências de dedicação ao próximo com um amor desinteressado. Penso que muitos estão compreendendo isso se olharmos para as várias iniciativas de voluntariado com as pessoas marginalizadas, doentes e sofredoras. Eles estão aprendendo a amar amando. 

NESSA PERSPECTIVA, É POSSÍVEL DIZER QUE A IGREJA ACOLHE A TODOS

A Igreja sempre acolheu a todos, porque ela nasceu com essa identidade de ser uma grande família, na qual Deus é nosso Pai e todos somos irmãos, independentemente das mais diversas posições e âmbitos, morais, políticos, culturais, étnicos ou econômicos. Não podemos nos deixar levar por uma visão antagônica ou grupal. Temos em comum a mesma fé, a caridade e a moral, que, por sua vez, nunca foi excludente. Pode ser que ensinamentos mal compreendidos ou com uma didática errônea tenham agravado uma percepção excludente da moral. 

O Cristianismo não é um código de moral, é uma pessoa, Jesus Cristo, que veio para todos, acolheu a todos. A moral cristã, portanto, nada mais é que a vida de Cristo transformada em um ensinamento sistematizado, que deve ser transmitida de maneira cada vez mais clara e explícita, sem diluir sua essência. 

E ESSE ENCONTRO LEVA À CONVERSÃO... 

Sim, quem se encontra com a pessoa de Jesus Cristo, naturalmente, é chamado a transformar sua vida, a converter-se. E hoje, o primeiro sinal de conversão verdadeira é saber viver com os diferentes. Quando a Igreja acolhe a todos, ela não está aprovando tudo. Acolher pessoas que têm uma vida não compatível com Jesus Cristo não significa aprovar tudo o que fazem, mas, sim, dar às pessoas oportunidade de abrirem os olhos para tudo aquilo que Jesus veio ensinar com a sua vida e com as suas palavras. 

AÍ ENTRA O TESTEMUNHO

O cristão sempre foi, é e será mártir, no sentido exato da palavra, ou seja, aquele que testemunha Jesus Cristo, sua vida e seus ensinamentos. Não há evangelização mais eficiente do que o martírio. Quando se fala que o sangue dos mártires é semente de novos cristãos, esse sangue não precisa ser necessariamente o físico, mas é a coerência. A coerência do cristão é a semente para levar Cristo a todas as partes do mundo. 

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A santidade não se apagou

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05 de junho de 2019

Chegamos ao sexto mês deste ano. Tudo corre muito acelerado. Quase nem temos tido tempo para digerir bem um acontecimento e já somos sacudidos por outro de uma proporção maior e, às vezes, mais impactante. Em todas essas coisas, o que não nos deve faltar é a esperança, que nasce de uma fé cultivada por meio de uma profunda espiritualidade. 


Nós, que formamos a família ACN, queremos sublinhar, na grandeza dos muitos acontecimentos litúrgicos que celebramos como Igreja Católica, o imenso amor de Jesus pelo Pai e por nós, que nos encoraja a ser bem mais solidários, ou seja, ajudar aqueles que sofrem, que são perseguidos e maltratados. 


A ajuda constante dos benfeitores da ACN que, com muito amor, é destinada aos que mais precisam, confirma o quanto a santidade não se apagou neste mundo, tantas vezes denominado como mundo “injusto”. Queremos afirmar que, juntos aqui, acendemos “pequenos sinais” que são como velas, que iluminam e aquecem a vida de tantas pessoas que sofrem e precisam do nosso amor. A doação de cada um é o que não deixa que se apague a esperança na vida de tantos.


Você, que está conhecendo cada vez mais a ACN, tenha sempre uma certeza: a doação de cada um nasce de algo mais profundo: o amor que Jesus tem por nós e que também nos pede que tenhamos uns pelos outros. Esse é o rosto da ACN: ao ajudar os mais necessitados, enxugamos as lágrimas de Deus no mundo. 


Por outro lado, é verdade que, infelizmente, não conseguimos atender todos os pedidos que nos chegam. Lamentamos quando vemos alguma necessidade que não somos capazes de suprir naquele momento. No entanto, mantemos sempre a esperança de encontrar pessoas que queiram ajudar. Nas páginas seguintes, você verá o testemunho dos cristãos no Paquistão. Como definiu o Cardeal Joseph Coutts – Arcebispo de Karachi, no Paquistão – que nos visitou há poucos dias, “somos uma Igreja pequena e rezamos por vocês. E, vocês, que são uma Igreja grande, rezem por nós!” Esse pedido aumenta ainda mais a nossa esperança de que não estamos sozinhos e de que sempre encontraremos pessoas para ajudar os que mais sofrem.


Quero destacar ainda dois grandes acontecimentos que viveremos neste mês tão rico de espiritualidade: a Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo e a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus. Nesses acontecimentos, assim como os santos juninos, também nós encontraremos o alimento saudável para “ajudar os que mais sofrem”. 


Lembre-se sempre: estamos unidos, pois fazemos parte da Igreja, mergulhados nesta imensa fonte de amor e graça, reservada a todos nós neste mês pleno de bênçãos. Dirijo a você e a toda sua família minha bênção, fortalecida na profundidade das orações que elevamos a Deus na festa dos santos e demais acontecimentos litúrgicos de nossa Igreja.

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Papa Francisco: "escolher o caminho das Bem-aventuranças"

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01 de novembro de 2018

O Papa Francisco rezou a oração mariana do Angelus, nesta quinta-feira (1º/11), Solenidade de Todos os Santos que será celebrada pela Igreja no Brasil, no próximo domingo.

Na alocução que precedeu a oração, o Pontífice sublinhou que a Primeira Leitura da liturgia de hoje, extraída do Livro do Apocalipse, “nos fala do céu e nos coloca diante de uma grande multidão, incalculável, de nações, tribos, povos e línguas”.

Estamos unidos a todos os santos

“São os santos. O que fazem lá em cima? Cantam juntos, louvam a Deus com alegria. Seria bonito ouvir o canto deles! Podemos imaginá-lo: sabem quando? Durante a missa, quando cantamos «Santo, Santo, Santo, Senhor Deus do universo...». É um hino, diz a Bíblia, que vem do céu, que se canta lá: um hino de louvor. Então, cantando o “Santo”, não somente pensamos nos santos, mas fazemos o que eles fazem: naquele momento, na missa, estamos unidos a eles mais do que nunca.”

Segundo o Papa, “estamos unidos a todos os santos, não somente aos mais conhecidos, do calendário, mas também aos “da porta ao lado”, aos nossos familiares e conhecidos que agora fazem parte daquela grande multidão”.

“Hoje, então, é a festa da família”, sublinhou Francisco. “Os santos estão próximos a nós, aliás, são os nossos verdadeiros irmãos e irmãs. Eles nos entendem, nos amam, sabem qual é o nosso verdadeiro bem, nos ajudam e esperam por nós. São felizes e nos querem felizes com eles no paraíso.”

Caminho das Bem-aventuraças

O Papa disse que os santos “nos convidam para o caminho da felicidade, indicada no Evangelho de hoje, tão bonito e conhecido: «Felizes os pobres em espírito (...). Felizes os mansos (...). Felizes os puros de coração ...». Mas como? O Evangelho diz: felizes os pobres, enquanto o mundo diz: felizes os ricos. O Evangelho diz: felizes os mansos, e o mundo diz: felizes os prepotentes. O Evangelho diz: felizes os puros, e o mundo: felizes os espertos e os que buscam prazer”.

“Este caminho das bem-aventuranças, da santidade, parece conduzir à derrota. Porém, nos recorda novamente a primeira leitura, os santos trazem “palmas nas mãos”, isto é, os símbolos da vitória. Eles venceram, não o mundo e nos exortam a escolher a sua parte, a de Deus que é Santo.”

O Papa nos convidou a fazer as seguintes perguntas: “De que lado estamos? Do lado céu ou da terra? Vivemos para o Senhor ou para nós mesmos, para a felicidade eterna ou para alguma satisfação imediata? Perguntemo-nos: queremos realmente a santidade? Ou nos contentamos em ser cristãos sem infâmia e sem louvores, que acreditam em Deus e estimam os outros sem exagerar?”

O Senhor “pede tudo, e o que Ele oferece é a vida verdadeira. Oferece tudo, oferece a felicidade para a qual fomos criados”. “Em síntese, ou a santidade ou nada! Faz-nos bem nos deixarmos ser provocados pelos santos, que aqui não tiveram meias medidas e do além “torcem” por nós, para que escolhamos Deus, a humildade, a mansidão, a misericórdia, a pureza, para que nos apaixonemos pelo céu antes que pela terra.”

Desfrutar da felicidade de Deus

Francisco concluiu, dizendo que “hoje, nossos irmãos e irmãs não nos pedem para ouvir de novo um belo Evangelho, mas para colocá-lo em prática, para seguir o caminho das bem-aventuranças”.

“Não se trata de fazer coisas extraordinárias, mas de seguir esse caminho todos os dias que nos leva ao céu, para a família e para casa. Hoje, nós entrevemos o nosso futuro e celebramos aquilo para o qual nascemos: nascemos para nunca mais morrer, nascemos para desfrutar da felicidade de Deus!”

“O Senhor nos encoraja e a quem segue o caminho das bem-aventuranças diz: «Fiquem alegres e contentes, porque será grande para vocês a recompensa no céu». Que a Santa Mãe de Deus, Rainha dos Santos, nos ajude a caminhar com decisão pela estrada da santidade. Ela, que é a Porta do Céu, introduza os nossos amados defuntos na família celeste”, concluiu o Papa.

Corrida dos Santos

Após a oração mariana do Angelus, Francisco saudou com afeto os peregrinos provenientes da Itália e demais países, famílias, grupos paroquiais, associações e grupos escolares.

Saudou especialmente os participantes da “Corrida dos Santos”, promovida pela Fundação Missão Dom Bosco, para viver numa dimensão de festa popular a Solenidade de Todos os Santos. “Obrigado por esta bela iniciativa e pela sua presença”, disse.

A seguir, o Papa recordou que nesta sexta-feira (02/11), Comemoração de todos os fiéis defuntos, Dia de Finados, irá ao Cemitério Laurentino, em Roma. “Peço a todos vocês para me acompanharem com a oração neste dia de sufrágio por aqueles que nos precederam na fé e dormem o sono da paz.”

Por fim, desejou a todos uma boa festa na companhia espiritual dos santos e pediu aos fiéis para não se esquecerem de rezar por ele.

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‘Alegrai-vos e exultai’: A santidade é a meta de todo cristão

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12 de abril de 2018

Além de admirar os santos e rezar com eles, todo cristão deve buscar a santidade em sua própria vida cotidiana, na realidade onde se encontra, e praticá-la mesmo com pequenos gestos de caridade – não de forma individualista, mas junto a toda a comunidade, na Igreja. Esta é uma possível chave de leitura da nova exortação apostólica do Papa Francisco, Gaudete et Exsultate (Alegrai-vos e exultai), sobre o chamado à santidade no mundo contemporâneo, publicada na segunda-feira, 9. 

“Para um cristão, não é possível pensar a própria missão sobre a terra sem concebê-la como um caminho de santidade, porque esta é, de fato, vontade de Deus”, afirma o Sumo-Pontífice no texto, citando a primeira carta de São Paulo aos Tessalonicenses (4,3). “Todo santo é uma missão; é um projeto do Pai para refletir e encarnar, em um momento determinado da história, um aspecto do Evangelho”, completa. 

E mesmo os santos reconhecidos não eram pessoas sem erros ou pecados. “Talvez a vida deles não tenha sido perfeita. Mas, mesmo diante da imperfeição e de quedas, continuaram a seguir em frente e são agradáveis ao Senhor. Os santos que já alcançaram a presença de Deus mantêm conosco um laço de amor e de comunhão”, explica.

Nesse sentido, “muitas vezes, temos a tentação de pensar que a santidade é reservada àqueles que têm a possibilidade de manter distância das ocupações ordinárias, para dedicar muito tempo à oração. Não é assim. Todos somos chamados a ser santos, vivendo com amor e oferecendo, cada um, o próprio testemunho nas ocupações de cada dia”, insiste Francisco

 

INTEGRAR AÇÃO E ORAÇÃO

O Papa reserva parte do texto à oração, recordando que Jesus é o caminho para o bom discernimento, em meio a desafios da vida. Inclusive, dedica grande atenção à “luta constante contra o diabo”, que, segundo o Pontífice, não é “um mito, uma representação, um símbolo, uma figura ou uma ideia”. Para vencê-lo, é preciso usar “as armas poderosas que o Senhor nos dá: a fé que se expressa na oração e na meditação da Palavra de Deus, a celebração da missa, a adoração eucarística, a reconciliação sacramental, as obras de caridade, a vida comunitária, o empenho missionário”. 

Portanto, embora veja a oração pessoal no centro da vida cristã, a proposta de santidade apresentada pelo Papa na Gaudete et Exsultate prevê o encontro com o próximo no mundo, transformando-o por meio do serviço e do “empenho evangelizador”. 

“Não é saudável amar o silêncio e evitar o encontro com o outro, desejar o repouso e rejeitar a atividade, buscar a oração e subvalorizar o serviço. Tudo pode ser aceito e integrado como parte da própria existência neste mundo, e começa a fazer parte do caminho de santificação”, diz a Exortação. “Somos chamados a viver a contemplação também em meio à ação, e nos santificamos no exercício responsável e generoso da nossa missão.” 

Dividido em cinco capítulos, o Documento tem pouco menos de 50 páginas e abrange uma série de outros temas, sempre ligados à proposta de busca da santidade no mundo atual. O Papa denuncia, por exemplo, dois “inimigos sutis” da santidade: o gnosticismo e o pelagianismo atuais. 

O gnosticismo é, para ele, uma “vaidade superficial”, isto é, “reduzir o pensamento de Jesus a uma lógica fria que procura dominar tudo”. Trata-se de negar a transcendência e explicar tudo como os raciocínios humanos. Já o pelagianismo atual é, conforme a Exortação, uma autossuficiência que ignora a vida na comunidade formada pela Igreja. Envolve “transmitir a ideia de que se pode fazer tudo com a vontade humana, como se ela fosse algo de puro, perfeito, onipotente”. 

No terceiro capítulo, Francisco propõe as bem-aventuranças como “carteira de identidade” de todo cristão. “Como fazer para ser um bom cristão? A resposta é simples: fazer, cada um do seu modo, o que diz Jesus neste sermão”, reflete.

 

POR QUE FALAR DA SANTIDADE?

Esta é a terceira exortação do Papa Francisco, lançada exatamente dois anos após Amoris laetitia . De acordo com o Vigário de Roma, Dom Angelo De Donatis, que a apresentou em coletiva de imprensa no Vaticano, o objetivo do documento é “mostrar a atualidade perene da santidade”, uma palavra vista como “antiquada” na sociedade de hoje. 

“A proposta não é fazer um tratado nem repetir definições já amplamente estudadas pelos teólogos da Igreja”, disse o Arcebispo. “Na verdade, o Papa nos pede para ampliar o nosso olhar, refletir sobre aonde estamos indo, aonde vai a Igreja, pois ela perde o sentido se não tem clara a dimensão do caminho de santidade”, acrescentou. “Portanto, a ideia é apresentar a santidade como meta desejável do próprio caminho humano. É um chamado que Deus apresenta a cada um”, definiu.
 

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Oferta da vida: nova via de santidade

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11 de julho de 2017

Foi publicado nesta terça-feira, 11 de julho, o Motu Proprio do Papa Francisco “Maiorem hac dilectionem” sobre a oferta da vida nas causas dos santos

Com o documento, o Pontífice abre o caminho à beatificação daqueles fiéis que, impulsionados pela caridade, ofereceram heroicamente a própria vida pelo próximo, aceitando livre e voluntariamente uma morte certa e prematura com o intuito de seguir Jesus.

Há séculos, as normas da Igreja Católica preveem que se possa proceder à beatificação de um Servo de Deus percorrendo uma dessas três vias: o martírio (suprema imitação de Cristo com morte violenta), as virtudes heroicas (a vivência acima do comum e constante no tempo das virtudes teologais), e os casos excepcionais (conhecida como equipolente).

Essas três vias, todavia, resultavam insuficientes para interpretar todos os casos possíveis de santidade canonizável. De fato, ultimamente, a Congregação das Causas dos Santos colocou-se a questão “se os Servos de Deus que, inspirados pelo exemplo de Cristo, tenham livre e voluntariamente oferecido e imolado a própria vida pelos irmãos num supremo ato de caridade, que tenha sido diretamente causa de morte, não mereçam a beatificação”. Trata-se, portanto, de introduzir uma quarta via, que foi chamada “oferta da vida”.

Embora tenha elementos que a assemelhem seja à via do martírio, seja à via das virtudes heroicas, esta nova via pretende valorizar um tipo de testemunho cristão heroico até agora sem um procedimento específico, justamente porque não se enquadra completamente nem na categoria do martírio nem na categoria das virtudes heroicas. Não é martírio porque não há um perseguidor e não é virtude heroica porque não é expressão de um exercício prolongado das virtudes. Para delimitar este aspecto, o Motu Proprio fala de “morte num período breve de tempo”, o que não significa imediata, mas nem mesmo tão longa a ponto de transformar o ato heroico em virtude heroica.

A “oferta da vida” até então não constituía uma categoria específica, mas, se comprovada, era incorporada ou como martírio ou como virtudes heroicas – o que não fazia jus à sua verdadeira natureza. Há séculos, a Igreja não exclui das honras dos altares os fiéis que deram a vida num extremo ato de caridade, como, por exemplo, morrer contagiado com a mesma doença do enfermo assistido.

Critérios

O documento pontifício esclarece no artigo 2: “a oferta da vida, para que seja válida e eficaz para a beatificação de um Servo de Deus, deve responder aos seguintes critérios: a. oferta livre e voluntária da vida e heroica aceitação propter caritatem de uma morte certa e decorrida num breve período de tempo; b. nexo entre a oferta da vida e a morte prematura; c. exercício, pelo menos em grau ordinário, das virtudes cristãs antes da oferta da vida e, depois, até a morte; d. existência da fama de santidade pelo menos depois da morte; e. necessidade do milagre para a beatificação, ocorrida depois da morte do Servo de Deus e por sua intercessão”.

Enriquecimento

Com este documento, a doutrina sobre a santidade cristã e o procedimento tradicional da Igreja para a beatificação dos Servos de Deus não somente não são alterados, mas são enriquecidos de novos horizontes e oportunidades para a edificação do povo de Deus, que nos seus santos vê o rosto de Cristo, a presença de Deus na história e a exemplar atuação do Evangelho.

O texto do Motu Proprio do Papa Francisco está disponível no momento em italiano e latim.

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