O SÃO PAULO recorda início do pontificado de Francisco

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12 de março de 2020

Nesta quinta-feira, 12, a série “#TBT O SÃO PAULO” recorda a edição número 2944 do semanário da Arquidiocese de São Paulo, publicada em 13 de março de 2013, data que marcou o início do Pontificado do Papa Francisco, eleito sucessor de Pedro às 15h07 daquele dia, após uma fumaça branca sair da chaminé da Capela Sistina, onde os cardeais estavam reunidos para escolher um novo Papa, após a renúncia de Bento XVI.

Muitos ficaram surpresos quando o argentino Jorge Mario Bergoglio, até então Arcebispo de Buenos Aires, apareceu sorridente na janela, já com o nome de ‘Francisco’. Ele abençoou a multidão que mesmo com frio de 9 graus celsius estava em vigília na Praça São Pedro, no Vaticano.  

Segundo o próprio Papa relatou o nome foi escolhido por influência do Arcebispo Emérito de São Paulo, Cardeal Cláudio Hummes, que disse a Bergoglio logo após a eleição ainda na Capela Sistina: “Não se esqueça dos pobres”.

REZEM POR MIM

Francisco, em seu primeiro ato de fala, surpreendeu a todos na praça, ao pedir “um favor”: “Peço-vos que rezem ao Senhor para que me abençoe, a oração do povo pedindo a bênção pelo seu bispo. Façamos em silêncio esta oração”, declarou, conseguindo calar a multidão que se encontrava em festa e rezou com o povo o Pai-Nosso e a Ave-Maria.

Após a oração, as feições do Papa se abriram e ele, já mais descontraído, brincou com os fiéis, dizendo: “Sabeis que o dever do Conclave era dar um Bispo a Roma: parece que os meus irmãos cardeais foram buscá-lo quase ao fim do mundo”. Então, Francisco deu a tradicional bênção papal Urbi et Orbi (à cidade e ao mundo).

“A Igreja recebeu um novo Sucessor de Pedro para conduzi-la nos caminhos do Evangelho e para animar todos os seus membros no testemunho da salvação de Deus, manifestada a toda a humanidade por meio de Jesus Cristo. Participei pela primeira vez de um Conclave e posso dizer que foi ocasião para uma experiência eclesial única e profunda! Pude perceber a sincera busca do melhor para a Igreja e sua missão. O Espírito Santo não dorme!”, disse o Cardeal Odilo Pedro Scherer na ocasião.

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Cinco anos com o Papa Francisco

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13 de março de 2018

Cinco anos atrás, no dia 13 de março de 2013, era eleito Papa Francisco. Alguns dados para sintetizar esses anos de Pontificado: duas encíclicas (Lumen fidei, sobre a fé, que continua o que fora escrito por Bento XVI e Laudato si, sobre o cuidado da casa comum, preservar a Criação não é dever dos verdes, mas dos cristãos), duas Exortações apostólicas (Evangelii gaudium, texto programático do Pontificado para uma Igreja em saída, fortemente missionária, e Amoris laetitia sobre o amor na família), 23 Motu próprio (reforma da Cúria Romana, gestão e transparência econômica, reforma do processo de nulidade matrimonial, tradução de textos litúrgicos, com indicações para uma maior descentralização e mais poderes às Conferências Episcopais), dois Sínodos sobre a família, um Jubileu dedicado à Misericórdia, 22 viagens internacionais com mais de 30 países visitados e 17 visitas pastorais na Itália, 8 ciclos de catequese na audiência geral das quartas-feiras (Profissão de fé, Sacramentos, Dons do Espírito Santo, Igreja, família, misericórdia, esperança cristã, Santa Missa), quase 600 homilias sem texto nas Missas em Santa Marta, mais de 46 milhões de seguidores no Twitter e mais de 5 milhões no Instagram. Sem contar os inúmeros discursos, mensagens e cartas, e os milhões de homens, mulheres e crianças de todo o mundo, encontrados, abraçados, acariciados.

 

Uma igreja com as portas abertas

O primeiro Papa jesuíta, primeiro proveniente das Américas, primeiro com o nome do Pobrezinho de Assis, Francisco, 265º Sucessor de Pedro, deseja uma Igreja com as portas abertas que saiba anunciar a todos a alegria e a frescor do Evangelho. Uma igreja acolhedora, “onde há espaço para todos com sua vida fadigada”, não um dogma que controle a graça em vez de facilitá-la. Uma Igreja que corra o risco de ser “ acidentada, ferida e suja” para chegar e estar no meio do povo, em vez de uma Igreja doente pelo fechamento e o conforto de se apegar às suas próprias seguranças”. Pede para abandonar um estilo defensivo e negativo, de mera condenação, para propor a beleza da fé, que é encontrar Deus.

 

O Espírito Santo perturba

O convite de Francisco é um convite para deixar-se surpreender pelo Espírito Santo, o verdadeiro protagonista da Igreja, que continua a falar e a nos contar coisas novas. Uma das palavras fortes do Pontificado, Francisco a pronunciou em Istambul em novembro de 2014: o Espírito Santo “perturba”, porque “move, faz caminhar, empurra a Igreja a ir para frente”, enquanto é muito mais fácil e mais seguro” reclinar-se nas próprias posições estáticas e inalteradas”. É muito mais reconfortante acreditar que a verdade seja “possuir” um pacote de doutrinas, muito bem confeccionado, que possamos gerenciar bem, ao invés de pertencermos nós mesmos à Verdade: é o Espírito que nos guia à verdade toda inteira. O cristão ainda tem muito a aprender porque Deus revela-se cada vez mais. Tanto que Francisco pode dizer que ele tem muitas dúvidas: “em um sentido positivo” - explica – “são um sinal de que queremos conhecer melhor Jesus e o mistério de seu amor por nós”. “Essas dúvidas nos fazem crescer”. Também Pedro, diante dos pagãos pôde dizer: ““Estou compreendendo que Deus não faz discriminação entre as pessoas. Pelo contrário, ele aceita quem o teme e pratica a justiça, qualquer que seja a nação a que perten­ça” (Atos 10: 34-35). Cresce a inteligência da fé.

 

Papa de direita ou de esquerda?

Inicialmente, todos ou quase falavam bem de Francisco. Aos poucos as críticas chegaram. Uma boa notícia recordando as palavras de Jesus: “Ai de vocês quando todos falarão bem de vocês”. A direita acusa o Papa de ser comunista, porque ele ataca o atual sistema econômico liberal: “é injusto na raiz”, “esta economia mata”, prevalece a “lei do mais forte” que “come o mais fraco”. E fala demais sobre os migrantes e sobre os pobres: hoje “os excluídos não são só explorados, mas são resíduos, são restos”. A esquerda, acusa o Papa de estar parado em questões éticas: defende a vida, contra o aborto e a eutanásia: “não é ser progressista pretender resolver problemas eliminando uma vida humana”. Defende a família baseada no matrimônio entre um homem e uma mulher, condena a teoria do gênero, “erro da mente humana” e a ditadura do pensamento único e as colonizações ideológicas, também nas escolas, que correm o risco de se tornarem campos de reeducação. Ele adverte sobre questões da diminuição do direito à objeção de consciência. Ele observa a proliferação de direitos individuais, “individualistas”, diz, mas sem se preocupar com os deveres, e enquanto se fala de novos direitos - afirma - há pessoas que ainda passam fome.

 

Crítica interna

Aumentaram também as críticas dentro da Igreja. Há quem que até mesmo chama de herege o Papa, que diz que rompe com a Tradição secular da Igreja, que se irrita porque “bate” em quem está perto e acaricia quem está distante; há quem o contrapõe aos Papas precedentes. No entanto, Bento XVI já havia convidado a refletir sobre o discernimento para a Comunhão aos divorciados e recasados em certos casos especiais. João Paulo II já havia respondido a Dom Lefebvre, 40 anos atrás, explicando o verdadeiro significado da Tradição que “tem origem nos Apóstolos, progride na Igreja sob a assistência do Espírito Santo”. De fato, “a compreensão, tanto das coisas quanto das palavras transmitidas, cresce (...) com a reflexão e o estudo dos crentes”. Mas é “acima de tudo contraditória” – afirmava São João Paulo II – “uma noção de Tradição que se opõe ao Magistério universal da Igreja, do qual é detentor o Bispo de Roma e o Corpo dos Bispos. Não se pode permanecer fiel à Tradição, rompendo o vínculo eclesial com o qual Cristo mesmo, na pessoa do apóstolo Pedro, confiou o ministério da unidade na sua Igreja”. “A autodestruição ou o fogo amigo - afirma o Papa Francisco - é o perigo mais sorrateiro. É o mal que ataca de dentro; e, como disse Cristo, todo reino dividido acaba em ruínas”. O Papa cita frequentemente o diabo: é Ele que tenta destruir a Igreja. A sua “é uma guerra suja” e “nós ingénuos estamos ao seu jogo”.

 

Canteiros abertos

Duas ações fortemente promovidas por Francisco estão ainda em andamento: a primeira é a reforma da Cúria, devido à complexidade da reorganização de uma instituição secular (“fazer reformas em Roma é como limpar a Esfinge do Egito com uma escova de dentes” disse o Papa, citando Dom De Mérode). Mas também os escândalos, como Vatileaks2, não detém Bergoglio. A segunda ação é a luta contra os abusos sexuais na Igreja. Alguns membros da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores, criada por Francesco, renunciaram, denunciando resistências e atrasos. O Papa reitera a “tolerância zero” porque “não há lugar no ministério para aqueles que abusam de crianças”. E vai avante.

 

Diplomacia da paz

Francisco promove a cultura do encontro, em campo ecuménico, inter-religiosos, na frente social e política e no nível meramente humano. Ele se move em direção à unidade, mas sem cancelar as diferenças e as identidades. Importante o seu papel no desgelo entre os Estados Unidos e Cuba, assim como no processo de paz na Colômbia e na África Central. Ataca quem fabrica e vende armas. Ao mesmo tempo denuncia fortemente as perseguições dos cristãos, talvez hoje mais graves do que ontem, no “silêncio cúmplice de tantas potências” que podem detê-las. Lança apelos contra o tráfico de seres humanos, “uma nova forma de escravidão”.

 

Tempo de misericórdia, mas até um certo ponto

É incontestável que a palavra central deste pontificado seja “misericórdia”: é o sentido da Encarnação do Verbo. É uma palavra que escandaliza. Francisco percebe isso. Deus é excessivo no amor pelas suas criaturas. No entanto, há um limite: a corrupção. O corrupto é quem não sabe que é corrupto, que recusa a misericórdia divina. E Deus não se impõe. Existe um juízo final. É por isso que o Papa sempre propõe o capítulo 25 do Evangelho de Mateus: “Eu estava com fome e você me deu comer...”. No ocaso da vida, seremos julgados pelo amor.

 

Menos clericalismo na Igreja, mais espaço aos leigos, mulheres e jovens

Francisco se opõe ao clericalismo, porque o pastor deve “servir” e ter “o cheiro das ovelhas”. Ele afirma que os leigos devem descobrir cada vez mais sua identidade na Igreja: eles não devem permanecer à margem das decisões. Basta com os “bispos piloto”. Relança o papel das mulheres, mas olhando para o seu mistério, não à sua funcionalidade: não se trata de uma luta pelo poder ou de reivindicações impossíveis, como o sacerdócio. Trata-se de refletir sobre a hermenêutica da mulher porque - reitera - Maria é mais importante do que os Apóstolos. Convida os jovens a terem um maior protagonismo e a incomodarem os pastores com sua criatividade.

 

Evangelizadores com Espírito

O Papa pede a todos os cristãos que sejam “evangelizadores com Espírito” para “anunciar a novidade do Evangelho com audácia, em voz alta e em todos os momentos e lugares, também contracorrente”, tocando “a carne sofrida dos outros”, dando “razão da nossa esperança, mas não como inimigos que apontam o dedo e condenam”. “Se eu consigo ajudar uma só pessoa a viver melhor - afirma Francesco - isso já é suficiente para justificar o dom da minha vida”.

 

Vatican News

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Um pontificado que começou em Aparecida?

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14 de novembro de 2017

Em meio a tantos livros publicados sobre Francisco, finalmente o primeiro Papa latino-americano fala exclusivamente sobre a Igreja presente na América Latina. No livro-entrevista “Latinoamérica”, que acaba de ser publicado na Argentina ( Editora Planeta ), Papa Francisco responde às perguntas do jornalista Hernán Reyes Alcalde – também argentino. O ponto de partida é a V Conferência do Episcopado Latino- Americano e do Caribe, realizada há dez anos em Aparecida (SP), que para muitos é o “início conceitual” do pontificado de Francisco. 

“Um dos aspectos distintivos de Aparecida é que foi a primeira conferência latino-americana que não se esgotou com o documento final”, afirmou o autor ao O SÃO PAULO , na segunda-feira, 6, por telefone. “Vai um passo além, com a proposta de uma missão continental. E nesse aspecto, o Papa acredita que ainda há muito o que fazer.” Segundo Reyes, a proposta era desenvolver ideias de Jorge Mario Bergoglio que estão enraizadas no Documento de Aparecida, do qual o então Arcebispo de Buenos Aires foi o principal relator. “Pensar sobre Aparecida em nível conceitual, a partir dos alinhamentos, eixos temáticos”, disse o Repórter da agência Telam . 

“Nos quatro encontros que tive com Francisco, vi um Papa preocupado, mas no sentido de ‘pré-ocuparse’, ou seja, ocupado antecipadamente com as coisas”, acrescentou. “Muitos pensamentos sobre a questão dos jovens e a questão do ambiente, que, justamente, são os próximos dois Sínodos dos Bispos que ele convocou. São dois temas que parecem preocupações, no sentido de ocupar-se, dar atenção antecipada”, disse. 

Papa Francisco deixou claro, na entrevista, que durante seu pontificado não haverá uma nova conferência dos bispos latino-americanos, pois ainda falta muito para se concretizar o que foi discutido há dez anos em Aparecida. E o que faz a Igreja missionária latino-americana ainda não ter chegado lá? Responde o pontífice: “Posso me equivocar, mas tenho uma hipótese: se chama clericalismo. O clericalismo latino-americano é muito forte”, afirma no livro. 

“A vocação do leigo na América Latina tem de ir se redescobrindo, elaborando e se fazer sentir o peso que tem a Igreja”, completa. “Porque a missionariedade, quando falamos de missão continental, não te é dada pela ordem sagrada ou pelo episcopado, mas pelo Batismo: a partir daí, tens que ser testemunho de Jesus Cristo.”

 

Ideia que surgiu há mais de um ano 

A inspiração para o livro surgiu durante o voo papal de Roma para a Armênia, em junho de 2016, no qual o Papa mencionou uma citação do pensador uruguaio Alberto “Tucho” Methol Ferré. Antes do conclave que elegeu o Papa Bento XVI, em 2005, Ferré havia declarado que “ainda não era tempo para um Papa latino-americano”. Lembrado desse tema pelo próprio Francisco, Reyes se questionou se o primeiro papa das Américas pensava o mesmo. E, de fato, no livro Francisco confirma a hipótese do jornalista. Essa informação é, para Reyes, talvez a maior novidade factual do livro.

“Sim, eu compartilhava essa postura de Tucho”, revela Papa Francisco. “Quando li isso em Buenos Aires, antes de vir para o conclave, disse ‘que intuição genial’. Além da ação do Espírito Santo que atua no conclave, neste momento da conjuntura histórica acrescentava outra coisa: o único homem que tinha a altura, a sabedoria e a experiência suficientes para ser eleito era [Joseph] Ratzinger”, responde. “Ao contrário, existia o perigo de se eleger um Papa ‘de compromisso’. E eleger um ‘Papa de compromisso’ parece que não é muito ligado ao Evangelho, digamos.”

 

América Latina para os Latino-Americanos

“Não te esqueças que o mar é lugar de riqueza, de pesca e de trabalho, mas também é lugar de ameaças. No Evangelho se usa das duas maneiras”, diz Papa Francisco, no livro, para lembrar que as periferias existenciais de que sempre fala não são somente as geográficas. “Também há periferias de pensamento: ir dialogar com os limites, dar lugar ao confronto de pensamento. Confronto no bom sentido, o desenvolvimento do pensamento, e de não ter medo de falar com uma pessoa que tem outro esquema de coisas”, completa. 

O Papa está entre os pensadores que defendem uma unidade latino-americana, ideia que remete às históricas empreitadas de heróis como Simón Bolívar e José de San Martín. Conforme explica o jornalista Hernán Reyes Alcalde, isto é algo que, desde a época de cardeal, Bergoglio expressava. “Escreveu dois prólogos em livros do uruguaio Guzmán Carriquiry, um em 2005 e outro em 2011, e aí estava com clareza a ideia latino-americanista. Usa a expressão pátria grande. Aqui também, novamente, é interessante a introdução de Ferré, um dos grandes teóricos da linha continental. Também no Documento de Aparecida há muito dessa interpretação”, analisa. 

O livro é bastante breve, tem apenas 200 páginas, e metade é uma compilação de discursos do Papa. O enfoque social de “Latinoamérica” é principalmente sobre três temas: jovens, mulheres e encarcerados, mas as conversas entre Papa Francisco e Reyes vão além, passando também pelo meio ambiente – ponto importante da Encíclica Laudato Si ’, que Francisco insiste ser uma “encíclica social” –, pelo diálogo ecumênico e inter-religioso e pelas características necessárias para um político católico latino-americano. 

“É um Papa que fala do tema das mulheres, dos encarcerados, dos jovens e da questão ambiental”, lembra Reyes. “Mas, uma preocupação constante e o fio condutor, me parece, é colocar o ser humano no centro. Todos os temas terminam com o ser humano no centro de todas as decisões.”
 

 

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