Edith Stein inspira as mulheres a assumir os desafios do tempo presente
A filósofa alemã Edith Stein (1891-1942) nasceu judia, converteu-se ao catolicismo após ler a autobiografia “Livro da Vida”, de Santa Teresa de Ávila, e ingressou no carmelo aos 42 anos de idade.
“A vida e obra de Edith Stein inspiram as mulheres a ter coragem de viver seu próprio caminho, com autenticidade, feminilidade, maternidade humana e/ou espiritual”, afirma, nesta entrevista, a pedagoga Magna Celi Mendes da Rocha, 41, mestre e doutora em Psicologia da Educação. Atual assessora da Pastoral Universitária da PUC-SP, Magna dedica-se ao estudo de Edith Stein – Santa Teresa Benedita da Cruz – e em 2014 apresentou a tese de doutorado “O sentido de formação em Edith Stein: fundamento teórico para uma educação integral”.
O SÃO PAULO – Judia de nascimento, batizada no catolicismo aos 30 anos e ingressante no carmelo aos 42 anos. Nos dias de hoje, em que se ressalta o protagonismo feminino, Edith Stein, que viveu na primeira metade do século XX, pode ser considerada uma mulher à frente de seu tempo?
Magna Celi Mendes da Rocha – Prefiro considerar que a grande marca de Edith Stein foi a de ser uma mulher “do seu tempo”. Uma mulher que soube viver profundamente imersa nas questões que seu momento histórico lhe impôs, sem sucumbir a elas. Tinha uma percepção muito apurada da realidade e utilizava todos os recursos que possuía para contribuir e transformar. Viveu durante as duas Guerras Mundiais, tendo servido como enfermeira da Cruz Vermelha durante a Primeira Guerra. Viveu como mulher em um período de lutas pela emancipação feminina, pelo direito ao voto, abertura das universidades para as mulheres, entre outras conquistas. Viu o surgimento e crescimento do nazismo, sofreu forte perseguição, mas em cada um desses acontecimentos procurou dar sua contribuição a partir de seus escritos, seu trabalho, seu ser mulher, sua vida colocada a serviço até as últimas consequências.
A partir da biografia de Edith Stein, como pode ser entendido este protagonismo feminino? Em que difere do que alguns grupos radicais feministas dão a essa expressão?
Edith Stein, em sua história de vida, foi influenciada por três grandes mulheres: sua mãe, Teresa de Ávila e Nossa Senhora. A senhora Auguste Stein ficou viúva, com sete filhos, com idades variando entre 1 e 17 anos, e com dívidas a serem pagas. Os familiares, com quem tinha um relacionamento muito estreito, especialmente os irmãos, aconselharam-
-na a vender o comércio, pagar as dívidas e contar com o apoio familiar para o que fosse necessário. Contrariando a todos, ela decidiu tocar os negócios do marido e os fez prosperar, tornando-se uma grande comerciante de madeira da região. Com sua mãe, Stein aprendeu o valor da fé, do trabalho e a importância da família. Teresa de Ávila tinha vivacidade, bom humor, coragem e determinação, que marcaram profundamente a vida de Stein, a ponto de, mais tarde, tornar-se carmelita. Em Nossa Senhora, via a expressão mais profunda de maternidade, não restrita apenas ao círculo familiar, mas uma maternidade espiritual, como a Mãe de Misericórdia, arraigada do amor universal. Marcada pelo testemunho dessas mulheres, Edith Stein acreditava no protagonismo e na emancipação femininas. Participou do movimento feminista alemão, do movimento sufragista (em defesa do voto feminino), acreditava no potencial feminino para além do ambiente doméstico, mas não aderia a todas as pautas indiscriminadamente, sobretudo as que negavam as diferenças entre homens e mulheres e propagavam a aversão ao Matrimônio e aos filhos. Para ela, a contribuição que a mulher poderia dar à sociedade seria a partir de sua singularidade feminina, não como uma sósia ou inimiga dos homens, mas em sua feminilidade, maternidade e empatia.
Antes da entrada de Edith Stein no carmelo, ela teve intensa produção pedagógica e acadêmica. Quais os traços essenciais dos escritos que ela produziu?
Edith Stein tinha forte interesse pela formação humana. Desejava uma educação que formasse o ser humano em todas as dimensões (corpo, psique e espírito), não apenas uma pseudo formação, voltada somente para a aquisição de conteúdos, o que ela chamava de “formação enciclopédia.” Embora ainda não utilizasse a expressão educação integral, era assim que concebia uma formação autêntica. São, ainda hoje, comuns propostas formativas reducionistas que visam preparar “para o mercado de trabalho”, “para o vestibular”, “para o pensamento crítico.” Isoladamente, nenhuma dessas propostas é suficiente. Sua obra pedagógica sofreu forte influência de São Tomás de Aquino, de modo que não concedia uma formação apenas para essa vida, mas buscava formar homens e mulheres em vista da eternidade.
Esse olhar para a educação que ajude a uma formação humana integral teve ramificações em outras áreas do saber ao longo do século XX?
Esse olhar integral ou holístico sobre o ser humano tem sido valorizado nas mais diversas áreas do conhecimento. O Papa João Paulo II, na Encíclica
Fides et ratio, recorda a necessidade de se alcançar uma “visão unitária e orgânica do saber”, uma vez que “a subdivisão, enquanto comporta uma visão parcial da verdade com a consequente fragmentação do seu sentido, impede a unidade interior do homem de hoje” (1998, 84).
Na cerimônia de canonização de Edith Stein, São João Paulo II afirmou que ela conseguiu compreender que o amor de Cristo e a liberdade do ser humano se entretecem, porque o amor e a verdade têm uma relação intrínseca. Quais passagens da vida de Edith Stein reforçam o que disse o Papa?
A busca pela verdade foi um grande motor da vida de Stein. Ela afirmava que quem busca a verdade, ainda que não saiba, busca a Deus. Em sua vida adulta, mesmo quando esteve distante de questões religiosas, tinha uma abertura às pessoas e suas necessidades. Esse compromisso com os outros e às questões do tempo presente colocaram Edith Stein em um compromisso renovado e livre que foram forjando sua personalidade.
Ela vivenciou tempos sombrios, situações-limite. Sabemos que em tempos de crises profundas, é necessário separar o essencial do acessório, o que é precioso do que é vil. Stein foi sendo conduzida a uma busca cada vez mais profunda a respeito da essência das coisas, seguindo o método fenomenológico e, pela via da fé, a uma busca incessante pela verdade sobre o ser humano, sobre si mesma. Suas vivências vão forjando sua personalidade, conduzindo-a por caminhos não planejados, mas livremente assumidos, até as últimas consequências. Edith Stein é uma autora que personifica a coerência entre vida e obra.
O quão importante é atualmente falar de uma mulher com tantas virtudes?
O protagonismo de Edith Stein é fruto de uma vivência autêntica de fé, primeiramente herdada de seus antepassados, depois assumida como algo pessoal. O sentido de pertencimento ao povo judeu e responsabilidade social, ampliadas pela experiência cristã, potencializaram suas marcas de coragem, ousadia e determinação. Ela é um testemunho que inspira muitas mulheres ao redor do mundo a assumir os desafios próprios de seu tempo e comprometer suas vidas, assumindo sua missão pessoal, a serviço do bem comum, onde quer que estejam inseridas: na família, no trabalho, na política, nos estudos etc.
O que as mulheres de hoje têm a aprender desse itinerário de fé vivido por Edith Stein?
A vida e obra de Edith Stein inspiram as mulheres a ter coragem de viver seu próprio caminho, com autenticidade, feminilidade, maternidade humana
e/ou espiritual, sabendo que cada pessoa é única e um dom a serviço dos outros. Sua vida nos ensina a não nos deixar aprisionar por extremismos, modismos, visões ultrapassadas que desfiguram ou menosprezam as nossas potencialidades femininas.
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Equipe Leoas da Serra conquista Intercontinental de Futsal Feminino
O Leoas da Serra, time de futsal feminino de Lages (SC), fez história em 23 de junho, ao conquistar o título da I Copa Intercontinental de Futsal Feminino. A equipe desenvolve um trabalho pioneiro no Sul do País, buscando não apenas a formação de jovens atletas, mas, também, o crescimento da modalidade.
VIRADA HISTÓRICA
Depois de perder a primeira partida na Espanha por 3 a 1 para o Atlético Navalcarnero, o Leoas da Serra precisava de uma virada no jogo decisivo, em Lages. No tempo normal, as brasileiras venceram por 3 a 1, com dois gols de Greice e um de May. Maria Navarro descontou para as espanholas.
Na prorrogação, o Atlético saiu na frente com um gol contra de Greice, mas Amandinha mostrou o porquê de ter sido escolhida a melhor do mundo nos últimos cinco anos: ela marcou duas vezes, virando a partida para o Leoas e garantindo o troféu.
A equipe é treinada pelo experiente Anderson Machado de Menezes, conhecido como Esquerda, que chegou ao clube em fevereiro de 2018 e já conquistou 13 títulos, entre eles o da Libertadores, que levou a equipe ao Intercontinental para enfrentar a campeã europeia.
“Foi um título muito difícil pelas situações que vivemos. Primeiro, pelo fato de a diretoria custear a viagem e todas as despesas, pois é muito difícil para o futsal feminino a questão financeira. E também pela derrota na Espanha, não que fosse algo fora do normal, pois a gente enfrentou uma ótima equipe”, disse o técnico ao O SÃO PAULO.
ESCOLA DAS LEOAS
O futsal feminino do Leoas da Serra nasceu em 2013, por meio da junção de dois times que, na época, eram rivais na cidade. Os excelentes resultados e as conquistas de títulos fizeram com que a equipe fosse ganhando cada vez mais visibilidade.
O projeto social de futsal feminino atende, aproximadamente, 400 meninas que participam dos núcleos espalhados pela cidade. No caso de Lages, a modalidade possui mais praticantes que o futebol masculino.
“O futsal feminino precisa começar nas escolinhas. Não adianta pensarmos somente no alto rendimento e contar cada vez menos com atletas que tenham essa base, que é muito importante para que cada vez mais elas consigam desenvolver o futsal. Acredito que um dos pontos importantíssimos do projeto é manter essas escolinhas em funcionamento, possibilitando, assim, que o futsal feminino cresça cada vez mais”, disse Anderson.
MELHOR DO MUNDO
Natural de Fortaleza, Amanda Lyssa de Oliveira Crisóstomo, a Amandinha, tem 24 anos e é fruto de um projeto social no Ceará. Sua evolução, em menos de dez anos, é meteórica. Saiu do Nordeste a convite de um time de Brusque (SC), com apenas 15 anos. Foram seis anos até a chegada a Lages.
A jovem estreou na Seleção Brasileira em 2013, época em que os Mundiais da modalidade eram realizados anualmente, e conquistou o primeiro título. Nos dois anos seguintes, tornou-se tricampeã mundial.
O técnico Anderson conheceu Amandinha nos Jogos Escolares, quando a atleta tinha 15 anos. Ele destacou que a jogadora já recusou várias propostas da Europa, para continuar difundindo a modalidade no Brasil. “É uma menina que vimos crescer e que, com certeza, vai crescer muito mais. É uma pessoa e um ser humano fantástico, e tudo o que ela está conquistando é pela pessoa que é, sempre querendo ajudar os outros e as atletas mais novas”, concluiu.