A comunhão espiritual alimenta a fé eucarística da Igreja

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14 de abril de 2020

“Todas as vezes que comemos deste pão e bebemos deste cálice, anunciamos, Senhor, a vossa morte, enquanto esperamos vossa vinda”.  Por meio desta aclamação, feita logo após a consagração da missa, os católicos manifestam a fé da Igreja na Eucaristia como memorial da paixão, morte e ressurreição de Jesus e a certeza de que Cristo permanece vivo em suas vidas até sua vinda gloriosa.

Porém, neste ano, devido à pandemia do COVID-19, a maioria dos fiéis celebraram a Páscoa sem poderem se aproximar do altar e comungar sacramentalmente do corpo e sangue de Cristo. Eles se uniram em oração aos bispos e padres através dos meios de comunicação e comungaram espiritualmente, alimentando a esperança de um dia poderem receber o corpo e sangue de Cristo novamente.  

“Nesta situação de pandemia, na qual nos encontramos vivendo mais ou menos isolados, somos convidados a redescobrir e aprofundar o valor da comunhão que une todos os membros da Igreja. Unidos a Cristo, nunca estamos sozinhos, mas formamos um único Corpo, do qual Ele é a Cabeça. É uma união que se alimenta com a oração e também com a comunhão espiritual à Eucaristia, uma prática muito recomendada quando não é possível receber o Sacramento”, afirmou o Papa Francisco, após a oração do Angelus de 15 de março.

ALIMENTO ETERNO

É certo que Jesus ressuscitado está presente na Igreja de diversas maneiras, na sua Palavra, na oração da Igreja – “onde dois ou três estão reunidos em Meu nome...” (Mt 18,20) –, nos pobres, nos doentes, nos prisioneiros, nos seus sacramentos, dos quais é o autor, e na pessoa do ministro ordenado que preside a missa. No entanto a doutrina católica ressalta que é sobretudo sob as espécies eucarísticas que o Senhor manifesta sua presença por excelência.

O ápice da participação na Eucaristia é a comunhão. É o próprio Jesus que convida: “Se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós” (Jo 6,53).

O principal fruto da comunhão eucarística é a união íntima com Cristo Jesus. “De fato, o Senhor diz: ‘Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em Mim e Eu nele’ (Jo 6,56). A vida em Cristo tem o seu fundamento no banquete eucarístico: ‘Assim como o Pai, que vive, me enviou, e Eu vivo pelo Pai, também o que me come viverá por Mim’ (Jo 6,57) ”, recorda o Catecismo da Igreja Católica (1396), que enfatiza, ainda, que a comunhão da “carne de Cristo Ressuscitado” conserva, aumenta e renova a vida da graça recebida no Batismo.

UNIÃO COM CRISTO

Santo Tomás de Aquino afirmou que “o efeito típico da Eucaristia é a transformação do homem em Cristo”. Já São Leão Magno destacou: “A participação do corpo e sangue de Cristo não faz outra coisa senão transformar-nos no alimento que tomamos”.

Santo Agostinho pôs na boca de Jesus estas palavras: “Não és tu que me transformarás em ti, como se dá com o alimento da tua carne, mas tu será transformado em mim”. E Cirilo de Jerusalém enfatizou que, por meio da Eucaristia, “nos tornamos concorpóreos e consanguíneos com Cristo”.

NA PRISÃO

Para muitas pessoas, esse período distante da Eucaristia é a oportunidade de tomar consciência do valor da comunhão sacramental para a vida espiritual e se unir a muitos cristãos que, por diversas razões, há muito tempo são impedidos de celebrar a Eucaristia.

Na história recente da Igreja, o Cardeal vietnamita Francisco Xavier Nguyen Van Thuan (1928-2002) é, sem dúvida, um dos maiores exemplos de amor à Eucaristia. Arcebispo coadjutor de Saigon, ele foi mantido prisioneiro pelo regime comunista durante 13 anos, dos quais nove foram em total isolamento. Mesmo assim, ele consegui celebrar a Eucaristia clandestinamente em sua cela com um pedaço de pão, três gotas de vinho e uma gota d’água na palma da mão.

O próprio cardeal vietnamita contou, em uma das meditações do retiro que pregou no Vaticano no jubileu do ano 2000, que, quando foi preso, em 1975, um angustiante pensamento apoderou-se dele:  “Poderei ainda celebrar a Eucaristia? No momento em que tudo veio a faltar, a Eucaristia passou a ocupar o primeiro lugar em meus pensamentos: o Pão da Vida”.

PÃO DA ESPERANÇA

Van Thuan recordou, ainda, que, em todas as épocas, especialmente em tempos de perseguição, a Eucaristia  foi sempre o segredo da vida dos cristãos, “o alimento das testemunhas, o pão da esperança”.

Papa Francisco sempre nutriu muita estima pelo exemplo dos chamados “cristãos escondidos” do Japão nos séculos XVI e XVII. Evangelizados por São Francisco Xavier, os católicos japoneses eram em torno de 300 mil em 1614, quando o cristianismo foi banido no país, os missionários foram expulsos e os fiéis foram forçados a escolher entre o martírio ou viver a fé clandestinamente.

Em 1873, o cristianismo deixou de ser proibido no Japão e, quando os sacerdotes retornaram ao país, encontraram grupos de cristãos que conservaram secretamente a fé por gerações e desejavam voltar a celebrar a Eucaristia. “Eram isolados e escondidos, mas eram sempre membros do povo de Deus, membros da Igreja”, afirmou o Papa Francisco, na Audiência Geral de 15 de janeiro de 2014.

CULTIVAR O AMOR

Na Encíclica Ecclesia de Eucharistia, São João Paulo II enfatizou que é conveniente cultivar continuamente na alma o desejo do sacramento da Eucaristia. “Daqui nasceu a prática da ‘comunhão espiritual’ em uso na Igreja há séculos, recomendada por santos mestres de vida espiritual”, afirmou o Santo Padre, recordando que Santa Teresa de Jesus escreveu: “Quando não comungais e não participais na missa, comungai espiritualmente, porque é muito vantajoso. [...] Deste modo, imprime-se em vós muito do amor de nosso Senhor”.

Santa Catarina de Sena temia que a comunhão espiritual não tivesse nenhum valor. “Jesus lhe apareceu em visão, com dois cálices na mão, e lhe disse: ‘Neste cálice de ouro ponho as tuas comunhões sacramentais e neste cálice de prata ponho as tuas Comunhões Espirituais. Estes dois cálices me são muito agradáveis’”, conta a Santa em seus escritos biográficos. 

São várias as orações de comunhão espiritual existentes na tradição católica. Nas suas missas diárias na Casa Santa Marta, o Papa Francisco tem convidado os fiéis que acompanham pelos meios de comunicação a fazerem a seguinte oração:

“Aos vossos pés, ó meu Jesus, me prostro e vos ofereço o arrependimento do meu coração contrito que mergulha no vosso e na Vossa santa presença. Eu vos adoro no Sacramento do vosso amor, desejo receber-vos na pobre morada que meu coração vos oferece. À espera da felicidade da comunhão sacramental, quero possuir-vos em Espírito. Vinde a mim, ó meu Jesus, que eu venha a vós. Que o vosso amor possa inflamar todo o meu ser, para a vida e para a morte. Creio em vós, espero em vós. Eu vos amo. Assim seja.”

LEIA TAMBÉM: 

Dom Carlos Lema: O que é a comunhão espiritual?

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Em tempos de pandemia, católicos são chamados a santificar o domingo em suas casas

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26 de março de 2020

Com as medidas preventivas para tentar conter a rápida disseminação do novo coronavírus, foram suspensas celebrações e eventos religiosos com a presença de fiéis. Em algumas partes do mundo, há católicos que, privados da participação na Eucaristia há semanas, ainda não sabem se poderão celebrar o Tríduo Pascal em suas comunidades. 
Diante dessa situação, os fiéis podem imediatamente se questionar: como cumprir o preceito religioso de guardar domingos e dias santos para o Senhor? 
Independentemente da emergência sanitária vivida na atualidade, já existiam situações que impedem os católicos de participar da missa aos domingos e demais dias de preceito. Basta imaginar as pessoas enfermas, debilitadas pela idade, encarceradas ou que vivem em um lugar onde não há sacerdotes para celebrar a Santa Missa todos os dias. 

DIA DO SENHOR

O Catecismo da Igreja Católica destaca que o domingo é chamado de “o Dia do Senhor”, pois foi nele que Jesus Cristo ressuscitou e deu início à nova criação. Ele se “distingue expressamente do sábado, ao qual sucede cronologicamente, a cada semana, e cuja prescrição ritual substitui, para os cristãos” (CIC,2175)”. 
“A Eucaristia do domingo fundamenta e sanciona toda a prática cristã. Por isso, os fiéis são obrigados a participar da Eucaristia nos dias de preceito, a não ser por motivos muito sérios (por exemplo, uma doença, cuidado com bebês) ou se forem dispensados pelo próprio pastor. Aqueles que deliberadamente faltam a esta obrigação cometem pecado grave”, continua o Catecismo (CIC, 2181). 
O Código de Direito Canônico ressalta, ainda, que, além de participar da missa aos domingos, os fiéis “devem se abster das atividades e negócios que impeçam o culto a ser prestado a Deus, a alegria própria do Dia do Senhor e o devido descanso da mente e do corpo” (Cân., 1247).

EXCEÇÕES

O mesmo Código, no entanto, diz que, por falta de um sacerdote ou por outra grave causa, se a participação na celebração eucarística se tornar impossível, como é o caso atual, recomenda-se que os fiéis “se dediquem à oração por tempo conveniente, pessoalmente ou em família, ou em grupos de família, de acordo com a oportunidade” (Cân., 1248 §2).
As missas transmitidas pelos meios de comunicação e mídias digitais não permitem uma participação plena do sacramento, mas possibilitam que o fiel se mantenha unido à comunidade eclesial e o ajuda a criar um ambiente de oração em família. 
São várias as maneiras de santificar o Dia do Senhor na impossibilidade de ir à missa. Nesta edição, o jornal O SÃO PAULO indica algumas. Essas sugestões podem ser tomadas separadamente ou serem associadas, de acordo com a realidade de cada família. 

PALAVRA DE DEUS

Ler em casa, individualmente ou preferencialmente em família, as leituras e o Evangelho do domingo corrente e, em seguida, fazer uma oração comum.

COMUNHÃO ESPIRITUAL

A prática da comunhão espiritual não se limita apenas a circunstâncias urgentes como a atual. A Igreja recomenda que os fiéis a façam quando estiverem impossibilitados de comungar sacramentalmente, por não estarem em estado de graça ou por não poderem participar da missa. 
Também é recomendado que seja feita ao longo do dia para manter viva no coração e na mente a graça da última comunhão feita e alimentar a esperança para a próxima comunhão. 
Existem algumas fórmulas conhecidas de comunhão espiritual que manifestam o desejo de se aproximar do Santíssimo Sacramento.  Eis algumas: 

"Eu quisera, Senhor, receber-Vos com aquela pureza, humildade e devoção com que Vos recebeu Vossa Santíssima Mãe, com o espírito e o fervor dos Santos.”

“Creio, ó meu Jesus, que estais presente no Santíssimo Sacramento. Amo-vos sobre todas as coisas e desejo-vos possuir em minha alma. Mas, como agora não posso receber-vos sacramentalmente, vinde espiritualmente ao meu coração. E, como se já vos tivesse recebido, uno-me inteiramente a vós; não consintais que de vós me aparte.” 

“Aos vossos pés, ó meu Jesus, me prostro e vos ofereço o arrependimento do meu coração contrito que mergulha no vosso e na Vossa santa presença. Eu vos adoro no Sacramento do vosso amor, desejo receber-vos na pobre morada que meu coração vos oferece. À espera da felicidade da comunhão sacramental, quero possuir-vos em Espírito. Vinde a mim, ó meu Jesus, que eu venha a vós. Que o vosso amor possa inflamar todo o meu ser, para a vida e para a morte. Creio em vós, espero em vós. Eu vos amo. Assim seja.”

LITURGIA DAS HORAS 

Considerada na Igreja  a oração comum e obrigatória dos clérigos e consagrados em geral, a Liturgia das Horas consiste no conjunto de orações, salmos, cânticos, leituras e preces recitado ao longo do dia em diferentes horas, compondo o Ofício Divino. Por meio dessa prática, é possível entrar em comunhão com toda a Igreja que recita o mesmo ofício em todo o mundo. 
As famílias reunidas em casa, segundo suas possibilidades, podem recitar uma das principais horas do Ofício – Laudes (manhã), Hora média (meio-dia) e Vésperas (tarde). Atualmente, existem aplicativos no celular ou sites pelos quais é possível acessar o textos.

TERÇO 

Por meio do Terço, é possível meditar os mistérios da vida de Jesus unido a Nossa Senhora. 
Além da simples recitação das orações, recomenda-se que, no início de cada mistério, seja lido o trecho da Bíblia correspondente ao que será contemplado. 
A oração pode ser concluída com a Ladainha de Nossa Senhora ou alguma antífona mariana. 

COMO SE CONFESSAR EM TEMPOS DE PANDEMIA? 

O isolamento causado pela pandemia também dificulta o acesso ao sacramento da Reconciliação. Por essa razão, a Santa Sé publicou uma nota, na sexta-feira, 20, com orientações sobre as confissões neste período de emergência sanitária. 
O texto da Penitenciaria Apostólica, assinado pelo Cardeal Mario Piacenza, ressalta que, mesmo no tempo de 
COVID-19, o sacramento da Reconciliação é administrado de acordo com a lei canônica universal, ou seja, ouvindo o penitente individualmente.
A nota também orienta os bispos a indicar aos padres e penitentes as atenções prudentes a serem adotadas na celebração individual das confissões, como a celebração em um local ventilado fora do confessionário, a adoção de uma distância conveniente, o uso de máscaras protetoras “sem prejuízo da atenção absoluta prestada à salvaguarda do sigilo sacramental e à discrição necessária”. 

CASOS EXTREMOS

O texto esclarece que, embora exista a possibilidade de absolvição coletiva de fiéis sem prévia confissão individual, essa não pode ser concedida “a menos que ocorra o perigo iminente de morte, não haja tempo suficiente para ouvir as confissões individuais dos penitentes ou uma necessidade séria, cuja consideração pertence ao bispo diocesano”. 
Além disso, a legislação canônica prevê que para que haja uma válida absolvição coletiva é necessário que o fiel manifeste a intenção de confessar, no devido tempo, os pecados graves individuais, que no momento não foi possível confessar. Para isso, os fiéis devem ser instruídos sobre os requisitos necessários para a validade da absolvição.

IMPOSSIBILIDADE 

A nota também orienta que, “onde os fiéis se encontravam na dolorosa impossibilidade de receber a absolvição sacramental, recorda-se que a contrição perfeita, vinda do amor de Deus amado acima de tudo, expressada por um sincero pedido de perdão (aquilo em que o penitente é atualmente capaz de expressar) e acompanhada pelo votum confessionis, ou seja, pela firme resolução de recorrer à confissão sacramental o mais rápido possível, obtém perdão dos pecados, até mortais”.
O Catecismo da Igreja define a contrição como “a tristeza da alma e o ódio pelo pecado cometido, juntamente com a decisão de não mais pecar” (CIC,1451). Ela é necessária para que uma confissão seja válida. 

CONTRIÇÃO PERFEITA

A contrição perfeita, a qual se refere a orientação da Penitenciaria Apostólica, é aquela que nasce “de um amor pelo qual Deus é amado acima de tudo” (CIC,1452) e cuja ofensa provoca profunda dor. Ainda segundo o Catecismo, “só esta forma de contrição obtém o perdão dos pecados graves antes de ir para a confissão”.
Existe, ainda, a chamada contrição imperfeita, também conhecida como atrição, que “nasce da consideração da indignidade do pecado ou do temor da condenação eterna e as outras penas que ameaçam o pecador” (CIC,1453). No entanto, embora seja suficiente para obter um perdão em uma confissão válida,  por si mesma, não obtém o perdão dos pecados graves para o caso destacado pela nota da Pentenciaria Apostólica. 
Na Carta Encíclica Dominum et vivificantem, de 1986, São João Paulo II afirmou que a conversão do coração humano é a condição indispensável para o perdão dos pecados. “Quando o Espírito da verdade, que ‘convence o mundo quanto ao pecado’, permite à consciência humana participar naquela dor, então, a dor da consciência torna-se particularmente profunda, mas também particularmente salvífica. E assim, mediante um ato de contrição perfeita, opera-se a conversão autêntica do coração”, disse o Santo Padre.

ORAÇÕES
Essa contrição interior é manifestada por um ato de contrição, que pode ser expresso por meio de uma oração espontânea ou por fórmulas e orações já conhecidas pela espiritualidade católica, que costumam ser feitas ao final de uma confissão. Veja algumas dessas orações: 

“Meu Deus, eu me arrependo, de todo o coração de todos meus pecados e os detesto, porque pecando não só mereci as penas que justamente estabelecestes, mas principalmente porque Vos ofendi a Vós, sumo bem e digno de ser amado sobre todas as coisas. Por isso, proponho firmemente, com a ajuda da vossa graça, não mais pecar e fugir das ocasiões próximas de pecar. Amém.“

“Senhor meu Jesus Cristo, Deus e Homem verdadeiro, Criador e Redentor meu, por serdes Vós quem sois, sumamente bom e digno de ser amado sobre todas as coisas, e porque Vos amo e estimo, pesa-me, Senhor, por Vos ter ofendido; pesa-me, também, por ter perdido o Céu e merecido o inferno. Mas proponho firmemente, com o auxílio de vossa divina graça e pela poderosa intercessão de vossa Mãe Santíssima, emendar-me e nunca mais Vos tornar a ofender. Espero alcançar o perdão de minhas culpas, por vossa infinita misericórdia. Amém.

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