NACIONAL

Jaison Antonio Barreto

‘O Brasil ocupa o segundo lugar no mundo em hanseníase’

Por Redação
18 de fevereiro de 2018

Jaison Antonio Barreto, responsável pelo Regional Sudeste da Sociedade Brasileira de Hansenologia, falou sobre a hanseníase e seu quadro no país

Luciana Barros/Governo do Tocantins

A Sociedade Brasileira de Hansenologia (SBH), entidade médica que completa 70 anos em 2018, responsável pela certificação dos médicos hansenologistas no País, alerta para o alto número de casos em menores de 15 anos, o que significa que a criança teve contato com o bacilo ainda muito nova, uma vez que a doença, que tem cura, leva de cinco a dez anos para se manifestar. 

Em 2016, a entidade lançou a campanha permanente “Todos Contra a Hanseníase”, que está sendo implantada em vários municípios brasileiros. No mesmo ano, o Ministério da Saúde oficializou o mês de janeiro e consolidou a cor roxa para as campanhas educativas de combate à doença. Nessa ocasião, a Pasta registrou 25.218 casos novos de hanseníase no Brasil, o que representa 12,23 casos novos para cada 100 mil habitantes: a maior taxa do mundo. 

Em entrevista à rádio 9 de Julho , o médico hansenologista Jaison Antonio Barreto, responsável pelo Regional Sudeste da SBH, destacou que no Brasil são diagnosticados de 20 a 30 mil novos casos de hanseníase por ano. Ele também ressaltou que muitos médicos não aprendem sobre essa doença na faculdade e, por isso, têm dificuldade para identificar o diagnóstico. 

Até a década de 1980, as pessoas acometidas pela doença, antes chamada de “lepra”, eram excluídas do convívio social e condenadas ao confinamento em colônias. Hoje, o tratamento pode ser feito em casa por meio de medicamentos fornecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com acompanhamento médico nas unidades básicas de saúde. O tratamento dura, em média, entre seis meses e um ano.

 

O QUE É A HANSENÍASE?

Jaison Antonio Barreto – A hanseníase é uma doença infectocontagiosa que, apesar de ter uma baixa contagiosidade, é extremamente importante dentro do ambiente familiar. A pré-disposição genética dentro da hanseníase é o fator mais importante para que o indivíduo fique doente. A maioria das pessoas que tem contato com o bacilo não fica doente, mas quem possui parentesco com alguém que teve a doença tem uma chance maior de desenvolvê-la. Essas pessoas precisam ser examinadas, observarem o seu corpo para ver se há manchas na pele, dormência, câimbra, formigamento, porque é uma doença silenciosa, que se adquire normalmente na infância. Você pode pegar dos pais, dos avós, mas demora muitos anos para ter manifestações que sejam facilmente diagnosticadas.

 

COMO ESTÁ A SITUAÇÃO DA DOENÇA NO BRASIL?

No Brasil, são diagnosticados normalmente de 20 a 30 mil novos casos por ano. É uma doença extremamente comum. O Brasil é o país que ocupa o segundo lugar no mundo em matéria da hanseníase. Nós temos uma população desfavorecida muito grande. É uma doença ligada drasticamente a 70% de uma classe social desfavorecida. São pessoas que normalmente não têm acesso à saúde de qualidade e que estão em um nível socioeconômico cultural muito baixo. Elas não procuram assistência médica na fase inicial, que é facilmente confundida com o famoso “pano branco”. Quando uma criança apresenta sintomas de “pano branco” em uma área onde há hanseníase ou que tenha um parente com hanseníase, é preciso verificar se não se trata de uma lesão inicial de hanseníase. O problema é que muitos médicos não aprendem sobre hanseníase na faculdade. Eu me formei na Universidade Federal de Santa Catarina e nem sabia que a hanseníase existia no Brasil. Como pensar no diagnóstico se nós achamos que não existe? Além do mais, a medicação é gratuita e está disponível no SUS. 

 

COMO É FEITO O DIAGNÓSTICO?

Um formigamento, uma câimbra, uma mancha que não coça, não arde, não queima, não descasca, não dói, pode ser hanseníase. É importante que a pessoa pense no diagnóstico, principalmente o médico. Não basta esperar que um exame laboratorial faça o diagnóstico, pois 80% dos laboratórios no Brasil não sabem fazer o processamento do material; muitas vezes, nem sabem fazer uma biópsia e o paciente fica sem diagnóstico. Ele vai ao médico, que pede o exame, e o exame vem com falso negativo. Isso é a regra, não é a exceção no nosso País. Isso acontece porque não é ensinado na pós-graduação para os profissionais sobre como fazer o diagnóstico de hanseníase. Por parte do governo, deve haver treinamento, capacitação de profissionais. Tem de haver pelas universidades treinamento e dizer: nós temos hanseníase no Brasil. Câimbra, formigamento, dormência podem ser diabetes, tireoide, problemas na coluna, podem ser muitas coisas, mas é preciso pensar também na possibilidade de ser hanseníase; principalmente se junto com esses sintomas surgirem manchas que não incomodam. Quando paciente tem essa informação, deve perguntar: “Doutor, isso não pode ser hanseníase?”

 

COMO A HANSENÍASE EVOLUI?

Nas crianças, geralmente, ela parece um pano branco, porém, sem coceira ou ardência. A medida que o indivíduo vai envelhecendo, surgem outras manifestações. A doença sai das terminações nervosas da pele e começa a entrar nos nervos, que começam a ficar inflamados, engrossados, e isso vai causando progressivamente a diminuição da sensibilidade ao calor, ao frio, depois, a perda de sensibilidade a dor e, por último, ele não consegue nem encostar na pele. Após dez, 15, 20 anos, começam as deformidades, pois atinge a inervação motora. Essa é uma sequela da hanseníase. O indivíduo perde a função do membro e a sensibilidade e, por isso, se machuca sem perceber. Portanto, não é que a hanseníase faz cair os pedaços da pessoa, é que ela se machuca e não percebe. Muito parecido com o que acontece no diabetes, as amputações que acontecem se devem a pessoa se machucar e não perceber e, quando se dá conta, já está com a doença muita avançada.

 

QUAIS AÇÕES ESTÃO PREVISTAS PARA A CONSCIENTIZAÇÃO DAS PESSOAS?

Nós estamos, no Brasil inteiro, orientando e fazendo campanhas com a população em busca de casos e tornando a doença mais conhecida com a ajuda das mídias. A Sociedade Brasileira de Hansenologia e também a Sociedade Brasileira de Dermatologia vão começar a fazer a campanha junto conosco. Outras entidades também devem entrar nesta campanha.

 (Colaborou: Cleide Barbosa/rádio 9 de Julho)
 

As opiniões expressas na seção “Com a palavra” são de responsabilidade do entrevistado e não refletem, necessariamente, os posicionamentos editoriais do jornal O SÃO PAULO.
 

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