SÃO PAULO

COM A PALAVRA

A ideologia de gênero é uma proposta política sem embasamento médico- científico

Por Cleide Barbosa (ESPECIAL PARA O SÃO PAULO)
13 de setembro de 2019

José de Lima Oliveira Junior

Em reação do Projeto de Lei 491/2019, de Érica Malunguinho (PSOL), cujo artigo 5o prevê que “A Rede Estadual de Saúde deverá ofertar, nos equipamentos estaduais a serem referenciados, a terapia hormonal, no âmbito do Processo Transexualizador”, a deputada estadual de São Paulo, Janaína Paschoal (PSL) apresentou uma emenda visando preservar crianças e adolescentes dos danos advindos de tais terapias e da chamada “cirurgia de redesignação sexual” nas redes estadual e privada de saúde.


Na justificativa da emenda ao Projeto, Janaína afirma que esse tipo de terapia “já vem sendo questionada nos países em que tem lugar, justamente por não permitir a esses meninos e meninas sequer vivenciar os efeitos dos hormônios inerentes ao seu próprio sexo biológico”. 


Atualmente, o Projeto de Lei de Érica Malunguinho, bem como a emenda de Janaina Paschoal seguem na Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Em caso de aprovação, as propostas deverão ser analisadas em outras duas comissões antes de serem votadas no legislativo.


Em entrevista à rádio 9 de Julho, José de Lima Oliveira Junior, médico especialista em cirurgia cardiovascular pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular, Especialista em Transplantes de Coração, fala sobre o papel da ciência e da comunidade científica no debate sobre ideologia de gênero. Reproduzimos a seguir os principais trechos da entrevista.

 

Existe algum embasamento cientifico para a expressão “ideologia de gênero”?
José de Lima Oliveira Junior – Não. Não existe nenhum embasamento científico que dê suporte a tentativa de popularização e de estabelecimento dessa proposta ideológica como nós temos visto, não só no Brasil, mas em diversos países do mundo. Ideologia de gênero nada mais é do que um conjunto de ideias, pensamentos e doutrinas, de um determinado grupo político, criada para orientar ações sociais. A proposta da ideologia de gênero, nada mais é do que a destruição que temos do conceito judaico-cristão de família. 

 

Esse tema tem sido muito discutido no âmbito da política, principalmente na área da Educação. E a Medicina, o que diz a respeito?
Na ordem científica natural, parte-se de uma dúvida, de uma proposta terapêutica diagnóstica e se faz a análise científica, a valoração estatística para, depois, poder comprovar ou não se aquele tratamento ou diagnóstico tem validade, se é a melhor forma de tratar uma pessoa. Quem trabalha com ideologia de gênero subverte a ordem natural:  eles partem de um sofisma, que não tem embasamento científico nenhum, alicerçado exclusivamente na opinião de “especialistas” que tem uma visão ideológica, e aí tentam, retrospectivamente, encontrar um embasamento científico que lhe dê sustentação.  


A metodologia cientifica não funciona dessa forma, ela faz justamente o caminho contrário. A ideologia de gênero não tem nenhum trabalho científico que mostre a melhor forma de abordar uma pessoa que tem um transtorno de imagem de gênero, ou incongruência de gênero, como a Organização Mundial de Saúde (OMS) ou o Conselho Federal de Medicina (CFM) têm classificado essas alterações, essas doenças. Não se pode basear qualquer proposta terapêutica, única e exclusivamente nas opiniões. A medicina é pautada por aquilo que chamamos de evidencia científica. Então, são necessárias pesquisas e trabalhos, realizados em diversos países, com diversas populações, e esses resultados têm que ser replicados para que se possa criar uma conduta, uma nova proposta de tratamento, de modo a colocar isso nas diretrizes médicas. Tudo que vem sido colocado ultimamente tem que ser confrontado com argumentos técnicos, com a medicina baseada em evidências, para mostrar qual a melhor forma não só de tratar, mas de cuidar das pessoas que buscam algum tipo de ajuda, porque essa é a obrigação do profissional de saúde.
 
Sobre essa questão específica da  terapia hormonal, que  inclusive é tema de um projeto de lei em São Paulo, o senhor tem conhecimento de quais seriam as consequências disso?
Cerca de 90% das pessoas que apresentam essa alteração, =ao passarem a puberdade e atingirem a fase adulta, vão retomar o reconhecimento do seu sexo biológico, sem nenhum transtorno psicológico, sem nenhuma necessidade desses procedimentos invasivos, seja com bloqueio hormonal, que é realizado na pré-adolescência, seja com a indução hormonal de características do sexo oposto, que se faz depois da passagem da  adolescência,  ou mesmo com a mutilação que eles chamam de ressignificação sexual. Considerando a diferença de sexos, temos que essa recuperação natural, sem nenhum transtorno psicológico, se dá em 88% dos homens que apresentam a incongruência de gênero, e em 98% – ou seja, quase a totalidade – das mulheres. Esses procedimentos não podem ser realizados porque não há embasamento cientifico de que esse seja o melhor tratamento para essas pessoas. Se é uma doença da qual, ao longo do tempo, a grande maioria dessas pessoas vai se recuperar e viver de forma saudável, sem essas intervenções mutilantes, qual o propósito de se realizar esse tipo de intervenção nessas pessoas?

Existe algum influenciador econômico no incentivo a essas propostas terapêuticas, uma vez que, se iniciado, esse tipo de tratamento se estenderia para o paciente por toda uma vida? 
Isso é fundamental. Quando se faz essa análise para propor qualquer tratamento novo, com o surgimento de qualquer novo medicamento, de qualquer tratamento cirúrgico, todo e qualquer tipo de viés econômico, financeiro tem que ser deixado de lado. Quem trabalha com pesquisa científica sabe, obrigatoriamente, que uma das primeiras coisas que tem que preencher é de que se há ou não algum patrocínio de alguma indústria ou laboratório no seu trabalho científico. Então, quando se submete um grupo de pessoas, a um tratamento ao longo da vida, atendimento ambulatorial e procedimentos cirúrgicos que, na verdade, são mutilações, deve-se estar atento, sob o ponto de vista ético, pra analisar todos os possíveis resultados científicos que vão ditar condutas. Porque até hoje não há nenhuma evidência científica que essas crianças possam se beneficiar desses procedimentos que são realizados. O que nós sabemos sim é que todas essas crianças mantidas nesse tratamento tem um risco muito aumentado de desenvolver hipertensão ao longo de suas vidas, embolia pulmonar, com morte súbita como potencial consequência, uma chance maior, se comparada ao resto da população, de ter Acidente Vascular Cerebral (AVC), com todas as possíveis sequelas e riscos de morte, e de terem doenças oncológicas. Hoje, a expectativa de vida das crianças submetidas ao “tratamento” de bloqueio e indução hormonal e a cirurgia mutilante de ressignificação sexual é 25 anos menor do que as crianças não submetidas ao mesmo procedimento. As poucas evidências científicas que temos a respeito do assunto são muito claras: não se deve submeter as crianças a esse tipo de coisa.

Como a ideologia de gênero deve ser tratada?
A ideologia de gênero deve ser tratada como uma proposta política que não encontra embasamento médico científico. Na minha opinião, tem que ser combatida. É como se você pegar uma pessoa que tem um quadro gripal e em vez de lhe prescrever sintomáticos e repouso, submetê-la a um transplante de pulmão. Se lhes for dada suporte psicológico, grande parte daquelas pessoas vão passar por esse transtorno de forma transitória e vão retomar sua vida de forma saudável. Mas se você submeter a um procedimento invasivo e irreversível, vai fazer com que essa pessoa carregue os traumas disso para o resto da vida.

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