VATICANO

Papa Francisco

Sínodo: o Espírito Santo deve orientar a missão da Igreja na Amazônia

Por José Mariano
09 de outubro de 2019

Entre os dias 6 e 27, no Vaticano, padres sinodais se reúnem com Papa para refletir sobre novos caminhos para a evangelização na Pan-Amazônia

Fotos: Vatican Media

O fogo do Espírito Santo, e não aquele “ateado por interesses que destroem”, é o que orienta a missão da Igreja presente na Amazônia. Assim falou o Papa Francisco, durante a missa de abertura da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, no domingo, 6.
Citando o apóstolo São Paulo, o Papa lembrou que todo dom que vem de Deus precisa ser “reavivado”, ter a sua chama sempre acesa. Também no episódio do Antigo Testamento em que Moisés conversa com Deus por meio de um arbusto ardente, ali se vê o fogo do Espírito e da missão.


Por isso, no caso da Amazônia, o fogo que vem do amor de Deus é o que realmente importa, e não o fogo da ganância e da destruição, conforme disse o Papa. 


“O fogo ateado por interesses que destroem, como aquele que recentemente devastou a Amazônia, não é aquele do Evangelho”, declarou, pois o fogo que vem de Deus se alimenta com a partilha e não com lucros.


“É fogo de amor que ilumina, aquece e dá vida, não o fogo que destrói e devora. Quando, sem amor e sem respeito, devoram-se povos e culturas, não é o fogo de Deus, mas do mundo”, alertou o Santo Padre.

RISCO DAS IDEOLOGIAS
Além disso, durante a primeira sessão do Sínodo, na segunda-feira, 7, Francisco recordou que a mensagem do Evangelho é fruto de uma verdadeira relação com Deus e com os outros, e deve ser apresentada por meio de um diálogo sincero. 


“Quantas vezes o dom de Deus não foi ofertado, mas imposto; quantas vezes houve colonização, em vez de evangelização! Deus nos preserve da avidez dos novos colonialismos”, disse.


Esses “novos colonialismos”, nas palavras do Papa, procuram apagar as diferenças e tornar tudo “homogêneo” – um risco que ele vê muito presente na Amazônia. Francisco afirmou também que as ideologias que procuram apagar as diferenças ameaçam a riqueza cultural dos povos e a biodiversidade na floresta.


Por isso, Francisco voltou a falar sobre a necessidade de os padres sinodais falarem com liberdade e escutarem com humildade – a chamada parresia, palavra que vem do grego –, algo que ele tem sempre recomendado nos encontros com bispos e lideranças pastorais.

PRUDÊNCIA 
Um dos pontos centrais do Sínodo é a questão da “inculturação da fé”, ou seja, encontrar maneiras para que a mensagem do Evangelho seja aplicada de forma compatível com as culturas locais, tanto nas práticas quanto nos rituais. Para isso, diz o Papa, é preciso prudência.

Mas, ao mesmo tempo, é necessário audácia, encarando a realidade sem medo de mudar.


“Aproximamo-nos dos povos amazônicos na ponta do pé, respeitando sua história, suas culturas, seu estilo do bom viver, no sentido etimológico da palavra, não no sentido social que tantas vezes lhe damos”, afirmou Francisco, defendendo a identidade das culturas indígenas. “Os povos possuem identidade própria, sabedoria própria, consciência de si, os povos têm um sentir, uma maneira de ver a realidade, uma história.”

JESUS CRISTO É SEMPRE NOVO
Relator-geral do Sínodo, o Cardeal Cláudio Hummes, em sintonia com o Papa Francisco, observou que a Igreja não precisa “ter medo do novo”.


Mantendo-se radicada na tradição, embasada em Jesus Cristo, é possível abrir “novos caminhos para a evangelização na Amazônia”, que é o tema central do Sínodo. “Cristo é sempre o novo. Ele é sempre o mesmo, o novo, ‘ontem, hoje e sempre’ (Hb 13,8), o novo”, comentou Dom Cláudio.


O Arcebispo Emérito de São Paulo e atual Presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam) será o principal responsável por coordenar a redação dos documentos do Sínodo. Dom Cláudio fez um resumo dos temas presentes no documento que orienta os trabalhos, o Instrumentum Laboris. 

MISSÃO DA IGREJA
“A missão da Igreja hoje na Amazônia é o núcleo central do Sínodo”, disse Dom Cláudio. “É um Sínodo da Igreja e para a Igreja. Não uma Igreja cerrada em si mesma, mas integrada na história e na realidade do território – no caso, a Amazônia – atenta aos gritos de socorro e às aspirações da população e da ‘Casa Comum’ [a criação]”, acrescentou o Cardeal Hummes.


O diálogo que se quer propor no Sínodo também é “inter-religioso e intercultural”, aberto ao encontro com representantes de outras religiões, cientistas e governos. Por isso, o Sínodo vai ouvir também participantes com esse perfil.


Na terça-feira, 8, o Cardeal Pedro Ricardo Barreto Jimeno, do Peru, afirmou em coletiva de imprensa que a Igreja de hoje se mantém em comunhão com aquela do passado, mas com o tempo adaptou e atualizou suas práticas. “O anúncio do Evangelho é um convite especial. Tivemos luzes muito fortes, martírio de religiosos, sacerdotes e leigos que defendem a vida”, recordou.


Ele notou que, em muitos lugares, a Igreja é a única instituição aberta para ouvir os povos indígenas. “A gente não sai da Amazônia mesmo quando os empresários vão embora com suas maletas”, comentou, citando fala do Papa Francisco durante a Jornada Mundial da Juventude de 2013.

ECOLOGIA INTEGRAL
A proposta da chamada “ecologia integral”, sobre a qual fala o Papa Francisco na Encíclica Laudato Si’ (Louvado Seja), aparece de diferentes formas no Sínodo. Conforme explica Dom Cláudio, não existe uma separação entre as questões sociais e as questões ambientais, mas sim questões “socioambientais”. Essas questões estão interligadas, assim como a natureza, a vida na floresta, os povos e a fé.


“Igreja e ecologia integral no território estão interligados. Trata-se de uma Igreja consciente de que sua missão religiosa, em coerência com sua fé em Jesus Cristo, inclui necessariamente ‘o cuidado da Casa Comum’”, disse o Cardeal, no seu discurso de abertura. “Tal interligação demonstra também que o grito da terra e o grito dos pobres na região é o mesmo grito. A vida na Amazônia talvez nunca tenha estado tão ameaçada como hoje.”


A vida espiritual não está isolada da vida no mundo, conforme explicou Dom Cláudio, algo que fica evidente nos escritos e orações de São Francisco de Assis, santo que inspirou a Encíclica Laudato Si’ e que é citado frequentemente nas conversas do Sínodo.

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