INTERNACIONAL

Solidariedade

Seminário na Alemanha abre as portas para as pessoas em situação de rua

Por Nayá Fernandes (Especial para O SÃO PAULO)
13 de abril de 2020

Durante duas horas por dia, os mais vulneráveis têm a possibilidade de usar os banheiros, tomar banho e se alimentar no local na cidade de Colônia

Seminário em Colônia, na Alemanha, acolhe pessoas em situação de rua

Silvio Vallecoccia, 44, está se preparando, para, junto a esposa e dois amigos, ler e compartilhar o Evangelho em uma chamada de vídeo on-line. Depois da partilha bíblica, os amigos jantaram juntos. Era domingo, 5 e, embora cada casal estivesse em sua própria casa, eles assim partilharam a vida em comunidade.

Silvio mora com a esposa em Colônia, na Alemanha, e ambos trabalham para a Arquidiocese. Há alguns dias, a cidade alemã, que foi sede da Jornada Mundial da Juventude em 2005, ganhou as páginas dos jornais em todo mundo quando o Cardeal Rainer Maria Woelki decidiu abrir o seminário para dar auxílio às pessoas em situação de rua.

Silvio é italiano e mora na Alemanha há 15 anos. Ele atua no Centro de Eventos Maxhaus, na cidade de Dusseldorf, um antigo mosteiro que tornou-se um local para realização de concertos, cursos e exercícios espirituais.

Em entrevista ao O SÃO PAULO, Silvio falou sobre a acolhida das pessoas em situação de rua no Seminário e como a Arquidiocese de Colônia, bem como a cidade, que tem uma população estimada em 1 milhão de habitantes, tem enfrentado a pandemia do novo coronavírus.

A rotina na cidade de Colônia mudou muito devido à Covid-19?

Silvio Vallecoccia – Sim. Desde 15 de março, foram tomadas as primeiras disposições para fechar atividades culturais e lugares de encontro entre as pessoas. Em seguida, foram proibidas reuniões, partidas de futebol, cinemas e museus etc. As únicas coisas que restam abertas hoje são os supermercados, as farmácias e tudo o que possa ser útil para bens de primeira necessidade. Não se pode sair em mais de duas pessoas ou, no máximo, membros da mesma família. Grupos de amigos, colegas ou familiares distantes não podem se reunir ou sair juntos.

As pessoas tem aderido bem a essas recomendações?

Sim. Estamos vivendo dias muito difíceis, pois aqui inicia a primavera e as temperaturas começaram a subir, quando, normalmente, as pessoas saem mais e aproveitam os parques e praças. As pessoas, porém, estão cumprindo as determinações do governo. Respeita-se a distância entre as pessoas e os supermercados e negócios abertos estão muito organizados.

Como a Igreja em Colônia se organizou em relação às missas, celebrações e outras atividades eclesiais?

As celebrações litúrgicas não estão sendo mais presenciais. As comunidades estão transmitindo pela internet as missas, momentos de oração e encontros formativos. Há, também, muitas iniciativas entre as pessoas para continuar se encontrando virtualmente. Além disso, todas noites, às 21h, abrem-se as janelas e se aplaude as pessoas que estão nos hospitais ou nas ruas trabalhando. É um momento de encontro, troca entre as pessoas.

E qual a realidade das pessoas em situação de rua em Colônia?

Temos aqui cerca de 7 mil pessoas em situação de rua e, devido à restrição de circulação, as pessoas estão sem possibilidade de ganho. Isso porque elas recolhiam plásticos e latinhas nas ruas, por exemplo, e os trocavam no supermercado por comida e abrigo. Obviamente não havendo pessoas nas ruas, não há mais este tipo de ganho. Com o fechamento dos restaurantes e outros locais, há poucos banheiros públicos disponíveis.

Como a Igreja e as pessoas em geral viram a atitude do Cardeal de abrir o seminário para as pessoas em situação de rua? E como está acontecendo esta acolhida?

A decisão do Cardeal de abrir o seminário foi muito bem vista por todos, sobretudo pelos meios de comunicação, que divulgaram muito a notícia. As pessoas acolhidas não irão dormir no seminário, pois, neste caso, estão sendo acolhidas e ajudadas por instituições como a Cáritas ou outras entidades não religiosas. O seminário é aberto por duas horas ao dia. Das 13h às 14h fica aberto para as mulheres e das 14h às 15h para os homens. As pessoas tem a possibilidade de usar os banheiros, tomar banho e recebem um prato de comida. A previsão é de que se acolha de 100 a 150 pessoas por dia. No sábado, 4, 80 pessoas foram acolhidas. Li recentemente, em um jornal local, o testemunho de José (não me recordo o sobrenome). Ele falou que não pode trabalhar em casa, pois não tem casa e que no Seminário, além de receber um prato quente de comida, pode fazer sua higiene diária, pois não tem lugares com água corrente para tomar banho ou mesmo lavar as mãos. Ele reconheceu que o serviço oferecido pelo seminário está fazendo muita diferença em sua vida.

Você participa dessa iniciativa? Poderia falar sobre sua experiência.

Sim. Minha esposa e eu nos disponibilizamos para trabalhar como voluntários, sobretudo durante a semana da Páscoa. A maior parte dos voluntários são jovens estudantes e os próprios seminaristas e estudantes de Teologia. O Cardeal acompanha tudo de perto e coordena todo o trabalho. Importante ressaltar que todas as medidas de higiene estão sendo tomadas, como uso de máscaras e luvas. Acredito que crer em Deus é algo que se vive no interno da comunidade, na liturgia, no anúncio e nas obras concretas. A ação de abrir o Seminário é muito bonita, pois mostra uma Igreja atenta a todos. Recentemente, uma freira franciscana, que colabora na acolhida das pessoas no Seminário, falou que tem vivido uma experiência diferente de comunidade junto às pessoas em situação de rua.

 

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