SÃO PAULO

DANIEL GOMES

Mapa da Desigualdade revela múltiplos desafios da capital

Por Daniel Gomes
16 de novembro de 2019

MELHORIAS EM SAÚDE, ‘VAZIOS CULTURAIS’ E DIFERENÇAS NA IDADE AO MORRER CHAMAM A ATENÇÃO

Olhar as desigualdades da capital paulista não apenas a partir das questões de renda é um dos propósitos do Mapa da Desigualdade, apresentado anualmente pela organização sem fins lucrativos Rede Nossa São Paulo (nossasaopaulo.org.br). 
Com 53 indicadores referentes à população, meio ambiente, segurança viária, direitos humanos, habitação, saúde, educação, cultura, esporte, trabalho e renda, o Mapa da Desigualdade 2019, lançado no começo deste mês, permite verificar os gargalos em serviços e equipamentos públicos nos 96 distritos da cidade e pode ajudar na definição das políticas públicas. 
Elaborado com base em dados fornecidos pela Prefeitura de São Paulo, o Mapa traz ainda o chamado “Desigualtômetro”, que afere a distância entre o melhor e o pior indicador. De acordo com Carolina Guimarães, coordenadora da Rede Nossa São Paulo, dos 37 indicadores analisados no “Desigualtômetro”, em 20 houve aumento das desigualdades, em 15 se verificou diminuição e dois permaneceram iguais ao aferido em 2018.

VIVE-SE MENOS NA CIDADE TIRADENTES
Um morador da Cidade Tiradentes (zona Leste) vive 11 anos a menos que a média da população da cidade: 57,3 anos ante 68,7 anos. Já em Moema (zona Sul) registrou-se a maior média, 80,6 anos. 
Ao O SÃO PAULO, Carolina mencionou um dado que ajuda a explicar a diferença entre esses distritos: na Cidade Tiradentes morreram 67 pessoas de até 15 anos de idade; em Moema, quatro. “Na Cidade Tiradentes, há um percentual elevado de mortalidade infantil, além de problemas de infraestrutura. Pensar nessas complexidades ajuda a entender os resultados. Por exemplo: não se investe o necessário em saneamento básico, pois isso não dá retorno imediato ao setor público ou ao setor privado, mas este é um investimento com resultados em longo prazo, que eleva tanto a expectativa de vida quanto a qualidade de como se vive”, explicou. 

TRABALHO E RENDA
A Cidade Tiradentes também é a lanterna quando o assunto é o índice de empregos formais, uma realidade para apenas 0,2% da população economicamente ativa neste distrito. Esse indicador é 247 vezes inferior ao registrado na Barra Funda (zona Oeste), em que 59,2% da população têm emprego formal. 
Na avaliação de Carolina, o poder público e as empresas podem ajudar a gerar oportunidades se estiverem atentos às realidades locais. “Marsilac (zona Sul), por exemplo, é um lugar com muita área verde, mas não há emprego. Promover o ecoturismo poderia ser uma alternativa”, analisou. “Diferentes setores precisam pensar como, a partir dos ativos que têm, podem conseguir soluções, porque, devido à desigualdade, há um impacto tanto social quanto econômico”, complementou.

SAÚDE: MELHORIAS E CONTRASSENSOS
Em números gerais, o atendimento de saúde apresentou melhorias no comparativo entre 2018 e 2019: o tempo médio de espera para consulta com um clínico geral caiu de 45,3 dias para 19,3 dias. Em relação às equipes da Estratégia de Saúde da Família, a redução foi ainda maior: de 20,7 dias para 4,4 dias. 
No entanto, há contrassensos. Marsilac, onde a quantidade de Unidades Básicas de Saúde (UBSs) é a melhor da cidade (3,6 para cada 10 mil habitantes), está na dianteira no índice de mortalidade infantil (24,6 para cada mil crianças nascidas vivas). Outro dado que chama a atenção é que a Vila Nova Cachoeirinha (zona Norte) lidera o índice de pré-natal insuficiente (31,9% das gestantes fizeram menos que as sete consultas recomendadas), embora haja no distrito um hospital maternidade municipal. 

DIFERENÇAS NA EDUCAÇÃO
Em dois indicadores, em especial, houve melhorias nos valores médios em relação a 2018: o índice de matrículas nas creches municipais aumentou de 41,1 para 46,7; e o tempo de espera por uma vaga caiu de 129,7 dias para 106,9 dias. No entanto, as diferenças entre os distritos são consideráveis: enquanto em Guaianases (zona Leste) essa espera dura, em média, 18,5 dias, na Vila Andrade (zona Sul), é de 260,9 dias, ou seja, 14 vezes maior. 
Foi registrada uma pequena retração no percentual de matriculados na pré-escola (de 41,3% para 40,1%), bem como no ensino básico da rede pública (de 59,9% para 57,3%). 

TRÂNSITO E VIOLÊNCIA NA REGIÃO CENTRAL
O índice mais elevado de violência contra a mulher foi registrado na Sé: 803,9 casos para cada 100 mil habitantes (803,9/100 mil). Esse distrito também está na dianteira dos casos de feminicídio, 8,4/100 mil, e de registros de racismo e injúria racial, 13/100 mil. 
A segurança viária também preocupa a Sé, que tem o maior índice de mortes no trânsito (30,6/100 mil) e de atropelamentos (21,4/100 mil). Na Barra Funda, um distrito próximo à região central, foram registrados os mais elevados índices de acidentes com bicicleta (31,8/100 mil) e de atropelamentos (329,9/100 mil).

VAZIOS CULTURAIS 
O Mapa da Desigualdade revela um “vazio cultural” em muitos distritos da cidade. Não há equipamentos públicos de cultura em 23 distritos, museus em 47, teatros em 42, cinemas em 54, salas de shows e de concertos em 52, acervo de livros para adultos em 44 e acervo de livros infantojuvenil em 45.
 “Há muitos distritos com zeros, mas há uma cultura periférica, não formalizada, que muitas vezes ocupa espaços que são privados ou públicos, mas que não consegue financiamento, pois há entraves para que seja oficializada”, ponderou Carolina. 

ENCAMINHAMENTOS 
A coordenadora da Rede Nossa São Paulo assegurou que tem buscado respostas das secretarias municipais a respeito dos indicadores mostrados no Mapa da Desigualdade 2019, bem como tentado agendar reuniões com os secretários, além de buscar a realização de uma audiência pública para tratar de questões relacionadas aos direitos humanos.
“Pensar na desigualdade nas políticas públicas é um tema ainda muito pontual. Há alguns fomentos na periferia para equipamentos públicos. No entanto, é preciso um trabalho conjunto de muitas secretarias, com o orçamento cruzado, para se conseguir abordar as deficiências, que estão relacionadas a uma série de fatores. Os problemas da cidade são muito complexos e requerem investimentos de longo prazo. Não estamos falando de manutenção, de custeio, mas de investimento”, concluiu. 

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