NACIONAL

Festa da Divina Misericórdia

Indulgências: participação dos benefícios da redenção de Cristo

Por Fernando Geronazzo
18 de abril de 2020

Prática espiritual antiga da Igreja é expressão da riqueza da misericórdia divina na vida dos cristãos

Reprodução da pintura “A Entrega das Chaves a São Pedro”, de Pietro Perugino, na Capela Sistina

Neste período de pandemia, o tema das indulgências ganhou destaque entre os católicos e curiosidade entre os que têm uma ideia distante do real significado dessa antiga prática da Igreja de grande valor espiritual para a vida dos fiéis.

No dia 27 de março, o mundo acompanhou a histórica oração do Papa Francisco pelo fim da pandemia na Praça São Pedro, vazia, onde concedeu, no final, a bênção Urbi et Orbi (à cidade de Roma e ao mundo) com o Santíssimo Sacramento, por meio da qual concedeu aos fiéis a possibilidade de obter a indulgência plenária. O mesmo aconteceu no domingo de Páscoa, 12, quando conferiu novamente essa bênção, já tradicional nesta data, assim como no dia de Natal.

Dias antes, a Santa Sé publicou um decreto por meio do qual concede a possibilidade de obter indulgência plenária aos doentes com a COVID-19, assim como aos profissionais da saúde e familiares que colocam sua vida em risco para cuidar dos infectados.

O QUE É?

Ao contrário do que alguns meios de comunicação erroneamente noticiaram, as indulgências concedidas pelo papa não são o “perdão total dos pecados”, algo que só pode ser obtido por meio da absolvição sacramental na Confissão.

A doutrina da Igreja ensina que a indulgência é “a remissão, diante de Deus, da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa, que o fiel, devidamente disposto e em certas e determinadas condições, alcança por meio da Igreja”, como explica do Manual das Indulgências, da Penitenciaria Apostólica, tribunal da Santa Sé responsável pelas questões referentes ao foro interno, como o sacramento da Reconciliação e as indulgências.

“Apesar do perdão, carregamos na nossa vida as contradições que são consequência dos nossos pecados. No sacramento da Reconciliação, Deus perdoa os pecados, que são verdadeiramente apagados; mas o cunho negativo que os pecados deixaram nos nossos comportamentos e pensamentos permanece”, explicou o Papa Francisco, na bula Misericordiae vultus, na proclamação do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, em 2015.

O Pontífice acrescentou que a misericórdia de Deus por meio da Igreja, “alcança o pecador perdoado e liberta-o de qualquer resíduo das consequências do pecado, habilitando-o a agir com caridade, a crescer no amor em vez de recair no pecado”.

“A indulgência é experimentar a santidade da Igreja que participa em todos os benefícios da redenção de Cristo, para que o perdão se estenda até as últimas consequências aonde chega o amor de Deus”, completou o Santo Padre.

CONSEQUÊNCIAS DO PECADO

O Catecismo da Igreja Católica explica que, para entender essa prática da Igreja, é preciso compreender que o pecado tem uma dupla consequência na vida da pessoa.

“O pecado grave priva-nos da comunhão com Deus e, portanto, torna-nos incapazes da vida eterna, cuja privação se chama ‘pena eterna’ do pecado. Por outro lado, todo o pecado, mesmo venial, traz consigo um apego desordenado às criaturas, o qual precisa ser purificado, quer nesta vida quer depois da morte, no estado que se chama Purgatório”, diz o Catecismo (1472).

No entanto, o Catecismo ressalta que estas duas penas não devem ser consideradas como “uma espécie de vingança, infligida por Deus, do exterior, mas como algo decorrente da própria natureza do pecado”, e indica que “uma conversão procedente de uma caridade fervorosa pode chegar à total purificação do pecador, de modo que nenhuma pena subsista”.

Desse modo, o perdão divino recebido pela absolvição sacramental restabelece no fiel a comunhão com Deus e o livra das penas eternas do pecado. No entanto, as penas temporais subsistem. Essas, por sua vez, podem ser redimidas por meio de práticas espirituais cujos méritos são as indulgências.

PARCIAL OU PLENÁRIA

Essas indulgências podem ser parciais ou plenárias na medida que liberta, em parte ou no todo, da pena temporal devida em consequência dos pecados. Desse modo, o cristão pode cultivar orações e práticas cotidianas que purificam seu coração e sua alma de tais penas e o aproximam cada vez mais da graça de Deus e da santidade.

Devido à fé da Igreja na comunhão dos santos, as indulgências podem ser obtidas não apenas em próprio favor dos fiéis, como em favor da purificação daqueles que já faleceram, ou seja, das almas do purgatório.

Para obter a indulgência plenária é preciso fazer uma das práticas indicadas pela igreja, como orações, obras, práticas de piedade e bênçãos recebidas, sempre observando as seguintes condições: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração nas intenções do Sumo Pontífice. “Requer-se, além disso, rejeitar todo o apego ao pecado, qualquer que seja, mesmo venial”, ressalta o manual.

EXCEÇÕES NA PANDEMIA

Nesse período de pandemia, contudo, em que as pessoas estão impossibilitadas de participar da missa e receber a comunhão sacramental, a Penitenciaria Apostólica publicou um decreto em que concede a indulgência plenária aos fiéis que:

“Oferecerem uma visita ao Santíssimo Sacramento, ou a adoração eucarística, ou a leitura da Sagrada Escritura durante pelo menos meia hora, ou a recitação do santo rosário, ou o exercício piedoso da via-sacra, ou a recitação do rosário da Divina Misericórdia, para implorar de Deus Todo-Poderoso o fim da epidemia, alívio para os aflitos e salvação eterna para aqueles que o Senhor chamou a si”.

O decreto determina, ainda, que para obter a indulgência plenária, os doentes de coronavírus, os que estão em quarentena, os profissionais de saúde e familiares que se expõem ao risco de contágio para ajudar quem foi afetado pela COVID-19, também poderão simplesmente recitar o Credo, o Pai-Nosso e uma oração a Nossa Senhora.

Na impossibilidade de se confessar e de receber a absolvição sacramental, a Penitenciaria Apostólica recordou, por meio de uma nota, que “a contrição perfeita, vinda do amor de Deus amado acima de tudo, expressa por um sincero pedido de perdão (aquilo que o penitente é atualmente capaz de expressar) e acompanhada do votum confessionis, ou seja, da firme resolução de recorrer à confissão sacramental o mais rápido possível, obtém perdão dos pecados, até mortais”.

MEIOS PARA OBTÊ-LAS

São vários os meios e circunstâncias pelas quais uma pessoa pode obter indulgências parciais ou plenárias. Leia, a seguir, os meios mais comuns indicados pela Igreja:

Concede-se indulgência plenária ao fiel que:

  • Visitar com devoção uma das quatro basílicas patriarcais de Roma e lá recitar o Painosso e o Creio:

1) no dia da festa do titular;
2) em qualquer festa de preceito;
3) uma vez no ano, em dia à escolha do fiel.

  • Receber com piedade e devoção a bênção dada pelo Sumo Pontífice a Roma e ao mundo (Urbi et Orbi), ou dada pelo bispo aos fiéis confiados ao seu cuidado;
  • Passar pela porta santa de um santuário durante um Ano Santo Jubilar;
  • Visitar devotamente um cemitério, entre os dias 1 e 8 de novembro, e rezar pelos falecidos, sendo aplicável somente às almas do purgatório;
  • Participar da adoração da cruz na celebração da Paixão do Senhor na Sextafeira Santa;
  • Participar com devoção do solene rito de conclusão de um congresso eucarístico;
  • Realizar exercícios espirituais aos menos por três dias;
  • Visitar a igreja paroquial na festa do titular;
  • Visitar a igreja ou o altar no próprio dia da dedicação e aí piedosamente rezar o Painosso e o Creio;
  • Visitar piedosamente urna, igreja ou oratório de religiosos na festa de seu fundador e aí rezar o Painosso e o Creio.

Concede-se indulgência parcial ao fiel que:

  • No cumprimento de seus deveres e na tolerância das aflições da vida, ergue o espírito a Deus com humilde confiança, acrescentando alguma piedosa invocação, mesmo só em pensamento;
  • Levado pelo espírito de fé, com o coração misericordioso, dispõe de si próprio e de seus bens no serviço dos irmãos que sofrem falta do necessário;
  • Absterse de coisa lícita e agradável, em espírito espontâneo de penitência;
  • Recitar atos de virtudes teologais (fé, esperança e caridade) e de contrição.
  • Visitar o Santíssimo Sacramento para adorálo; se o fizer por mais de meia hora, a indulgência será plenária;
  • Visitar devotamente um cemitério, em qualquer dia do ano, e rezar pelos falecidos. O mesmo se aplica na visita a um cemitério de antigos cristãos ou “catacumba”;
  • Fazer a comunhão espiritual, por meio de qualquer fórmula piedosa;
  • Recitar piedosamente o Creio, seja o símbolo apostólico, seja o nicenoconstantinopolitano;
  • Dedicarse a ensinar ou aprender a doutrina cristã;

Para saber mais detalhes sobre a obtenção de indulgências e os meios para consegui-las, acesse o Manual das Indulgências, da Penitenciaria Apostólica. 

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