Fé e Cidadania

Urbi et Orbi e o anúncio de Cristo no mundo de hoje

Nessa Quaresma com quarentena, no entardecer frio e chuvoso de Roma, na sexta-feira, 27 de março, o povo cristão ganhou um desses presentes que Deus guarda para os momentos de grande aflição. A benção Urbi et Orbi, dada pelo Papa Francisco, além do valor da indulgência plenária para os que a acompanharam com a postura de fé adequada, foi um impressionante gesto de anúncio e um momento simbólico do nosso tempo e da mensagem que Francisco vem procurando transmitir desde o início de seu pontificado.

Com recortes variados, jornais de todo o mundo retomaram trechos da mensagem do Papa e enfatizaram a imagem do idoso solitário, que sob o céu de uma estranha beleza opressiva, parecia carregar as angústias e esperanças da humanidade, para pedir a intercessão de Maria, Sálus Pópuli Románi (Maria, Salvação do Povo Romano), e a proteção a Cristo, representado pelo Crucifixo Milagroso da igreja de São Marcelo. Excetuando os cristãos mais preparados, talvez poucos tenham entendido o sentido daquilo que transcorria diante de seus olhos, mas muitos perceberam a correspondência entre o que estão vivendo, seus desejos mais profundos, e o gesto realizado pelo Pontífice,

No conjunto, lendo os comentários e vendo as reações das pessoas (e de nós mesmos), percebemos que esse gesto mostra muitas coisas sobre a forma pela qual a Igreja deve encaminhar sua mensagem ao mundo de hoje. Não se trata de escolher caminhos teóricos ou abraçar debates ideológicos, do controle das novas mídias ou da anuência maior ou menor da mentalidade dominante. Trata=se de reconhecer o diálogo silencioso que se estabelece, nos momentos críticos, no coração de cada ser humano, entre ele e  Deus – um diálogo que é misterioso para nós, mas que se deixa vislumbrar em momentos como o daquela sexta-feira em Roma.

São as lições do “hospital de campanha”, situado no meio de uma guerra, ao qual o Papa se referia metaforicamente numa entrevista a Pe. Antonio Spadaro, mas que se tornou bem mais concreto nesses tempos atuais.

No momento da dor e da desorientação, as primeiras coisas que o ser humano procura são a esperança e a coragem para vencer o medo. Repetindo, de certa forma, a histórica exortação de São João Paulo II no início de seu pontificado, também Francisco começa sua mensagem na benção Urbi et Orbi nos convidando a não ter medo, a recuperar a confiança e a fé.

No trecho do Evangelho lido na benção dada em 27 de março, falava justamente do medo dos apóstolos, que se mantinha mesmo diante da presença de Jesus, pois, “pensam que Jesus Se tenha desinteressado deles, não cuide deles”, explica Francisco. A maior parte das pessoas que dizem ter perdido a fé associam essa perda à sensação de que Deus não cuidava deles num momento de dificuldade. Mas por que nos sentimos abandonados por Deus? O Papa continua sua explanação: porque não O buscamos na tribulação. Mesmo que declaremos acreditar Nele, nos apegamos a nossa autoconfiança ou a nossos projetos e não deixamos que Ele faça as coisas acontecerem.

Contudo, essas seriam palavras jogadas ao vento sem todos esses anos nos quais Francisco tem nos dado um testemunho evidente de amor e partilha das dores dos que mais sofrem. Por esse testemunho, também os olhos daqueles que não creem se voltaram para o idoso solitário, caminhando com dificuldade na praça vazia, e se sentiram representados e amados por ele.

Francisco, mais uma vez, nos mostrou o caminho para o coração do ser humano nos dias de hoje (e em todos os tempos). Cabe a nós não desperdiçar a lição.

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