Fé e Cidadania

Para além do Sínodo amazônico

O Sínodo para a Amazônia surge no pano de fundo de dois documentos essenciais publicados pelo Papa Francisco: a Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (2013) e a Encíclica Laudato Si’ (2015). O primeiro texto cunha a expressão fecunda da “Igreja em saída”, enquanto o segundo põe no centro o cuidado com a “nossa Casa Comum”. Um sublinha a natureza missionária de toda a Igreja, o outro se preocupa com a preservação do meio ambiente como fonte de vida da própria vida.
Ambos os documentos se entrelaçam de forma indissociável. Mais do que nunca, a região amazônica representa para a Igreja terra de missão. Está em jogo, por um lado, o risco da atual política econômica que ameaça a sobrevivência dos povos indígenas, das comunidades ribeirinhas e dos remanescentes quilombolas. Daí a urgência de uma atitude missionária que leve em conta os direitos desses cidadãos. Como no Evangelho, a periferia vem para o centro!
Por outro lado, a própria Amazônia está em jogo pelo que representa de um ponto de vista nacional e internacional. Ao mesmo tempo que abre uma porta para refletir sobre o futuro do solo, da floresta e dos povos amazônicos, o Sínodo abre uma janela para pensar o futuro do planeta Terra, como mãe primordial da vida em todas as suas formas – a biodiversidade. O tema do Sínodo não deixa dúvidas: “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”. 
O Papa Francisco tem o dom e o mérito de pautar temas urgentes não apenas para a agenda da Igreja, mas para a agenda da política internacional. Sobressaem alguns exemplos atuais. Primeiro, a mobilidade humana. Logo após a eleição, o Pontífice fez uma viagem à ilha de Lampedusa, na Itália, porta de entrada dos migrantes que se dirigem à Europa. Colocou no centro do palco o drama das migrações, com seus embates, travessias e mártires. Depois, visitou também a ilha de Lesbos, na Grécia, outra rota dos migrantes em direção ao Velho Continente. Enfim, deslocou-se ainda até a fronteira entre México e Estados Unidos, onde tantos sonhos se convertem em pesadelos.
Em segundo lugar vem o tema sobre a “economia que mata”. Em tom profético, o Papa tem insistido sobre os mecanismos perversos de um sistema econômico que fecha as portas aos trabalhadores sem pátria. A crítica desnuda a cultura do consumismo, do desperdício e do descarte, que, ao mesmo tempo, concentra riqueza e exclusão social. A Constituição Pastoral Gaudium et Spes (1965) e a Encíclica Populorum Progressio (1976) insistem que a tecnologia e o progresso científico devem estar a serviço não só do crescimento, mas do desenvolvimento integral.
Voltemos ao Sínodo amazônico: nas palavras do Papa, o cuidado e a convivência com os recursos naturais devem tomar o lugar da exploração irresponsável. O evento centra-se sobre os dramas que se desenrolam no território amazônico, porém vai muito além disso. Ao mesmo tempo que procura denunciar a desertificação do solo pela derrubada da floresta, a contaminação do ar e das águas, o aquecimento global, a exploração inescrupulosa de seus recursos e o risco que correm as populações vulnerabilizadas, busca igualmente anunciar formas novas de utilizar e partilhar aquilo que a natureza nos proporciona. Convém não esquecer que o Sínodo tem um protagonismo amplo e conjunto, a começar pelas populações da floresta, seus agentes e lideranças. Em qualquer alternativa a ser pensada, deve prevalecer a justiça, o direito, a responsabilidade e a ação solidária.
 

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